01 abr A importância de lutar pelo saneamento em Florianópolis
“O processo desencadeado de mobilizações populares, audiências públicas e articulações políticas entre pesca, maricultura, associações comunitárias e o Plano Diretor, por saneamento em Florianópolis, nos dá cada vez mais a certeza de que esta é uma questão fundamental para o futuro de Florianópolis, no que tange o seu modelo de desenvolvimento econômico, cultural e sócio ambiental.
As atuais contradições e debilidades apresentadas pelos planejadores, projetos e nos pareceres técnicos, feitos e contratados pela Casan e Prefeitura, e inclusive as respostas e posicionamentos inseguros dos órgãos ambientais, diante de nossos questionamentos, a luz da legislação federal, nos dão ainda mais a certeza de que em hipótese algumas seremos coniventes com qualquer leitura, projeto e obra pública e privada, que estabeleça uma relação com as baías Sul e Norte da Região Metropolitana de Florianópolis e dos rios que compõem a bacia hidrográfica da região que deságua nas baías, como os rios dos manguesais da Ilha e do Continente, os rios Cubatão, Aririú e o Biguaçu, como se estes pudessem ser classificados como CORPOS RECEPTORES, diretos e indiretos, dos resíduos das estações de tratamento de esgoto, públicas e privadas, e/ou como área de escape emergencial dos sistemas de tratamentos, em casos de emergência e saturação, como vem acontecendo e/ou previsto com a Estação do Aterro da Baia Sul e do Cacupé. Estas preocupações também se estendem para a construção de ETEs em áreas de manguesais e de reserva ambiental.
As baías Sul e Norte, nossos mangues, por suas estruturas físicas, morfológicas e topográficas, localização, as correntes marinhas e as correntes atmosféricas, e por sua forte relação com a cultura e economia local, jamais poderão ser objetos de planejamento e gestão pública irresponsável com as gerações passadas presentes e futuras. Alem do papel de destaque que cumpre na produção de 70% da maricultura nacional de mariscos e ostras, é aqui principalmente neste território costeiro entre mares, que reside um dos mais importantes vínculos de resistência contra a espoliação e segregação urbana e à exploração imobiliária, à fome e à baixa oferta de trabalho e renda para as populações tradicionais. Só por isso acima, deveria cumprir um papel de destaque para as estruturas e políticas públicas da região.
Com a compreensão acima, mesmo que de forma difusa entre as lideranças e entidades, percebemos que as manifestações populares organizadas através do movimento ‘Esgoto no Mangue e nas Baías Não’ estão levando a Prefeitura Municipal e a Casan a repensarem os locais de lançamento de efluentes das estações de tratamento de esgotos (ETEs) para o interior das baías. Na reunião do Conselho Municipal de Saneamento Básico ocorrida no dia 26 de março, o diretor de Operações da Casan Sr. Cezar de Luca apresentou intenções de alterações significativas à proposta inicial da empresa de lançar os efluentes das ETEs nas baías Norte e Sul. As pressões estão conduzindo a Prefeitura e a Casan a se renderem aos fatos: não havia um projeto nem licenças ambientais para as obras já iniciadas e o lançamento de efluentes das ETEs para o interior das baías iria comprometer a qualidade de suas águas.
Mesmo assim, nos parece que eles estão mudando de posição por medo de perderem os recursos do PAC, pois existiam, segundo o diretor da Casan, dificuldades criadas por entidades federais que negaram ou suspenderam licenças ambientais concedidas pela Fatma, alem da falta de consenso com as comunidades sobre a localização das ETES.
O fato é que em nenhum momento a Casan apresentou um projeto, minimamente detalhado. No tocante aos aspectos legais, a Casan jamais fez menção aos estudos de impactos ambientais destas obras já iniciadas em várias localidades. Nunca se ouviu falar da outorga das águas para o lançamento de efluentes nos rios ou no mar, assim como da anuência da Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé ou da Estação Ecológica de Carijós. Portanto a tentativa de realizar estas obras estava totalmente ilegal, sem amparo da lei.
Este sempre foi nosso principal argumento e que nos levou a contar no dia 20 de março com declarações de apoio do ministro Gregolin da Pesca, da senadora Ideli e de Américo Tunes do Ibama. Por força destes motivos e das pressões, inicialmente das comunidades do Ribeirão da Ilha e a da Barra do Sambaqui, está difícil que entidades federais aprovem as licenças ambientais. Isso é o que está pesando nos acenos de intenções de mudança na proposta anterior da Prefeitura e Casan, especialmente no que diz respeito ao lançamento dos efluentes para mar aberto.
Isto é uma vitória, ainda que parcial, pois finalmente a Prefeitura e a Casan começam a reconhecer os impactos negativos destas obras sobre a qualidade das águas das baías e sinalizam que irão redirecionar os emissários submarinos para disposição oceânica nas praias dos Ingleses e do Campeche.
A questão legal da licença ambiental, anuência da Resex e da Estação de Carijós e a outorga de água continua sem solução. Sabemos que estudos de impactos ambientais de obras deste porte não são realizados em 15 dias. Portanto persiste ainda a falta de um projeto escrito com detalhamento suficiente que permita uma avaliação mais clara das áreas e populações que serão atendidas prioritariamente. As áreas onde foram suprimidas as ETEs terão atendimento reduzido inicialmente.
Apesar das intenções de mudanças significativas alterando os locais de lançamento dos efluentes das ETEs, os procedimentos da Prefeitura e da Casan continuam os mesmos: uma proposta sem ampla discussão nas comunidades atingidas e na cidade como um todo. As comunidades querem saber como, onde e a qualidade dos equipamentos a serem instalados, a eficiência dos tratamentos, o tipo de resíduo gerado, a extensão dos emissários, os riscos dos resíduos retornarem às praias, as localidades que serão atendidas inicialmente pelas redes de coleta de esgotos entre outras informações…
A nova lei de saneamento aprovada em 2007 (Lei n° 11.445) está baseada em princípios dos quais destacamos:
I -universalização do acesso;
III- abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo dos resíduos sólidos realizados de formas adequadas à saúde pública e à proteção do meio ambiente;
VI – articulação com as políticas de desenvolvimento urbano e regional, de habitação, de combate à pobreza e de sua erradicação, de proteção ambiental, de promoção da saúde e outras de relevante interesse social voltadas para a melhoria da qualidade de vida, para as quais o saneamento básico seja fator determinante;
X – controle social;
Por sua vez também, o capitulo X desta lei, referente à Política Federal de Saneamento Básico enfatisa a necessidade de:
IV – utilização de indicadores epidemiológicos e de desenvolvimento social no planejamento, implementação e avaliação das suas ações de saneamento básico;
IX – adoção de critérios objetivos de elegibilidade e prioridade, levando em consideração fatores como nível de renda e cobertura, grau de urbanização, concentração populacional, disponibilidade hídrica, riscos sanitários, epidemiológicos e ambientais;
Neste sentido, será imprescindível aprofundar o debate com as comunidades sobre estes aspectos, pois os aspectos sociais e ambientais são os que mais atingem as populações. Até aqui os projetos da Prefeitura e da Casan buscam atender muito mais as demandas existentes e programadas do setor especulativo imobiliário da construção civil, que aguardam a instalação do sistema de saneamento para viabilizar a venda de lotes nos condomínios existentes e a construção de novos imóveis, bem como a aprovação de novos loteamentos, como é o caso da região que fica entre a Tapera e o Trevo do Erasmo/Campeche e também na região norte onde procura dar sustentação aos projetos do Sapiens Park e entorno.
É sabido que hoje, por falta de saneamento em Florianópolis, a Prefeitura em conluio com a Fatma e Casan utilizan-se da Floram para expedir Licenças Prévias/Provisórias, em desacordo com a lei, para viabilizar ETEs e liberação de projetos e empreendimentos imobiliários, como a ETE de João Paulo, onde o emissário mal projetado (sem falar do lançamento na Baía Norte) faz com que as marés façam refluxos diários dos efluentes para o mangue da Reserva de Carijós. Outro caso gritante diz respeito ao licenciamento feito de sistemas de tratamentos precários de esgoto de condomínios, como é um caso no Rio Vermelho, onde o sistema de ETE, consiste em: fossa, filtro e sumidouro, como se fossem sistemas isolados residenciais.
Por isso, como preconiza o Estatuto da Cidade e as legislações federais voltadas as políticas públicas urbanas, de saneamento e meio ambiente, estamos exigindo que os projetos em discussão corram em paralelo com as demandas do novo Plano Diretor em discussão, e em conjunto com a elaboração do Plano Municipal de Saneamento que foi “contratado” pela prefeitura. Porém neste contexto geral municipal, mesmo que estas questões estejam contempladas, e com controle social, entendemos que não teremos ainda a médio e longo prazo garantias de que nossas praias e produção de mariscos, ostras, vieiras e pescados estarão de acordo com os padrões exigidos de saúde pública, visto que nossas baías Sul e Norte, recebem todos os efluentes dos mananciais hídricos dos municípios vizinhos, que utilizam os rios como corpo receptor de esgoto tratados e in natura. Por isso exigimos ações integradas na região. No mínimo devemos tratar esta questão como política pública única para os municípios de Governador Celso Ramos, Biguaçu, São Jose, São Pedro de Alcantara, Palhoça e Florianópolis. O ideal será tratar a questão no contexto geografico/hidrico das microbacias regionais.
Assim sendo se a idéia nossa, de proteger as baias de lançamentos de efluentes e dejetos sanitários, foi de fato assimilada pela Prefeitura e Casan, então devemos cobrar para que as exigências socio ambientais, RIMA, EIA e EIV, sejam redirecionadas aos novos projetos de ETEs, suas localizações e as questões dos emissários submarinos em mar aberto, alem de rever/integrar todas as demais ETEs já existentes em Florianópolis, inclusive a de Potécas, e tratar a questão do saneamento no marco dos planejamentos municipais e regional integrado.
Para estabelecer canais de controle social, estamos propondo que se realize urgentemente uma AUDIENCIA PÙBLICA MUNICIPAL, e também um SEMINARIO REGIONAL DE SANEAMENTO, unindo as esferas institucionais municipais/estadual/federal e os setores representantes da sociedade local, pois este será o pólo de definição de diretrizes políticas para o saneamento regional, alem do que dará a devida repercussão política para busca de recursos e projetos de acordo com a demanda real, e pelo papel que a região representa tanto no cenário local como estadual e nacional para as políticas de turismo, maricultura e pesca.
Enquanto isso, alem da solicitação de audiência com o Ministério das Cidades e Casa Civil, tambem estamos marcando audiência com os lideres da bancada federal catarinense, para que eles assumam o tema junto as políticas públicas federais e na elaboração do orçamento/financiamento público para o orçamento de 2010.
Por isso tudo, agora mais do que nunca, devemos estar presente na próxima audiência publica do Ribeirão no dia 02 de abril de 2009, pois lá estaremos iniciando uma nova caminhada, pensando a cidade e região como um todo, alem de tudo o que até aqui já pautamos”.
(Por Ruy Ávila Wolff (agrônomo e maricultor) e Ci Ribeiro (arquiteto e urbanista), Sambaqui na Rede, 30/03/2009)