26 set Lagoa da Conceição, da exuberância à ocupação desenfreada
“A freguesia da Conceição da Lagoa, que fica a lés-nordeste da capital à margem ocidental da Lagoa Grande é denominada pelo morro do Padre Doutor (450 metros) de onde se descortina um dos mais belos panoramas que olhos humanos podem apreciar, panorama que atrai vivamente a atenção dos viajantes, nacionais ou estrangeiros, que passam ou se demoram em Florianópolis, constituindo também o encanto de seus habitantes, que, aos domingos e dias feriados, fazem da formosa localidade um dos pontos de suas excursões”.
Esse trecho da memória de nossa Lagoa da Conceição, escrita por Virgílio Várzea em 1900 (in Santa Catarina: A Ilha), é talvez uma das referências mais belas e vivas sobre um lugar que ainda expressa magia e encanto, mesmo que tenha sido sistematicamente agredido pela especulação durante décadas.
Uma das freguesias mais antigas de Florianópolis, fundada no século 18, a Lagoa atual pouco lembra suas origens, exceto pela Igreja de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, construída em 1780 e tombada em 1975 como patrimônio histórico e cultural do município, por meio de decreto do então prefeito Esperidião Amin. No mesmo decreto, Amin tombou as igrejas de São Francisco da Penitência e Nossa Senhora do Rosário e São Benedito (Centro), Nossa Senhora das Necessidades (Santo Antônio de Lisboa) e Nossa Senhora da Lapa (Ribeirão da Ilha).
Várzea assinala em seu livro que o povoado da Lagoa – então “com 3.450 almas, das mais laboriosas que conhecemos” – surgiu em torno do templo católico, hoje também conhecido como Igrejinha da Lagoa. Diz o autor: “Acham-se alinhadas em volta (da igreja) as principais casas do povoado, algumas envidraçadas e assobradadas, todas em geral caiadas e de um só pavimento, vastas e bem edificadas como obras antigas, que são, e onde habitam os mais abastados agricultores do lugar”. A agricultura, antes da pesca, foi a principal fonte de subsistência dos imigrantes açorianos que para cá vieram entre 1748 e 1756. A chamada pesca artesanal é um fenômeno que surgiu e se consolidou ao longo do tempo, como forma complementar de sobrevivência, mas que acabou se tornando uma importante fonte de renda complementar para os moradores. Várzea trata do assunto em sua obra, deixando evidente que os pescados tinham um problema básico: a conservação. Naquele tempo não havia geladeiras e só existiam duas indústrias que beneficiavam os produtos do mar em Santa Catarina.
Acesso asfaltado deu força à urbanização
Acessar a Lagoa da Conceição foi, durante mais de um século, um problema tanto para os moradores quanto para os visitantes. Em 1900 Várzea já faz referência aos “touristes” (assim mesmo, em francês), que só tinham acesso ao alto do Morro das Sete Voltas por meio da estrada de barro ou de trilhas. Ele cita as cavalgatas (cavalgadas) como forma de chegar ao local para se apreciar o nascer do sol. Até meados da década de 1940 as crianças da comunidade tinham que caminhar mais de oito quilômetros até a Agronômica, para estudar.
A dificuldade de acesso garantiu um relativo isolamento para os moradores e certamente contribuiu para a preservação da natureza pelo menos até a década de 1970, quando a atual estrada foi implantada. O asfalto foi determinante para incrementar a atividade turística em toda a Ilha de Santa Catarina. As estradas modernas foram executadas no governo de Colombo Machado Salles (1971-1975) com esse propósito, de início – antes que chegassem os gaúchos, paulistas e argentinos – para estimular o turismo interno.
A fama da Lagoa da Conceição correu mundo. Os estrangeiros e brasileiros de outros Estados que vinham, nos anos 1970 e 1980, chegavam ávidos por conhecer as dunas e os “restaurantes da Lagoa”, famosos por servir pescados fresquinhos e pela célebre “sequência de camarão”. Qualquer documentário sobre Florianópolis, como os produzidos pelo governo do Estado ou pela Agência Nacional (hoje EBC) incluía a Lagoa e seus restaurantes no enredo. A Lagoa foi nossa primeira rota gastronômica, parte de qualquer roteiro turístico que merecesse esse… (Leia na íntegra a Coluna de Carlos Damião – Notícias do Dia Florianópolis. 24/09/16)