No próximo dia 26, as margens do Rio Tietê, entre as pontes do Limão e da Casa Verde, vão amanhecer tomadas por garrafas pet gigantes. Durante os dois meses em que ficarão expostos, os vinte infláveis, nas cores verde, vermelho e laranja, prometem roubar a atenção dos mais distraídos dos motoristas. Com as embalagens, já são oito as intervenções do paulistano Eduardo Srur na cidade.
Foi ele quem equilibrou seis bicicletas sobre cabos de aço em plena Avenida Paulista, em novembro do ano passado. Em 2006, espalhou bonecos de plástico remando sobre uma centena de caiaques ao longo do Rio Pinheiros. O nome do artista pode ser ainda desconhecido da maioria, mas é difícil não cruzar por aí com uma de suas obras – ou pirações, dependendo do ponto de vista. Em escalas proporcionais ao tamanho da metrópole, misturam humor e crítica social em doses muito bem planejadas.
“A gente atravessa as marginais e quase nem percebe mais a sujeira do rio”, diz Srur, uma espécie de ecochato das artes. “Espero que com as garrafas PET no Tietê eu chame atenção para o problema do esgoto.” Para viabilizar a nova instalação, ele enfrenta há catorze meses uma rotina de cálculos, pesquisas e negociações com a prefeitura. Com a ajuda de especialistas, chegou a um vinil de aspecto semelhante ao das embalagens comerciais, mas resistente às variações do clima.
Para elas brilharem à noite, colocou ainda dez lâmpadas frias no interior de cada protótipo. Vão dar o que falar, mais uma vez. Cerca de 8 000 crianças de escolas estaduais verão os modelos de perto. Elas navegarão em barcos pelo rio e, ao término da mostra Quase Líquido, organizada pelo Itaú Cultural, receberão mochilas feitas com o plástico reciclado das enormes garrafas infláveis.
Aos 33 anos, formado em artes plásticas pela Faap, Srur começou, como a maioria dos artistas, pintando telas. Logo resolveu partir para as tais ações urbanas. A idéia era ampliar o número de espectadores e provocá-los. Não à toa, sua grande referência é o artista americano, de origem búlgara, Christo. Dono de um currículo extenso de intervenções, embrulhou em 1995 o Parlamento alemão, em Berlim. “Com ele eu aprendi a ter uma visão de empreendimento”, conta Srur. “Christo não se intimida em ter 300 pessoas a seu serviço para conseguir o que quer.”
Desde o primeiro trabalho da série, Acampamento dos Anjos, em 2004, ele afinou sua capacidade de surpreender os paulistanos. Na época, pendurou 35 barracas de camping na então estrutura de concreto abandonada no Jardim Paulista – hoje, o Instituto Doutor Arnaldo. “Suas criações têm um tom pop engajado interessante, com mensagens bem diretas”, afirma o crítico e curador Cauê Alves. “Uma obra puxa a outra”, diz Srur.
“Das garrafas PET que se prenderam aos caiaques dois anos atrás surgiu, por exemplo, a idéia da intervenção que exponho agora.” E vem mais. No segundo semestre, ele pretende vestir muitos monumentos públicos com coletes salva-vidas. Uma imagem da estátua do Borba Gato, devidamente “protegida”, já ilustra a tela do seu computador, em uma montagem digital.
(Revista Veja São Paulo, 26/03/08)