Parte da multa paga pela Celesc por vazamento de óleo será usada em compensação ambiental

Parte da multa paga pela Celesc por vazamento de óleo será usada em compensação ambiental

A construção de uma escola ambiental, na Tapera, e a revitalização da Lagoa da Chica, no Campeche, serão executadas com recursos provenientes da multa paga pela Celesc (Centrais Elétricas de Santa Catarina) à Fatma (Fundação Estadual do Meio Ambiente), pelo vazamento de óleo mineral isolante, em novembro de 2012, na subestação desativada, na Tapera. Para a escola serão viabilizados R$ 250 mil, e para a lagoa serão R$ 850 mil. A compensação ambiental, no entanto, pouco ou nada significa para as mais de 80 famílias de maricultores prejudicadas pelo embargo preventivo da área que durou cinco meses e impediu a comercialização de ostras e mariscos.

Pelo vazamento do óleo, a Celesc recebeu multa de R$ 24 milhões da Fatma. Por cumprir as exigências de recuperação e recomposição ambientais, a estatal obteve redução de 90% no valor inicial da multa (benefício permitido pela legislação).

O valor final, R$ 2,4 milhões, foi dividido: metade para o Fundo de Bens Lesados do Ministério Público de Santa Catarina e outra metade para a construção da escola ambiental e a revitalização da Lagoa da Chica. No dia 30 de abril, o presidente da Celesc, Cleverson Siewert, assinou o termo de compromisso de repasse para as associações de moradores dos dois bairros beneficiados com a compensação ambiental.

O presidente da Fatma, Alexandre Waltrick, lembrou que R$ 1,2 milhão, depositado no Fundo de Bens Lesados, pode ser solicitado por qualquer comunidade que tenha um projeto ambiental a executar. Waltrick disse também que a Celesc ainda não encerrou completamente a recuperação da área onde estavam os transformadores com óleo. A empresa, com apoio da Fatma, vai monitorar o local por mais três anos.

“A Celesc precisa tomar providências para evitar novos acidentes em suas subestações”, alertou Waltrick. Ele lembrou ainda que os laudos periciais mostraram que não havia riscos à saúde humana, nem à fauna e à flora. “A multa foi emitida pelo vazamento de óleo mineral isolante com traços de PCB (bifelinas policloradas). Não foi encontrado ascarel em nenhuma das amostras”, enfatizou.

Escola ambiental

Há poucos quilômetros do local onde ocorreu o vazamento será construída uma escola ambiental. O prédio com mais de 200 m² será edificado no terreno do Conselho Comunitário da Tapera da Base. “A Fatma cedeu o projeto arquitetônico e estamos em busca de empreiteira para executar a obra”, disse a presidente da Associação de Moradores, Lisemary Almeida.

As paredes internas da escola serão removíveis, permitindo a transformação do espaço em salas de aula ou auditório, para palestras e oficinas, conforme a necessidade dos estudantes. “A comunidade entende que o vazamento foi um ato de vandalismo e não vê a Celesc como culpada pelo acidente”, defendeu Lisemary.

A escola será um espaço onde se trabalhará a consciência ambiental dos moradores. A obra, prevista para começar em até 60 dias, levará um ano para ser concluída.

Lagoa da Chica

Quem passa pela rua dos Pescadores, no Campeche, custa a acreditar na informação da placa da Floram, que identifica a Lagoa da Chica. Mesmo com a sinalização é difícil acreditar que debaixo de todo o matagal ainda exista uma reserva de água doce.

A lagoa está abandonada pelo poder público há mais de dez anos. “Era lindo aqui. Lembro-me dos peixes e da criançada que se divertia na água. Eu estava sempre junto”, recorda o fotógrafo Maicon Souza, 37 anos. Com o filho Henrique, 2, no colo, Souza detalha que o assoreamento facilitou ainda mais o crescimento da vegetação e afastou os freqüentadores do local, outrora de lazer. “Se este espaço for revitalizado meu filho terá a oportunidade que eu tive de brincar aqui”, acredita.

Na construção de deque e calçadas e no desassoreamento da lagoa serão investidos R$ 850 mil. O projeto, que é uma antiga reivindicação dos moradores do Campeche, prevê ainda a implantação de ciclovia, de parque infantil e academia ao ar livre. “Também teremos uma pequena sede para receber estudantes”, antecipou o vereador Vanderlei Farias (PDT). As obras começam em no máximo 30 dias e terminam em até um ano. Após a conclusão das melhorias o local será gerenciado pela Floram (Fundação Municipal do Meio Ambiente).

Embargo provocou prejuízo a maricultores

Até se aposentar como instrutor de operação da subestação da Celesc, em 1998, Adécio Romalino da Cunha, 61 anos, era responsável pelo treinamento dos técnicos da empresa na Tapera. “O pessoal vinha de todo o Estado para aprender a manusear os equipamentos na subestação didática”, disse.

Cunha estava familiarizado com os transformadores que foram danificados em novembro de 2012, por ladrões em busca de peças de cobre. Ao deixar o serviço público, o morador do Ribeirão da Ilha foi para a maricultura. “Nunca imaginei que o meu antigo trabalho bateria à minha porta dessa maneira. É irônico”, disse, ao lamentar o embargo preventivo da Fatma entre a praia da Mutuca, na Tapera, e o Ribeirão da Ilha.

Durante cinco meses as atividades de cultivo e banho foram proibidas. “Ainda hoje, mais de um ano após a liberação da área, ainda não consegui recuperar os cabos que arrebentaram por falta de manutenção durante o período de embargo”, lamentou Cunha. Ele reduziu em 40% a produção de ostras e amarga mais de 70% de queda nas vendas de mexilhão.

O presidente da Amasi (Associação de Maricultores do Sul da Ilha), Claus Ferreira, perdeu sozinho mais de R$ 30 mil durante o embargo. Os prejuízos não pararam por aí. Um ano após a liberação para as atividades no Sul da Ilha, muitos clientes ainda não voltaram. “Eu tinha clientes de porta. Meu forte era o consumidor final. Mas muita gente deixou de consumir ostras e mexilhões por medo de contaminação. As perdas estão na casa dos 50%”, afirmou.

Trabalhos da Celesc para recuperar área

De acordo com o assistente da Diretoria de Distribuição da Celesc, Pablo Cupani, a empresa despendeu R$ 7,9 milhões para recuperar a área atingida pelo vazamento. Outros R$ 2,5 milhões foram destinados aos maricultores e extrativistas atingidos pelo embargo. Cada um dos indenizados foi identificado pela Secretaria de Estado da Agricultura e Pesca. Mais R$ 2,4 milhões foram destinados à multa imposta pela Fatma.

“Fizemos raspagem das laterais das valas atingidas, bem como a retirada de mais de 1.500 toneladas de solo contaminado”, relatou Orlando Foes Neto, engenheiro sanitarista ambiental da Celesc, ao apontar o local do vazamento fechado por cerca metálica. Foes Neto reconhece que a experiência foi um aprendizado para a empresa.

A Celesc ainda responde judicialmente a uma ação civil pública pelo vazamento. As mais de 920 análises químicas, feitas em 150 pontos, mostraram que as baías Norte e Sul, bem como a área entre a ponte da rodovia Açoriana e a foz do canal da Tapera, além da Reserva Extrativista Marinha do Pirajubaé não foram atingidas pelo vazamento de óleo.

A área total do imóvel onde ficava a subestação é de 47 hectares. O terreno foi repassado pela Celesc ao governo do Estado, que posteriormente passou a propriedade à UFSC. Em março de 2014, nove hectares foram desmembrados pela UFSC e voltaram para o governo para monitoramento ambiental da Celesc.

ENTENDA O CASO

Novembro de 2012
Dia 16: vigilantes emitem primeiros alertas de vazamento de óleo no antigo centro de treinamento da Celesc, na Tapera. A subestação didática foi desativada em junho de 2011.

Dezembro 2012
Dia 19: vazamento é detectado oficialmente. Os mais de 11.640 litros de óleo escorreram para duas valas de drenagem a Leste e a Oeste da subestação. O líquido desceu pelo mangue e chegou ao rio do Meio, que tem sua foz na baía Sul, na praia da Mutuca, na Tapera.

Janeiro de 2013
Dia 14: Fatma embarga preventivamente 730 hectares de área de produção, entre a praia da Mutuca e a Freguesia do Ribeirão da Ilha.
Dia 30: Celesc assume na Justiça Federal a responsabilidade pelo vazamento.

Abril de 2013
Dia 8: Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), por ordem da Justiça Federal, vistoria área e considera satisfatórias as medidas tomadas pela Celesc para mitigar os impactos ambientais na área atingida.
Dia 15: Fatma libera aos maricultores e banhistas 92% da área supostamente atingida pelo vazamento de óleo isolante para transformadores. O desembargo foi emitido após análises laboratoriais de água, sedimentos e moluscos que descartaram riscos à saúde humana.

Abril a agosto de 2013
Celesc executou o Prad (plano de recuperação de área degradada). Ações imediatas de retirada de óleo, isolamento do local foram realizadas pela estatal.

Março de 2014
Dia 25: Justiça Federal dá 30 dias para considerações finais das partes envolvidas na ação civil pública: UFSC, ICMBio e Fatma. O processo está em fase de execução de sentença.

Maio de 2014
Pelo menos 8% da área permanece embargada pela Fatma. Análises serão feitas durante os próximos três anos.

(Notícias do Dia, 10/05/2014)