É possível imaginar que alguém possa levar 30 minutos para sair da garagem do trabalho? Não é só possível, como é verdade. Para os funcionários de muitas companhias localizadas na área empresarial da região da Avenida Berrini, na zona sul de São Paulo, essa é uma situação corriqueira. Nem é preciso dizer que é o exemplo mais óbvio de que o trânsito da cidade já se tornou insustentável há muito tempo. E são justamente as empresas, os maiores polos geradores de tráfego nas principais metrópoles do mundo inteiro.
A boa notícia é que parte do setor empresarial já tem consciência da grande responsabilidade que possui em ajudar a desatar o nó da mobilidade urbana. Durante o Seminário Internacional sobre Mobilidade Corporativa e Cidades Sustentáveis foram apresentados diversos casos bem-sucedidos e apontados novos caminhos. O evento, organizado pelo World Resources Institute – WRI Brasil, a organização Embarq Brasil e o Banco Mundial, e realizado em São Paulo, em 19/9, fez parte da Virada da Mobilidade.
No último ano, dez empresas da região da Avenida Berrini participaram de um projeto piloto financiado pela Banco Mundial. O objetivo era melhorar a mobilidade do bairro por meio da redução do uso do carro. Atingida essa meta, consequentemente, ganhariam as pessoas com melhor qualidade de vida e a cidade se tornaria mais sustentável como um todo. Pesquisa revelou que 38% dos colaboradores dessas empresas levavam mais de 1 hora por dia para chegar ao trabalho. O mais inacreditável, entretanto, foi a constatação de que alguns funcionários que moravam a cerca de um quilômetro do escritório ainda assim pegavam o carro para chegar lá.
Várias iniciativas foram colocadas em prática para estimular as pessoas a deixar o carro em casa e escolher outros meios de transporte. As principais recomendações às empresas participantes foram:
– incentivar o uso da bicicleta,
– fazer cadastro de caronas,
– aumentar a frota de veículos fretados e
– implantar a prática do home office.
“As empresas também podem alterar a entrada e saída dos turnos de trabalho, tendo funcionários chegando e saindo em diferentes horários”, recomendou Andréa Leal, pesquisadora do projeto piloto da Berrini.
Especialistas acreditam que só aumentar a oferta de transporte coletivo não é mais suficiente para melhorar o trânsito das cidades. É preciso criar um sistema abrangente, com várias alternativas. E o empregador tem papel fundamental nessa mudança de paradigma. Ele precisa estar extremamente engajado e apoiar esse movimento. O exemplo precisa vir de cima. “Não podemos forçar ninguém a deixar o carro em casa, mas as pessoas têm que saber que há outras opções”, afirmou Peter Valk, consultor americano em mobilidade urbana. “E devemos dar a elas razões para mudar e, principalmente, reconhecer o esforço delas quando o fazem”.
Valk deu o exemplo da sede da Microsoft, em Seattle, nos Estados Unidos. Trabalham lá 40 mil funcionários. A administração municipal exigiu da companhia um plano de mobilidade. Não permitiu aumento no tamanho do estacionamento. A empresa organizou então linhas de ônibus exclusivas para os empregados, que fazem a integração com o sistema público de transporte da cidade.
Outro caso americano foi mostrado pelo brasileiro Paulo Nunes Ueno, diretor de sustentabilidade do Children’s Hospital de Seattle. Também obrigado a ter um programa de mobilidade corporativa, o hospital se comprometeu a reduzir o uso individual do carro. A primeira decisão de Ueno foi polêmica, mas necessária. “Não há mais estacionamento gratuito para os funcionários”, contou. “Estacionamento livre e grátis é o que causa congestionamento.
(Planeta Sustentável, 20/09/2013)