Ponta do Coral: Quintais aquáticos

Ponta do Coral: Quintais aquáticos

(Por Moacir Pereira,DC, 27/06/2014)

Renasce, de repente, devidamente adaptado para conviver com o meio ambiente, um projeto para a Ponta do Coral. Não exigirá novos aterros, nem superdimensionará o hotel que deverá incrementar o turismo náutico, com marinas e seus equipamentos, respeitando os velhos ranchos de pescadores.

Sairá do papel? Ao nosso mar falta o dinamismo dos mares rendilhados por trapiches, nervuras vasculares que ligam os seres humanos ao mundo. Mistério: vigora aqui um inexplicável descompasso, um sinal “trocado” entre a relação pessoas/automóvel e pessoas/barco, nesta que é uma ilha de 42 praias bem contadas. Já somos a segunda cidade brasileira na penosa relação carro por habitante, passando rapidamente da atual marca de um carro para cada 1,8 morador, rumo a delirantes um por um. E quantos barcos teremos “por pessoa”, nesta que é uma ilha, como todas, cercada de água por todos os lados?

Nem se diga que navegar é um esporte caro. Navega-se até sobre uma daquelas boias antigas, câmeras de pneu, e não somente a bordo de embarcações suntuosas. O mar aceita com boa vontade qualquer caíque flutuante – troncos ocos, cascas de palmeiras, bateiras, batelões, canoas açorianas, escunas, lanchas voadeiras, ou até um corpo humano de barriga cheia em tarde de sol e calor.

A histórica Retirada de Dunquerque – episódio que pode ter determinado, ainda no seu início, o desfecho da II Grande Guerra – foi consumada a bordo de qualquer tábua que sustentasse um soldado inglês na travessia do Canal da Mancha.

O mar é hospitaleiro. Aceita barco a vela, a motor e a remo. Mas precisa de marinas, estacionamento onde amarrar o seu pangaré flutuante. Faltam esses quintais aquáticos onde o dono possa melhor amarrar o seu “fusca” ou o seu “Rolls-Royce”.

Até parece que o ilhéu herdou certos pânicos dos arquipélagos açorianos, associados às erupções vulcânicas do Atlântico Norte. E, com esse sentimento na alma, acabou nutrindo pelo mar mais temores do que amores…

É um espanto que numa ilha de 47km x 12km, o homem “rode” sobre seu dorso num asfalto ralo e cansado, ignorando a líquida via que a acaricia há milhões de anos, desde o Big Bang.

Já é tempo, 514 anos depois de Cabral, do ilhéu requerer a reintegração de posse do seu mar.


Sem saber

Não é apenas de empreiteiras desestruturadas a culpa pela má execução de contratos importantes para a capital catarinense, como o do novo aeroporto, da SC-403 e da restauração da ponte Hercílio Luz. É também dos editais de licitação, que não exigem expertise específica para cada obra. Empreiteiras sem know-how para restaurar a ponte acabam fazendo o guloso papel de “atravessadoras” em onerosas subcontratações. Sem saber substituir os olhais – engenharia de alto risco –, uma líder de consórcio se torna subcontratadora com um único interesse: contratar quem “entenda” do assunto pelo menor preço possível.

Não pode dar certo.