A aldeia que já fomos

A aldeia que já fomos

Por Carlos Damião (Notícias do Dia, 06/04/2013)
Folheando páginas antigas dos nossos jornais, em especial O Estado e A Gazeta, qualquer florianopolitano pode encontrar anúncios muito curiosos ou surpreendentes, que decretavam o “fim” da nossa aldeia. Por exemplo, sobre um desenho bonito, retratando o casario colonial (e obviamente inspirado nas obras do consagrado artista paulistano Volpi), o anúncio de uma construtora afirmava na década de 1970, sem qualquer pudor: “É uma pena, mas uma capital não tem o direito de ser somente patrimônio histórico”.
Digamos que esse era um senso comum à época, uma vez que não havia uma consciência muito clara sobre a importância do patrimônio histórico. A cidade antiga (a aldeia) foi sendo demolida sem muita piedade, porque era preciso abrir espaço ao progresso, atender às imensas demandas habitacionais que apareceram depois da fundação da Universidade Federal de Santa Catarina – e, tanto quanto, depois que a Eletrosul transferiu sua sede (1976) do Rio de Janeiro para Florianópolis.
“Morar no Centro… Ah, morar no Centro…”, dizia outro anúncio, que reproduzia uma imagem da área central da Ilha de Santa Catarina, vendendo a ideia das comodidades de se viver em apartamentos. “Montou-se um clima propício às mudanças”, registra o professor Nereu do Vale Pereira, em seu livro “Desenvolvimento e Modernização”, sobre a ação da publicidade. E a cidade aceitou (ou se conformou) com esse clima.
E a aldeia…
De certa maneira, ao anunciar medidas de proteção à cidade, na última terça-feira (2), o prefeito Cesar Souza Júnior deixou no ar um recado importante, não só quanto ao patrimônio histórico, mas também quanto às questões ambientais: Florianópolis precisa se organizar. Parece-me claro que essa determinação não é contrária à construção civil ou ao desenvolvimento econômico.
… do século 21
Pelo contrário: é possível continuar crescendo, mas com orientação, planejamento, legalidade e sustentabilidade. Bem diferente do que imperava nos anos 1970 e que, inexplicavelmente, veio sendo tolerado até 31 de dezembro de 2012. O mais importante, neste caso, é chamar a sociedade à discussão sobre o nosso futuro, ou seja, bem aquilo que o Plano Diretor Participativo deve proporcionar: carinho com a cidade, com o pouco de aldeia que ainda somos.