Famílias afetadas pelo Contorno Viário de Florianópolis relatam incertezas

Famílias afetadas pelo Contorno Viário de Florianópolis relatam incertezas

Falta, segundo a Autopista Litoral Sul, somente a licença ambiental do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) para que sejam iniciadas as obras da alça de contorno da Grande Florianópolis. No entanto, antes de emitir a LI (licença de implantação), o instituto aguarda a conclusão de estudos em Biguaçu, onde cinco aldeias indígenas serão atingidas pela passagem da nova rodovia. Em Palhoça, famílias ainda aguardam a indenização para deixar o caminho livre para homens e máquinas comecem os trabalhos após a liberação ambiental. Enquanto uns querem o fim da novela, outros ainda esperam mudanças no traçado. A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) não pretende mudar mais nada no projeto, que se arrasta desde 2008.

Em setembro de 2013 topógrafos mediram e fotografaram a casa do assistente administrativo Michel Rodolfo Seemann, 33, no bairro Pedra Branca. Nesta data Seemann descobriu que o traçado foi modificado e que sua casa estava no caminho do novo projeto. “Ainda estou pagando este terreno. Escolhi este lugar porque tem nascentes d’água e muito sossego. Agora perderei a vista. Terei de deixar tudo o que planejei para este recanto”, lamentou, ao ressaltar que não é contrário a obra. “Esse último traçado atinge uma área urbana maior que o projeto anterior. Ainda espero que as coisas mudem”, observou. A dona de casa Maristela Mendes, 52, é vizinha de Michel Seemann. Mais conformada, ela espera pela indenização para sair da terra. “Acho que não dá para fazer nada. A estrada vai passar aqui e pronto”, afirmou.

A estrada que cortará a Pedra Branca chegará à localidade morro do Gato, nas proximidades do bairro São Sebastião. Ali a dona de casa Marli Machado, 60, espera ansiosa pela indenização. Sua casa já foi visitada pelos técnicos enviados pela Autopista. “Espero receber uns R$ 80 mil. Vou morar perto daqui, mas onde tenha ônibus nos finais de semana. Aqui é complicado para quem não tem carro”, contou. Ivone Gimenez, 39, mora ao lado da casa de Marli. E também quer deixar a localidade. “Vou perder o sossego. Mas morar longe de tudo é cansativo”, detalhou a mulher que mora em uma casa de 70m² com o marido e dois filhos. Ivone não procurou outra moradia porque não sabe quando será indenizada. “Mediram o terreno e a casa em julho. Desde então ninguém mais veio aqui”, lamentou.

Comerciante conta viver momentos de tensão

A comerciante Adilena Garcia, 41, trabalha na pequena mercearia que a mãe mantém há 20 anos. Até hoje,a venda da dona Nicinha é o único estabelecimento comercial da localidade. Resoluta Adilena não quer ver a propriedade da família ser destruída por máquinas. “Não será fácil recomeçar. E onde faremos isso?Não quero a alça de contorno aqui!”, assegurou, ao defender o fechamento da BR-101 em protesto contra as obras.

Ela lembra que durante a audiência pública para apresentação do projeto, em outubro, uma equipe técnica ficou no fundo do salão esclarecendo dúvidas dos moradores. “Aquilo foi uma estratégia para iludir as pessoas. Elas pensam que a indenização será algo muito bom. Não é bem assim”, observou. Ao criticar o novo traçado, que chama de linha vermelha (no projeto anterior a linha sobre o mapa era amarela), Adilena reclama que plantas e água são poupadas enquanto a história de vida das pessoas não. “A família toda está numa tensão só. Meu pai de 73 anos e meu tio deficiente são os que mais sofrem”, relatou.

Arrependimento e dor de cabeça

No dia da audiência pública, em Palhoça a doceira Jenniffer Klaumann, 25, bateu de frente com os representantes da ANTT. A aflição dela tem motivo. Vinte dias após comprar a casa no Alto Aririú, a moradora da rua Sertãozinho descobriu que o traçado original foi modificado e que sua casa seria desapropriada. “Só vim para cá porque fui à prefeitura e me garantiram que eu não teria problemas com esse assunto”, contou. Jenniffer aceita deixar a casa, mas quer ser bem indenizada por isso. “A propriedade está avaliada em R$ 270 mil, mas minha preocupação é com os transtornos de procurar outro imóvel, mexer com a papelada, fazer mudança. Passei por tudo isso há poucos meses. Estou cansada”, explicou a mulher, que mora com duas filhas e o marido. “Não quero nada menos do que conquistei aqui. Não aceitarei ser prejudicada pela alça de contorno. O trânsito não é problema meu”, disparou. No mesmo bairro a cabeleireira Maria Lucia Silva, 40, espera o dia em que será indenizada. “Prefiro sair daqui do que ser vizinha da barulhenta BR -101. O que acho errado é essa demora da Autopista. Que terminem isso de uma vez para que eu possa tocar minha vida”, pediu.

CRONOLOGIA

2008 Assinatura do contrato de concessão com a Autopista

2008/2009 Começo dos estudos para o pedido de licenciamento no Ibama.

Dezembro 2011 Primeira mudança de traçado autorizada pela ANTT.

Outubro 2012 Concessionária teve que recomeçar o processo para pedido de licenciamento ambiental junto ao Ibama. Porque houve novo pedido de alteração de traçado em Palhoça, devido ao desenvolvimento urbano da região.

Janeiro 2013 Carta da ANTT definiu o novo traçado do Contorno, acolhendo reivindicações regionais.

Março 2013 Os prefeitos dos municípios envolvidos assinaram a carta de anuência em relação às mudanças de traçado do Contorno entre o km 177,760 e o km 220 da BR-101.

Agosto 2013 Concessionária apresentou o plano de trabalho de diagnóstico de fauna da região do Contorno ao Ibama.

Abril 2013 O Ibama emitiu a autorização para a primeira campanha de coleta de fauna em relação ao EIA/RIMA.

Setembro 2013 Ibama publicou no Diário Oficial da União o recebimento EIA/RIMA do Contorno de Florianópolis.

Novembro 2013 Realizadas audiências públicas em Biguaçu e Palhoça.

Fevereiro 2014 A prefeitura de Palhoça, por meio da Fcam (Fundação Cambirela do Meio Ambiente) emitiu declaração de regularidade ambiental para obras do contorno viário, conforme solicitação do Ibama à Autopista.

(Notícias do Dia, 08/02/2014)