Justiça manda demolir tradicional restaurante na Barra da Lagoa, em Florianópolis

Justiça manda demolir tradicional restaurante na Barra da Lagoa, em Florianópolis

Instalado há quase 25 anos nas margens do canal da Barra da Lagoa, logo após a ponte pênsil, o Recantinho Bar e Restaurante corre o risco de ser demolido. A construção fica no terreno que há três gerações pertence à mesma família. Neste mês, no dia 17, a Justiça Federal acatou o pedido do Ministério Público Federal e decidiu a favor da destruição da estrutura em até 30 dias para a recuperação da área ambiental.

O proprietário Anízio Merceriano Felício, 59 anos, luta na Justiça para manter o local de pé. Filho de pescador, nascido na Barra da Lagoa, Anízio vai recorrer da sentença. Caso não consiga, além da demolição, estará sujeito a multa de R$ 1 mil diários se ultrapassar o prazo determinado pela Justiça.

A ação civil pública que pede a desocupação é de autoria da Fundação Municipal do Meio Ambiente (Floram) que alega que o empreendimento está em área de preservação permanente, onde, em meados da década de 1990 havia uma praia. De acordo com a sentença expedida este mês pelo juiz federal Marcelo Krás Borges, em 8 de outubro de 2008 os ficais autuaram o restaurante e, na época, não foi comprovada a regularidade da construção de 80 metros quadrados, contatando um deck de madeira.

Anízio alega possuir toda a documentação que garantiu a instalação do estabelecimento durante as mais de duas décadas de funcionamento. Carrega em uma pasta o alvará de construção, autorização da Capitania dos Portos que permitiu a construção do deck, inscrição estadual, entre outros papéis. Ele compara a situação à dos beach clubs de Jurerê Internacional, que conseguiram suspender a demolição na Justiça.

— Até hoje não recebi apoio de ninguém. Não houve nenhuma manifestação aqui — argumenta, lembrando o “abraço solidário” que aconteceu ano passado em prol dos restaurantes de Jurerê.

A pedido da Justiça, gastou R$ 10 mil contratando uma consultoria ambiental para que elaborasse um projeto de recuperação da área sem a necessidade de demolição. A proposta foi recusada pelo Ministério Público Federal. Contando todos os custos com o processo, calcula ter pagado quase R$ 100 mil somando os honorários com advogados.Como o restaurante é sustento de toda a família, lacrimeja ao imaginar a hipótese de perdê-lo. O genro Sérgio de Souza Júnior ajuda no atendimento. Ele conta que há quatro anos está atrás do balcão do Recantinho. Acabou de comprar um apartamento e divide a apreensão com o sogro e com a sogra, que trabalha na cozinha.

— O país do jeito que está, com tantos desempregados, como vou deixar todos eles sem emprego? — questiona Anízio, mostrando no celular fotos antigas da Barra da Lagoa que, para ele, deixam claro que o restaurante pouco alterou a paisagem e a vegetação do local, principalmente pelo fato de ter sido construído após a instalação dos molhes e a dragagem do canal.

Os molhes, que mantêm a conexão entre a Lagoa da Conceição e o oceano, foram erguidos na década de 1980. Com isso, Anízio defende, parte das margens de areia e da mata ciliar foi consumida pela água. A Floram argumenta que o parecer técnico concluiu que a construção do Recantinho contribuiu para ¿o agravamento dos problemas ambientais¿. Além disso, um laudo mostrou que o dano é reversível, mas, para isso, seria necessária a retirada da área construída.

O impacto ambiental seria a alteração da paisagem, a emissão de gases e afluentes, geração de resíduos e a interferência na fauna aquática, em relação aos peixes, que tiveram o habitat “profundamente” alterado e “parcialmente suprimido”.

Pescadores lamentam decisão

Os vizinhos de Anízio Merceriano Felício defendem que o Recantinho deve permanecer como está. Presidente da colônia de pescadores da Barra da Lagoa, Ari Timóteo de Santana, 84 anos, conhece Anízio desde criança. Para ele, o fato de o terreno pertencer à mesma família há pelo menos oito décadas deve ser considerado pela Justiça. Também pescador, Osvani Adebal dos Santos, 45, afirma que o Recantinho atrai turistas e nunca causou transtornos.

— Conheço ele desde sempre e toda a família depende do restaurante. Acho que a Justiça tinha que considerar isso — conclui Osvani.

(Diário Catarinense, 22/05/2017)