29 maio Rebio do Arvoredo: um pedacinho da Mata Atlântica a ser descoberto em Santa Catarina
É difícil ter a dimensão da riqueza ambiental encontrada na Ilha do Arvoredo. Pertencente à Reserva Biológica Marinha do Arvoredo — Unidade de conservação federal, de proteção integral — a área terrestre do local é um pedacinho da Mata Atlântica em solo catarinense ainda pouco explorado do ponto de vista científico.
Apesar de ser lembrada pela ampla diversidade de espécies que abriga em sua área marinha, a floresta da Rebio do Arvoredo também tem a sua variedade. Até o momento, foram descobertas 139 espécies de aranhas, 28 de aves, 10 mamíferos, sete de anfíbios, sete de lagartos, cinco de serpentes e 195 de plantas.
Mesmo representando apenas 2% de toda a Reserva Biológica, a área de Mata Atlântica da Ilha do Arvoredo é considerada grande comparada a outras ilhas: são 350 hectares de Mata Atlântica de uma área total de 17,6 mil, que tem 98% de sua totalidade em área marinha.
Essa condição permite à Ilha abrigar espécies que não são comuns de se encontrar nas ilhas costeiras, geralmente menores, conforme conta o analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Leandro Zago da Silva, chefe da Reserva Biológica Marinha do Arvoredo.
A Ilha do Arvoredo possui uma vegetação mais exuberante, com árvores mais altas, que permite abrigar muito mais espécies da fauna, que normalmente não seriam vistas em outras Ilhas de acordo com Zago.
Por conta de sua condição de isolamento e outras particularidades, existem espécies que são encontradas somente na Reserva Biológica do Arvoredo.
Além disso, uma das características mais marcantes da Ilha do Arvoredo está relacionada à localização, que proporciona um encontro de espécies de dois ambientes contrastantes em sua área marinha. Isso torna o local um ambiente único de acordo com Zago, gerando uma condição específica que permite o surgimento de espécies que atualmente são encontradas somente na Rebio do Arvoredo.
— Ela fica entre regiões tropicais, ou seja, mais quentes, e regiões frias. Ao mesmo tempo em que está no limite de espécies tropicais encontradas em águas quentes, ela também recebe a visita de diversos animais de regiões frias, como a baleia franca, o pinguim e o lobo marinho. Isso a torna uma área especial para a conservação — ressalta.
A Rebio abriga mais de mil espécies marinhas conforme registros científicos. Mas ainda há muito o que se conhecer por lá. Nas décadas de 80 e 90, houve um interesse muito grande pela área terrestre da Ilha, que motivou a pesquisa e resultou no descobrindo da maioria das informações que hoje se tem sobre a área coberta pela Mata Atlântica.
Nos anos seguintes, conforme Zago, foram desenvolvidos poucos trabalhos envolvendo a parte terrestre. Mas isso tem mudado.
— Conforme a área marinha vai se tornando mais conhecida, vai despertando também um interesse sobre as áreas terrestres. Muitas pesquisas que eram iniciais, de prospecção, estão sendo agora aprofundadas — conta.
Casa de espécies ameaçadas
A Rebio Arvoredo é a unidade de conservação que mais abriga espécies ameaçadas de extinção, condição que a coloca em local de destaque em relação às outras unidades.
Zago explica que a conservação integral da unidade, que restringe a interação humana, tem impacto fundamental na preservação dessas espécies que correm o risco de deixar de existir. Cenário esse que pode se repetir com o avanço das pesquisas realizadas na área de Mata Atlântica.
De acordo com o analista ambiental, com a intensificação das pesquisas nas áreas terrestres, é possível que a Reserva assuma um papel ainda mais importante em relação à conservação também das espécies terrestres.
Histórico da Ilha
Apesar de ter ser sido instituída enquanto reserva ambiental na década de 90, o histórico de ocupação humana na Ilha é bem mais antigo. Conforme o biólogo e analista ambiental do ICMBio, Hellen José Florez Rocha, é possível observar pelo menos três ciclos humanos que já estiveram no local.
O primeiro deles ainda em ocupações pré-históricas. Há registros, segundo Rocha, que apontam a presença de povos indígenas pré-coloniais, xokleng, kaigang e dos Itararés, que estiveram na Ilha há cerca de 2,5 a 3 mil anos atrás.
Além disso, a Ilha do Arvoredo sempre foi uma referência para a navegação. Exemplo disso foi o forte construído no final do séculos XIX.
— A gente tem um uso da Ilha, muito mal registrado, de 1500 a 1750, mas certamente saiu madeira daqui [da Ilha], era área de abastecimento. Imagina um povo que cruza o Atlântico, fica meses navegando, chega aqui e tem reparos a serem feitos. Abastecimento de comida, água, a Ilha servia pra isso — explica Rocha.
Posteriormente, com a ocupação da área marinha e a construção de um farol, a Ilha passou por um novo momento de ocupação humana. Lá estiveram faloreiros, além da marinha que mantém a base até hoje na ponta Sul da Ilha, área militar que não faz parte da unidade de conservação.
Recentemente, pouco antes de ser fechada à visitação, há registros fotográficos e relatos sobre a presença de pescadores no local. Espécies exóticas que hoje são encontradas na Ilha, como o capim-elefante, são heranças dessas ocupações humanas.
A pequena sala retangular em que os analistas do ICMBio ficam hoje quando vão à Ilha — onde cabem dois beliches, um fogão, uma pia com instalação hidráulica recente e uma mesa — possivelmente foi utilizada como rancho de pesca segundo Rocha.
A retirada das espécies invasoras não diz respeito apenas à restauração da paisagem natural. Ela tem uma função relacionada ao resgate da história tanto da própria reserva quanto de Santa Catarina.
— A gente quer casar a retirada da espécie exótica invasora com o conhecimento arqueológico que pode ser gerado aqui hoje — explica o biólogo.
(NSC, 28/05/2019)