Da coluna de Cesar Valente (De Olho na Capital, 22/09/2007).
Esta coluna de hoje vai parecer meio esquisita para os leitores de Itajaí, que já usam a bicicleta de montão. É uma cidade saudável, com um povo que não se aperta: qualquer coisa, pega a zica e se manda. Homens, mulheres, velhos, gurizada, gente grávida, gorda, magra, não importa: a turma, para muitas coisas, não depende nem de carro, nem de busão.
Mas em Florianópolis a coisa é bem diferente. A bicicleta, que na minha juventude era uma companheira inseparável, foi perdendo espaço nas ruas e na cultura. Claro que o fato da cidade não ser plana como Itajaí também ajuda a atrapalhar, mas hoje, com as marchas, as ladeiras já não são os mesmos dramas de antes.
Atravessar a ponte Hercílio Luz de bicicleta era uma aventura deliciosa. Aventura mesmo, porque a passarela de pedestres, com piso de ripas de madeira, deixava ver o mar lá embaixo. E a ponte, pênsil, tinha também o seu balanço. Entre a passarela e a pista dos automóveis, uma mureta de metal, mas também um vazio. E o marzão a dezenas de metros. Medão. Atualmente o pessoal fala “adrenalina”.
Hoje é mais um daqueles tais dias em que as prefeituras e ongs tentam fazer com que as pessoas pensem um pouco sobre a insanidade (em todos os sentidos) disso tudo. Coisa especialmente complicada numa das cidades com pior transporte coletivo e maior número de veículos motorizados por pessoa, que é a nossa capital.
Ao longo dos anos, os vereadores e prefeitos só pensam em “adensar” a ocupação da Ilha, de olho no IPTU e em outras rendas, sem fornecer, aos “adensados”, meios de locomoção. As ruas são as mesmas de 50 anos atrás, quando a gente sabia, pelo ronco do motor, de quem era o carro: “o Dr. Mário Costa passou hoje aqui na rua, de Gordini”. E o leite era distribuído de carrocinha puxada por um cavalo que sabia de cor onde deveria parar.
Entupiram tudo de carros. E há quem ponha a culpa nos proprietários dos automóveis. Em Florianópolis isso não é justo: como é que a gente vai se movimentar? O taxi é caro e geralmente mal conduzido. Os ônibus dão raiva. Metrô, bonde e barco só existem nos discursos políticos de véspera de eleição. As ciclovias são precárias, mas não custa lembrar que um sujeito que não anda de bicicleta desde os 25, não terá condições, aos 50, de deixar o carro e sair de bicicleta morro acima.
A propósito, vi um cartaz bem legal, da prefeitura de Bogotá (Colômbia), sobre o que seria uma cidade inteligente. Mostra três fotos, de uma mesma rua, onde 150 pessoas tentam se mover. Na primeira, dentro de automóveis (“a cidade de poucos”): a rua fica completamente engarrafada, até onde a vista alcança. Na segunda, de ônibus (“a cidade de muitos”). Tem só um ônibus, dos grandões, na rua. E na terceira, eles estão a pé (“a cidade de todos”) e ocupam também um pequeno espaço da rua. A campanha pretende mostrar formas mais humanas e solidárias de utilizar o espaço urbano. Taí, embaixo, ó.
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