09 fev Sérgio da Costa Ramos: Eiffel e Hercílio Luz
(Da Coluna de Sérgio da Costa Ramos, DC, 09/02/2015)
Agora vai, diz o governador. Dispensará licitações para contratar quem tem know-how, a firma americana American Bridge. E por que não contratou logo “quem sabia fazer”?
Suspeito que a ponte Hercílio Luz, 89 anos a serem completados em maio, só ressuscitará com o seu construtor – claro, no Dia do Juízo Final.
Sabemos que a ponte começou a ser construída em 1922. Mas os dois primeiros anos foram gastos com um desastre financeiro: o Estado caiu no “conto” de banqueiros americanos e o banco Imbrie & Co faliu estrepitosamente, naufragando junto com o empréstimo de US$ 5 milhões.
O “mercado” não deixou de executar as garantias. Títulos emitidos pelo Estado de Santa Catarina, no mesmo valor, tiveram que ser honrados pelo contribuinte catarinense, por sentença de tribunal americano no foro de Nova York.
Um novo empréstimo foi contratado: mais US$ 5 milhões – e as obras da ponte só deslancharam lá por julho de 1923. Dois anos e cinco meses depois, estava pronta. Outros cinco meses complementares, até o dia 13 de maio de 1926, transcorreram por conta de adequações nos acessos, principalmente na cabeceira insular, com a problemática remoção do “Morro do Cemitério”.
Interditada em janeiro de 1982, a ponte está completando 33 anos de inércia, incompetência, desleixo e má sorte – ao longo de pelo menos seis governos. Idiotas da objetividade (com a licença de Nelson Rodrigues) já destilaram a bobagem de que a ponte não vale o investimento da restauração.
Que melhor mesmo seria deixá-la afundar no estreito entre os dois promontórios, o insular e o continental.
Gente de quem escapa a sensibilidade de entender que, muito mais do que um caminho de ferro levitando entre o céu e a terra, a ponte Hercílio Luz é a própria história da Santa Catarina no século 20, sem falar de que se trata do maior símbolo histórico-urbano do Estado e um dos mais conhecidos do país.
Seria como se a França deixasse o ferrugem corroer a torre do doutor Gustave Eiffel, aquele monumento construído também em treliças de ferro…
O engenheiro Hercílio – a cuja memória prestamos aqui nossa reverência – construiu-a com a obstinação dos pontífices. Não o Sumo Sacerdote – o papa Francisco – mas o “construtor de pontes”. Um artífice desse tipo merece o título de “mediador das relações entre o Céu e a Terra”.
Quem sabe dessa vez…