Imagine que você acaba de chegar do supermercado e vai desempacotar as compras. Primeiro você tira a banana da sacola e depois do plástico-filme que a envolve. Então é a vez de o sabonete sair da sacola plástica e da embalagem de papel. O peixe para o almoço faz um caminho mais longo: é tirado da sacola, do plástico-filme e da bandeja de isopor antes de cair na frigideira.
Ao fim de uma cena como essa, se você der uma conferida na sua lixeira, vai se espantar com a quantidade de embalagens que tiveram uma vida útil relâmpago. Nada contra as embalagens, que fique claro, elas são essenciais para a integridade dos produtos. Mas será que precisamos de tantas assim? Não responda agora, primeiro leia o que vem a seguir.
Um terço do lixo doméstico brasileiro é composto por embalagens, os outros dois terços por comida. E 56% de todo o lixo plástico é feito de embalagens usadas. Pudera. Só de sacolas de supermercado é distribuído 1 bilhão por mês no Brasil.
No mundo todo é consumido 1 milhão de sacos plásticos por minuto. Agora junte os fatos: o plástico é um derivado do petróleo e leva séculos para se decompor, porém foi inventado há menos de 80 anos. Já dá para imaginar a quantidade de plástico que vaga por aí, em algum lugar do planeta. O pior é que eles entopem rios e bueiros, causam inundações e desembocam no oceano, matando animais que os confundem com comida. Na Normandia, França, foram encontrados 800 quilos de plástico no estômago de uma baleia morta. Mas esse não é o único vilão.
Quando compactado, o isopor se reduz a quase nada, levando em conta que 95% de sua composição é ar, o que o deixa pouco atraente para a reciclagem. Sem outro jeito, ele acaba indo para os aterros e lixões, onde prejudica a decomposição do lixo biodegradável, já que não se compacta facilmente pelo contrário, leva 400 anos para se decompor. Mas chega de notícia ruim. Você já deve ter uma reposta na ponta da língua sobre se precisamos ou não reduzir o uso de embalagens. Vai encarar o desafio? Então vire a página e saiba que não está sozinho nessa.
Leis e novas tecnologias
O grito ecoou pelos quatro cantos do mundo. Em março, a prefeitura de São Francisco, no estado americano da Califórnia, anunciou que baniria de supermercados e farmácias as sacolas de plástico, que agora devem ser retornáveis, de material compostável (que pode ser transformado em adubo), como amido de milho ou papel reciclado.
Baseado em projetos adotados na Irlanda e em Taiwan, Hong Kong criou a campanha permanente No Plastic Bag Day, algo como dia de não usar sacola plástica, marcado para a primeira terça-feira de cada mês, e instalou uma taxa por sacola consumida no supermercado, atitude também tomada pelo estado australiano de Victoria. Uma rede de supermercados em Tóquio adotou a idéia, depois que uma lei no país exigiu que os grandes varejistas se engajassem na luta pela redução das sacolas plásticas.
O efeito dominó pode atingir em cheio o Brasil. Projetos de lei e campanhas foram divulgados em estados como Paraná, Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, propondo, inclusive, a substituição total das velhas sacolinhas. As propostas chamaram atenção para materiais que estão surgindo na indústria. O plástico oxibiodegradável, única novidade que já pode ser vista em supermercados e farmácias do Brasil (em embalagens de cosméticos e sacolas), e um dos mais indicados pelas propostas de lei por aqui, é também fonte de polêmica: seus efeitos sobre o meio ambiente ainda são desconhecidos (leia no quadro).
O fato é que tudo tem seu porém. Especialistas afirmam que nem sempre biodegradável é sinônimo de bom para o meio ambiente. Mal damos conta de dar um bom fim aos resíduos orgânicos que já geramos: mais da metade do nosso lixo é resto de alimento e nem 1% é compostado. Para alguns pesquisadores, transformar o lixo orgânico em adubo e reciclar os outros resíduos parece melhor solução quanto às sacolinhas de plástico, valeria também incinerá-las para gerar energia elétrica.
Ninguém nega que o desenvolvimento de matérias-primas de fontes renováveis seja de suma importância, até mesmo porque o petróleo não vai durar para sempre. O medo é que a cultura do biodegradável acabe deseducando a população. Qualquer que seja a embalagem, ela foi produzida e para isso consumiu matériaprima, água e energia e emitiu carbono na atmosfera. As pessoas podem perder isso de vista, diz Helio Mattar, presidente do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente. Moral da história: por mais que novidades apareçam, lembre-se do ensinamento: reduzir, reutilizar, reciclar.
O que há de novo
PLÁSTICO DE FONTE RENOVÁVEL E BIODEGRADÁVEL. Originário de fontes renováveis, biodegrada-se naturalmente. Um exemplo é o chamado biocycle, desenvolvido e produzido no Brasil a partir da cana-de-açúcar. Ao se decompor, gera água, húmus e gás carbônico na mesma quantidade que a cana que lhe dá origem absorve lá na plantação. Porém, se a degradação ocorrer em aterros, pode gerar metano, gás com potencial de efeito estufa 23 vezes maior que o CO2 (o mesmo vale para o oxibiodegradável, a seguir). O melhor seria transformá-lo em adubo. A maioria do material é exportada.
PLÁSTICO OXIBIODEGRADÁVEL. Como o convencional, é originário do petróleo. Na fabricação, colocam-se aditivos químicos que fazem com que, em contato com o oxigênio (daí o nome oxi), o plástico leve de seis meses a dois anos para de decompor. Alguns pesquisadores suspeitam que os aditivos contenham metais pesados, com risco de contaminação do solo e dos lençóis freáticos, o que também poderia ser ocasionado pelos resíduos de tintas e pigmentos. Não é compostável nem tem liberação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para contato com alimentos.
PLÁSTICO DE FONTE RENOVÁVEL E RECICLÁVEL. Possui as mesmas características físico-químicas do plástico convencional, ou seja, é difícel de ser degradado por microorganismos devido a suas longas cadeias moleculares. Porém, é originário de fontes renováveis, como a cana-de-açúcar, e não do petróleo. Não é biodegradável, mas reciclável. Deve ser produzido no Brasil a partir de 2009. Espera-se que até lá a reciclagem de plástico no país esteja maior.
ISOPOR VEGETAL. A partir do milho e da mamona, uma indústria química de São Carlos, em São Paulo, produz um material similar ao isopor, porém biodegradável e compostável. Ainda não é usado em embalagens que chegam ao consumidor final. Outra empresa paulista está comercializando o biopack, outro primo do isopor, feito a partir do milho e cortado no formato tipo salgadinho, para proteger eletroeletrônicos durante o transporte.
(Priscilla Santos, Revista Vida Simples, Outubro de 2007)