31 out O falecimento do trapiche
(Por Carlos Alberto Zago*, DC, 31/10/2014)
É com pesar que vimos comunicar o falecimento do trapiche, atrás do Clube Doze de Agosto em Coqueiros, Florianópolis. Colocaram uma lápide na entrada. Lá eu pescava e vi muitas coisas. Falei com tantas pessoas. Ali criei amigos. Vi casais de namorados se beijando e aproveitando a beleza do lugar. Vi casais terminando o namoro por discórdia de momento. Vi solitários curtindo a maior dor de cotovelo. Vinham falar comigo, contavam os problemas. Trocava ideias com eles e não eram raras as vezes que, na semana seguinte, agradeciam a reconciliação ou o fato de terem resolvido a situação no trabalho aconselhados por um advogado pescador.
Vi crianças brincando com os pais. Queriam saber que peixe era aquele que coçando a barriga ficava inchado. Vi famílias reunidas em piqueniques. À noite aparecia um pessoal diferente que viajava em dois mares. Àquele que estava à frente e o mar de estrelas que brilhava no céu. Antes de seu falecimento, tirei foto do local. Bem que poderia ser pintada na lápide de cobertura, como lembrança de um lugar que cheirava sabor de cultura e tradição de uma época que já foi.
Dia 3 de outubro, a coluna do Cacau Menezes informava que o trapiche não precisaria ser interditado. Engenheiros tinham diagnosticado que o local não oferecia perigo, mas a prefeitura de Florianópolis o interditou cumprindo ordem do Ministério Público. Perguntava Cacau: “Vamos contar quando será reaberto?”
Respondo: nunca mais. Veja a ponte Hercílio Luz. Para construí-la precisou-se de quatro anos. Para reformá-la sabe-se lá quando – o Sérgio da Costa Ramos escreveu recentemente crônica sobre o futuro do país que abordava a reforma da ponte “para o ano que vem, em 2051”.
É mais um cartão-postal que ficará na nossa memória. Não será reformada nem reconstruída. Já aconteceu com o Miramar. Imaginem a reforma do trapiche. Ainda não tem licença ambiental da Fatma, da Floram, do Ibama. Falta audiência pública e não recebeu as três vacinas obrigatórias e nem a da febre amarela. Os saudosistas que chorem em suas próprias lembranças. Não há crença na recuperação, então ele resta apenas na memória dos saudosistas
Carlos Alberto Zago*, Advogado – Florianópolis