24 out Conferência na UFSC debate o futuro da humanidade
Estimativas da ONU apontam que, em 2050, a população do mundo chegará a nove bilhões de pessoas e mais de 70% delas viverá em área urbana. De que forma as cidades irão enfrentar desafios como sustentabilidade energética, mobilidade urbana, fornecimento de água potável e de alimentos e produção e descarte do lixo? As cidades deverão promover mudanças radicais de infraestrutura nas próximas décadas se quiserem fugir do caos total, alertam especialistas. Para debater e propor soluções sobre essas questões e outras urgências socioambientais com que se depara a humanidade no mundo contemporâneo, 16 especialistas, referências internacionais em suas áreas de atuação, estarão reunidos na PLANETA.doc Conferência, no dia 23 de outubro, das 11h às 22h30, no auditório Garapuvu da UFSC. As inscrições são gratuitas e devem ser feitas pelo site do evento.
A conferência abre diálogo com base nos estudos mais atuais e inovações que estão sendo gestadas em torno de conceitos como “Bens Comuns, Lixo Zero e Cidades Humanas”. As conferências serão realizadas em um formato semelhante a TED, com até 30 minutos de duração, permitindo um painel bastante abrangente e diversificado.
A atividade integra a programação da quarta edição do PLANETA.Doc – Festival Internacional de Cinema Socioambiental , o maior do gênero do sul do país e um dos principais do Brasil, que ocorre entre os dias 16 de outubro e 10 de novembro, em Florianópolis e várias outras cidades catarinenses.
Riquezas comuns não estão à venda
Rios, lagos, mares, florestas, a biodiversidade, o valor ecológico da vida silvestre, as normas éticas da venda de produtos seguros, os valores morais e tradições que definem uma comunidade, tudo isso são riquezas que não podem ser representadas por um valor. O conceito de bens comuns – aquilo que é inalienável e está acima de qualquer preço – contrapõe-se à lógica da privatização. Sobre essas propriedades e riquezas coletivas e públicas, não deve haver interferência do mercado. Porém, uma grande quantidade destes recursos está se convertendo em propriedade privada, impulsionada pela lógica neoliberal. Exemplo é o desmatamento da floresta amazônica. Entre 2015 e 2016, a floresta perdeu 7.989 km² de extensão, segundo levantamento do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia). Isso significa que foram desmatados aproximadamente 128 campos de futebol por hora na região no ano passado, a maior área registrada desde 2008.
O processo de liquidação dos bens comuns, considerado uma das grandes injustiças do nosso tempo, será debatido por ambientalistas mais influentes do mundo como Paula Saldanha, jornalista e ambientalista, referência na conscientização sobre as riquezas naturais, étnicas e culturais do Brasil. Com 43 livros publicados, 800 documentários realizados e mais de vinte prêmios, Paula é presidente do Instituto Paula Saldanha e viabilizou expedições que oficializaram a nascente do Amazonas, maior rio do planeta. Sobre o tema, irão palestrar também:
— Dener Giovanini, ambientalista reconhecido internacionalmente, recebeu da ONU o mais importante prêmio ambiental do planeta. Pelo trabalho na Renctas, ONG que fundou, ganhou o status de Empreendedor Social Notável das três maiores organizações do setor no mundo.
— Adrienne Hall, sócia na produtora cinematográfica Sound Off Films, produziu o aclamado documentário “Racing Extinction”. Em 2016, lançou o filme “The Discarded: A Tale of Two Rios”, que aborda a temática do lixo no Rio de Janeiro.
— Georgia Nicolau, co-fundadora e co-diretora do Instituto Procomum, é ativista e pesquisadora nos campos da cultura, das artes, da política e da inovação cidadã. Faz parte da rede Global Innovation Gathering, que reúne inovadores principalmente do sul global.
— Washington Novaes, foi repórter, diretor, editor e colunista dos principais veículos de comunicação do Brasil. Conquistou prêmios como o Esso Especial de Ecologia e Meio Ambiente e o Unesco de Meio Ambiente. Escreveu livros e produziu documentários sobre os indígenas do Xingu.
As pessoas no lugar dos carros
Das dez piores cidades em mobilidade urbana do mundo, seis são brasileiras, de acordo com um estudo urbanístico sobre índices de mobilidade nos centros urbanos, divulgado pela Universidade de Brasília (UnB), em 2009. Conforme a pesquisa, Florianópolis tem o segundo pior índice do mundo e o deslocamento mais complicado entre 21 das principais capitais brasileiras. Como se o quadro já não fosse preocupante o bastante, estima-se que a frota de carros do mundo deva crescer a uma média de 3% ao ano até 2030.
Porém, quando tratada de maneira adequada, a mobilidade fomenta cidades inclusivas, acessíveis e conectadas, as chamadas “Cidades do Futuro – inteligentes e humanas”. O conceito é voltado ao bem-estar das pessoas, que pressupõe a manutenção da qualidade do ar e um sistema de transporte coletivo sob demanda, que atenda aos interesses de toda a população urbana. Trata-se do aproveitamento da tecnologia a serviço das pessoas e da coletividade para vencer os desafios colocados pelos congestionamentos, emissões de gases do efeito estufa, mortes no trânsito e infraestrutura urbana organizada para o carro.
A relação hoje existente com o carro vai mudar. As ruas terão enormes painéis solares que vão recarregar o transporte coletivo. As pessoas vão se mover de uma ponta à outra da cidade em trajetos integrados entre ônibus elétrico e bikes alugadas. Esse é um cenário imaginado, mas possível dentro de planejamentos urbanos pautados por lógicas mais humanas e sustentáveis, onde as cidades são pensadas para as pessoas e não para os carros.
Experiências de cidades humanas serão apresentadas por especialistas como Tia Kansara, fundadora e diretora da primeira consultoria de estilo de vida sustentável do Reino Unido, que estará no PLANETA.doc Conferência e também no VII Fórum Nacional Varejo Lixo Zero, promovido pela ACATs, no dia 24 de outubro. Suas pesquisas incluem futuras cidades e energia. Criou o conceito de Replenish, uma avaliação per capita do que devolvemos aos ecossistemas. Outros palestrantes que irão abordar essa temática:
— Pierre-André Martin, estudou as ciências relativas à paisagem e ao território durante seis anos na França. Desde 1995, atua como paisagista e ambientalista internacionalmente. É professor na PUC-Rio, sócio-fundador da EMBYÁ, redator para “The Nature of Cities” e membro do comitê executivo da Society for Urban Ecology – Brasil.
— Cecília Herzog, presidente do Inverde – Instituto de Pesquisas em Infraestrutura Verde e Ecologia Urbana. Paisagista urbana, especialista em Preservação Ambiental das Cidades, mestre em Urbanismo e professora na PUC-Rio. É autora do livro “Cidades para Todos: (re)aprendendo a conviver com a natureza”.
As relações entre insegurança alimentar e desperdício
Atualmente, 842 milhões de pessoas ainda passam fome em todo o mundo, segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO/ ONU). Por outro lado, cerca de 1,3 bilhão de toneladas daquilo que poderia virar comida vai parar na lata do lixo. Para se ter uma ideia do prejuízo causado pelo desperdício, a cada ano os consumidores dos países ricos desperdiçam 222 milhões de toneladas, o que quase equivale à quantidade de alimentos produzidos para alimentar a África. No Brasil, o índice de alimentos que vão para o lixo chega a 26,3 milhões de toneladas.
Ainda de acordo com dados da FAO/ONU, as consequências econômicas diretas do desperdício de alimentos, excluindo peixes e frutos do mar, chegam a 750 bilhões de dólares por ano. Mais da metade (54%) da perda de alimentos no mundo ocorre na fase inicial da produção, na manipulação, pós-colheita e armazenagem. O restante (46%) acontece nas etapas de processamento, distribuição e consumo.
Os números indicam que agir sobre o desperdício de alimentos tem impactos diretos e indiretos sobre a segurança alimentar no mundo. Cinco palestrantes vão tratar dessa questão humanitária:
— Daniel Silva Balaban, diretor do Centro de Excelência contra a Fome e representante do Programa Mundial de Alimentos da ONU no Brasil. Economista, foi presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação de 2003 a 2011. É membro da Global Child Nutrition Foundation e da Agenda de Conselheiros Globais do Fórum Econômico Mundial.
— Ronni Kahn, fundou a OzHarvest em 2004, impulsionada pelo desejo de fazer a diferença e acabar com o desperdício de comida. Hoje, a OzHarvest é a principal organização de resgate de alimentos da Austrália e tem se tornado um modelo global.- – Jonathon Hannon, coordenador da Zero Waste Academy, fundada em 2002, tendo como objetivos o desperdício zero e a sustentabilidade. Entre seus interesses acadêmicos estão ecologia industrial, economia circular e reciclagem orgânica. O conferencista também participará do VII Fórum Nacional Varejo Lixo Zero, promovido pela ACATs, no dia 24 de outubro.
— Leslie Lukacs, consultora para implementação de programas de sustentabilidade e desperdício zero em instituições, órgãos públicos e eventos. É fundadora e membro do Green Initiatives for Venues and Events.
— Eunice Maia, fundadora da Maria Granel, a primeira mercearia biológica a granel em Portugal. Autora do prefácio do livro “Desperdício Zero”, de Bea Johnson, e responsável pela introdução do sistema BYOC (bring your own container – traga sua própria vasilha) no mercado português.
Responsabilidade no uso e descarte do lixo
Quando o assunto é produção e descarte responsável do lixo, o Brasil precisa avançar e muito. Cada brasileiro produz em média 383 quilos por ano. O país produz 63 milhões de toneladas de resíduos sólidos e apenas 3% por cento são reciclados, apesar de 1/3 de todo o lixo urbano ser potencialmente reciclável, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais.
Nos últimos 11 anos, o aumento da geração de lixo no país foi muito maior do que o crescimento populacional. De 2003 a 2014, a geração de lixo cresceu 29%, enquanto a taxa de crescimento populacional foi de 6%. Mas o tratamento adequado dado a esses resíduos não aumentou e a economia brasileira perde cerca de R$ 120 bilhões por ano em produtos que poderiam ser reciclados.
Em 2010, o Congresso aprovou, depois de 20 anos de discussão, uma política nacional de resíduos sólidos (Lei 12.305/10), com a finalidade de estimular a reciclagem e a chamada logística reversa – quando o fabricante é responsável por recolher a embalagem do produto usado. Especialistas ressaltam que a coleta seletiva é essencial para que seja implementada a logística reversa, prevista na lei. Mas de acordo com a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública (Abrelpe), só existe algum tipo de iniciativa de coleta seletiva em 60% dos municípios brasileiros.
Mesmo apesar da lei que determinou o fim dos lixões, o Brasil ainda despeja 30 milhões de toneladas de lixo por ano, de forma inadequada. Em 2013, 41,7% do lixo era depositado em locais considerados inadequados (lixões e aterros controlados), em 2014, essa parcela foi de 41,6%.
O movimento Lixo Zero (zero waste) faz frente a essa sociedade do lixo e desperdício. Segundo o Instituto Lixo Zero Brasil, o Conceito “lixo zero” consiste no máximo aproveitamento e correto encaminhamento dos resíduos recicláveis e orgânicos e a redução – ou mesmo o fim – do encaminhamento destes materiais para os aterros sanitários ou para a incineração. De acordo com a ZWIA – Zero Waste International Alliance, o conceito Lixo Zero inclui mudança de hábitos das pessoas, para que alcancem ciclos naturais sustentáveis, “onde todos os materiais são projetados para permitir sua recuperação e uso pós-consumo.” Três pesquisadores vão tratar da questão:
— Rodrigo Sabatini, fundador e presidente da Novociclo Ambiental SA, primeira empresa brasileira de gestão de resíduos baseada no conceito lixo zero. Presidente do Instituto Lixo Zero Brasil e fundador e mentor do Movimento Juventude Lixo Zero.
— Pal Martesson, coordenador do Departamento de Gestão de Resíduos e Recursos Hídricos da Cidade de Goteburg (Suécia) e membro do Zero Waste International Alliance (ZWIA). Fundador e gestor do maior parque de reciclagem do mundo.
— Jonathon Hannon, coordenador da Zero Waste Academy, fundada em 2002, com sede na Massey University, tendo como objetivos o desperdício zero e a sustentabilidade. Os interesses acadêmicos dele são: desperdício zero, ecologia industrial e metabolismo urbano, economia circular, administração de produtos/ responsabilidade de produtores estendidos, laboratórios vivos, reciclagem orgânica e papel do setor empresarial comunitário na reciclagem.
Serviço
PLANETA.doc Conferência, com a participação de 16 conferencistas
23 de outubro, das 11h às 22h30
Auditório Garapuvu – UFSC
Inscrições GRATUITAS (e obrigatórias) pelo planetadoc.com
(DC, 23/10/2017)