23 abr Comunidade se mobiliza para criação de Parque do Maciço da Costeira do Pirajubaé, na Capital
Solitária, a antena se destaca no cocuruto do morro das Almas, topo da terceira maior cadeia de montanhas de Florianópolis e de onde se tem visão de 360º da cidade. De lá, é possível ir ao Rio Tavares ou Canto da Lagoa, chegar à nascente do poção do Córrego Grande e à Lagoa da Conceição, ou descer até a avenida Jorge Lacerda.
O resgate de antigas trilhas, a maioria utilizada corriqueiramente até pelo menos meados do século 20, época de agricultura e pecuária intensas nos sertões da Ilha, é uma das propostas da Amap (Associação dos Moradores do Alto Pantanal) ao grupo de trabalho para implantação do Parque Municipal do Maciço da Costeira do Pirajubaé.
A intenção da comunidade é aproveitar resquícios do passado e viabilizar a prática do turismo ecológico no antigo caminho do Sertão do Pantanal. Paralelamente, conter ocupações irregulares e regenerar áreas degradadas por invasões recentes ou coivaras – roçadas seguidas de queimadas para renovação de pastagens ou plantio de cana-de-açúcar, mandioca, feijão, milho e cebola.
“Temos grande potencial histórico e turístico. No Alto Pantanal, há vestígios de pelo menos 40 engenhos de farinha e cachaça, e caminhos que, se reabertos, podem levar do Sul ao Norte da Ilha por cima da cadeia de montanhas”, diz o condutor ambiental Sílvio César, 42 anos, que mora na penúltima casa da rua professora Leonor de Barros, no caminho do pico do maciço e às trilhas históricas da antiga Freguesia de Trás do Monte.
No papel, o parque foi criado em 1980, para proteger 1.043 hectares remanescentes da mata atlântica no maciço da Costeira – parte da cordilheira central da Ilha. Hoje, 33 anos depois do decreto municipal, ainda não foi recategorizado pelo Snuc (Sistema Nacional de Unidades de Conservação).
Sem plano de manejo para regulamentar uso e ocupação, a encosta recortada por torres e cabos de alta tensão é coberta basicamente por gramíneas e arbustos. No caminho da antena, o que sobrou da mata atlântica primária protege desfiladeiros e penhascos que terminam numa sequência interminável de vales, quase tomados pelo crescimento urbano . E abre caminho para a descida de nascentes de água cristalina.
Grupo prioriza regularização fundiária na área do parque
No momento, o grupo formado também pelo CCpan (Conselho Comunitário do Pantanal), Floram (Fundação Municipal do Meio Ambiente), Câmara de Vereadores e UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) trabalha no levantamento para regularização da área ocupada, dentro e no entorno do parque.
Segundo projeção da Amap, são 200 famílias cadastradas, ou seja, cerca de 1.200 pessoas. A água é captada de forma improvisada, com mangueiras de uma polegada instaladas em pequenas represas abaixo de água cristalina, mas sem controle sanitário.
Antena integra rede contra calamidades
Estratégica em casos de emergências ou calamidades públicas, a antena de 80 metros de altura montada sobre galpão de concreto e protegida por cerca de arame farpado, é uma das polêmicas dentro do grupo de trabalho para implantação do parque. Para o geógrafo Aracídio de Freitas Barbosa Neto, 30, que levou o maciço da Costeira ao TCC (Trabalho de Conclusão do Curso) da UFSC, o equipamento abre precedente para ocupação do cume, como ocorreu a partir da década de 1960, no morro da Cruz, área central da cidade. “Por isso, é importante tirar o parque do papel, criar regramento e ações urbanísticas para definir a regularização fundiária”, diz.
Para a Araf (Associação de Radioamadores de Florianópolis), não existe polêmica. Montada há 10 anos em terreno da entidade, em parceria com empresa privada de telefonia, a antena serve de apoio à Defesa Civil estadual e está lincada ao sistema de telecomunicações da Polícia Militar.
“Apesar dos avanços tecnológicos, é fundamental em casos de emergências e calamidades públicas”, diz o diretor social da entidade, José Orlando Régis, 70. Ele cita o fuçarão “Catarina”, em março de 2004, como uma das situações de utilidade pública da rede de radioamadores. Ademir Silva, 40, diretor técnico da Araf, responsável pela manutenção, explica que, além de duas repetidoras locais (UHF e VHF), o equipamento instalado no morro das Almas está lincado a outros semelhantes, no morro da Boa Vista, em Rancho Queimado. “De lá, completa a cadeia de antenas no resto do Estado”, acrescenta.
Manutenção após caminhada no Morro
Períodos de chuva e descargas elétricas são os maiores obstáculos na rotina de Ademir, que não faz só a manutenção preventiva de cabos e demais componentes. “Recentemente, um raio causou avarias graves, e a rede ficou fora do ar. Foram cinco dias de trabalho ininterrupto para restabelecer o sistema”, conta.
Quando o tempo ruim não permite a subida nem de veículos com tração nas quatro rodas, Ademir vai a pé ao topo da montanha. Com pelo menos 30 quilos de ferramentas e peças na mochila, leva entre 1h30 e 2h para chegar ao local de trabalho. Sem pressa, para desfrutar da vista exuberante, e degustar araçás maduros que encontra pelo caminho.
(ND, 22/04/2013)