Imaginária, a nova linha da preamar no entorno da região insular de Florianópolis está praticamente concluída por técnicos da SPU/SC (Secretaria do Patrimônio da União). São 330 quilômetros de orla da Ilha, contando também contornos de manguezais e respectivos riachos, no limite de 33 metros da preamar (cheia) e áreas com influências das marés. Baseada no decreto-lei 9.760/1946, a linha da preamar é a mesma medida em 1831 e nunca homologada integralmente.
A previsão é de pelo menos 30 mil imóveis na faixa da preamar, dos quais menos de 5.000 estão cadastrados junto à União, informa o chefe da comissão de demarcação da SPU, engenheiro civil Carlos José Bauer, 65 anos. “O número exato de construções está sendo levantado com a prefeitura”, explica.
Na década de 1970, pouco mais de oito quilômetros foram homologados na orla central da baía Sul, entre os bairros Agronômica e Saco dos Limões. “A intenção não é derrubar nada, ou desalojar as pessoas. Algumas comunidades da Ilha cresceram em torno das áreas de marinha”, acalma o engenheiro.
A prioridade, segundo Bauer, é homologar a linha perante a sociedade e concluir o recadastramento imobiliário. “Isso está sendo feito com base em dados da própria prefeitura, seguindo do levantamento e da notificação dos proprietários para definição da dominialidade, ou seja, a quem pertence a área ocupada”, diz. “Todos os ocupantes serão identificados e notificados por edital, conforme determina o artigo 13 do decreto 9.760/46”, explica Bauer. O prazo para tentativa de impugnação administrativa é de dez dias, por meio de processos abertos inicialmente na SPU/SC, em Florianópolis, e, em última instância, no Ministério do Planejamento, em Brasília.
Levantamento aéreo de 1938 é atualizado só agora
O processo, segundo o engenheiro Carlos José Bauer, prevê defesa individual dos ocupantes, além de pareceres técnicos da prefeitura sobre o uso do solo e de órgãos ambientais oficiais. Se não houver restrições, a documentação é encaminhada para inscrição da ocupação junto à SPU/SC. “Todos terão direito a contestar oficialmente a demarcação”, argumenta.
A linha da preamar é a demarcação declaratória da faixa de domínio da União, a área de marinha. Na Ilha, os 33 metros foram definidos com base nas coordenadas do levantamento aerofotogramétrico viabilizado por acordo de cooperação técnica entre o Ministério Público Federal e a administração do Floripa Shopping, construído no entorno de área do manguezal da Estação Ecológica de Carijós, no Monte Verde.
Longo e meticuloso, o trabalho consistiu, também, na superposição das imagens atuais com as fotografias obtidas em 1938 durante sobrevoo de avião da Marinha dos Estados Unidos sobre a Ilha. Na época, em plena Segunda Guerra Mundial, o objetivo dos militares norte-americanos foi mapear toda a costa brasileira.
Comunidade do Carianos antecipa mobilização
No bairro Carianos, ao lado do Aeroporto Hercílio Luz, a população tem sido convocada via Facebook e carro de som para reunião nesta quarta-feira à noite, no salão da Igreja Batista (rua Santos Dumont, 660), onde serão debatidas medidas administrativas e judiciais para evitar a perda de direito de propriedade e o consequente pagamento da taxa de ocupação. São cerca de 7.000 moradores e, segundo levantamentos das entidades comunitárias, pelo menos a metade está na linha da preamar, ou seja, em áreas de marinha.
O sentimento entre a vizinhança é de desconfiança e incerteza, diz o presidente da Amocar (Associação dos Moradores do Carianos), Maicon Costa, 31 anos. Só na área dele são 1.300 casas e lotes incluídos na linha da preamar basicamente pela proximidade com o manguezal do Rio Tavares. “A maioria tem escritura pública e registro no cartório de imóveis. Algumas casas foram construídas com financiamento da Caixa”, argumenta o líder comunitário.
Implantado pela imobiliária Santa Helena, o loteamento é oficializado desde 1959 na prefeitura, garante Costa. O líder comunitário questiona, principalmente, o princípio de isonomia constitucional, sob a alegação de que a SPU usou critérios diferentes em bairros da Capital. “No Santa Mônica, por exemplo, a medida não é a mesma do Carianos. Mas isso não ficou esclarecido. E como ficam os grandes empreendimentos à beira de manguezais, rios e das praias?”, questiona. Segundo Costa, a comunidade planeja uma demarcação simbólica com tinta no entorno do bairro, “em protesto à falta de respostas às demandas da população na SPU”.
( Notícias do Dia Online, 07/04/2015)
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