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Acampados em área invadida em Florianópolis comemoram tempo que ganharam na Justiça

Se ganhar tempo era o que queriam, as famílias acampadas em área particular de 900 hectares, entre a margem norte do rio Ratones e a SC-401, em Florianópolis, conseguiram mais uma vitória na Justiça. O juiz agrário Jefferson Zanini, que acumula a 1ª Vara Criminal de Chapecó, marcou para 7 de fevereiro a audiência de conciliação na ação de reintegração de posse ajuizada pelos proprietários. Até lá, está suspenso o cumprimento da liminar para desocupação.

Já são 400 famílias cadastradas na ocupação de área particular de 900 hectares ao lado da SC-401, no norte da Ilha
Para que a decisão não estimule novas ocupações, o magistrado proibiu a entrada de outras pessoas. Jeferson Zanini determinou que as lideranças do acampamento apresentem, até esta sexta-feira (24), a relação das pessoas que estão no local, sob pena de revogação da suspensão da liminar de reintegração de posse.

A audiência de 7 de fevereiro, a partir das 13h, no auditório do Fórum Antônio Luz, na praça Tancredo Neves, deverá ter a presença dos proprietários da área e dos líderes do acampamento. O juiz Zanini requisitou ao comandante-geral da Polícia Militar a intermediação do major Edvar Fernando da Silva Santos para atuar como oficial de ligação entre o juízo e a corporação. Ao justificar a indicação, apontou a atuação do oficial na Polícia Ambiental no interior do Estado, “com conhecimento sobre a realidade campesina e negociação em conflitos coletivos”.

Também foi determinada a intimação dos superintendentes do Incra (Instituto Nacional da Reforma Agrária), José dos Santos; e do coordenador regional Sul da Funai (Fundação Nacional do Índio), José Maurício Farias. Para representar a Prefeitura de Florianópolis, foram intimados o procurador-geral, Júlio Cesar Marcellino Júnior, e os secretários de Habitação, Rafael Hahne; e de Assistência Social, Alessandro Abreu. O juiz agrário negou o pedido do Ministério Público Federal para que declinasse competência à Justiça Federal, por conta da presença de 52 índios da etnia Kaingang entre os acampados.

Acampados comemoram “conflito agrário”

Até essa quarta-feira (22), 400 famílias estavam cadastradas na ocupação Amarildo de Souza, espalhadas em barracas de bambu e plástico ou casebres de madeira no terreno de 900 hectares com escritura pública em nome da empresa Florianópolis Golf Club, do grupo Costão do Santinho, e do empresário e ex-deputado estadual Artêmio Paludo. Segundo Rui Fernando, um dos coordenadores, a orientação é seguir a determinação judicial e suspender novas adesões ao movimento por moradia sem aluguel.

A relação das famílias cadastradas será encaminhada nesta quinta-feira (23) ao magistrado “Não nos ocorre novas ocupações”, diz Rui Fernando. A decisão do juiz Jeferson Zanini, na avaliação da coordenação dos acampados e do advogado Robson Ceron, atendeu à reivindicação do movimento apresentada em recurso de agravo de instrumento. “Fizemos nossa defesa no entendimento de que compete à Justiça Agrária julgar conflito agrário”, completa o porta-voz dos acampados.

De acordo com a coordenação, as famílias são, na maioria, migrantes do interior de Santa Catarina e dos estados vizinhos, principalmente do Rio Grande do Sul, que estão em Florianópolis há mais de dois anos. São trabalhadores da construção civil, setores de vigilância e conservação, prestadores de serviços, comerciários e domésticas.

A intenção, segundo bandeira estendida na porteira de entrada do acampamento, é lutar por terra, trabalho e teto. “Pretendemos dividir em lotes e produzir. Criar um assentamento auto-sustentável no norte da Ilha”, idealiza.

Defesa argumenta que perímetro urbano não permite agricultura

O advogado Camilo Simões Filho, que representa os proprietários do terreno na ação de reintegração de posse, enfrentará o calor de Chapecó nesta quinta-feira. Ele aproveitará o dia disponibilizado às partes pelo juiz Jeferson Zanini para tentar convencê-lo que o terreno ocupado ao lado da SC-401 é urbano, não rural.

“Vou conversar com o juiz agrário”, anuncia Simões, que ainda está no prazo legal para entrar com recurso de agravo de instrumento. Antes de ser comunicado oficialmente sobre a audiência pública marcada para fevereiro, nessa quarta-feira o advogado esteve no Fórum de Florianópolis, na expectativa de convencer o juiz Fernando Vieira Luiz a reassumir o processo.

Como não obteve êxito, a defesa agora encaminhará à Justiça Agrária documentação que, segundo Camilo Simões Filho, comprova que é urbano o terreno reivindicado para reforma agrária. Ele se baseia, por exemplo, na Lei 3.819, de 1993, que muda o zoneamento da área de rural para urbano, permitindo empreendimentos turísticos no local.

“Os proprietários pagam IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), e o município aprovou projeto de viabilidade para licenciamento e implantação de campo de golfe”, argumenta o advogado. Caso não convença o juiz Zanini que a ocupação na Vargem Pequena não é um conflito agrário, Camilo Simões Filho mantém a estratégia de requerer a reintegração de posse com argumento de que a legislação municipal, em Florianópolis, não permite atividades agrárias em áreas urbanas.

OAB condena ação contra ordem pública

O presidente da Comissão de Direito Agrário e Questões do Agronegócio da OAB/SC (Ordem dos Advogados do Brasil em Santa Catarina), Jeferson da Rocha, voltou a cobrar pressa do poder público. “Trata-se de uma ação coordenada, cujo objetivo é desestabilizar a ordem pública”, disse Rocha, que sugere que as polícias Civil e Ambiental investiguem a ocorrência de crimes e que a Justiça se pronuncie o mais breve possível.

Segundo Rocha, a OAB está acompanhando o caso de perto e aguarda os desdobramentos no âmbito da Justiça para avaliar a necessidade de alguma intervenção. “Por enquanto estamos nos manifestando pela legalidade e pela manutenção do estado democrático de direito”, diz.

De acordo com moradores vizinhos ao acampamento, parte das barracas estaria sobre trecho desativado da antiga rodovia Virgílio Várzea, a primeira ligação entre o norte da Ilha e o Centro de Florianópolis.

A antiga estrada foi desativada no fim da década de 1970, sendo, em parte, absorvida pelo atual trajeto da SC-401. O engenheiro Cleo Quaresma, do Deinfra (Departamento Estadual de Infraestrutura) determinou pesquisas em mapas antigos da região. Segundo o técnico responsável pela fiscalização da SC-401, trata-se de pesquisa demorada, pois é preciso saber se ainda existem documentos e mapas da época.

Perguntas e respostas sobre a Ocupação Amarildo

Quem está na ocupação e quantas pessoas são?

Tudo começou com 52 famílias e, hoje, segundo os ocupantes, são cerca de 400 famílias ou aproximadamente 1.000 pessoas. Seriam pessoas, geralmente, vinda do Oeste de Santa Catarina ou outros estados e que moram na periferia da cidade, como no Maciço do Morro da Cruz. Dizem que são trabalhadores em sua maioria.

O que querem?

Dizem que a área é um latifúndio improdutivo no meio de Florianópolis. Diferente da ocupação Contestado, de São José, por exemplo, que exige moradia, na ocupação Amarildo o objetivo é a terra para produzir. Querem transformar o lugar em uma produção sustentável.

Como se organizam?

Em núcleos de dez famílias, assim como em São José ou outras lutas históricas, como em Canudos. Banheiros secos e cozinhas são coletivos.

Quem entrou?

Quem quis fortalecer a ocupação. Caso ganhem a questão na Justiça Agrária, dizem que ocorrerá uma triagem. Mesmo porque, a inclusão em projetos de reforma agrária exige algumas condições, como renda mínima de três salários e não ter outro imóvel. Decisão da Justiça Agrária proibiu novas ocupantes.

Quem apoia?

Dizem que formaram uma rede de apoio, composta por movimentos sociais, sindicatos, professores e estudantes, inclusive da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).

(Notícias do Dia, 23/01/2014)

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