Construção civil teme prejuízos com suspensão de alvarás na Capital

Construção civil teme prejuízos com suspensão de alvarás na Capital

A polêmica revisão dos alvarás para construções em Florianópo­lis, que sugere o cancelamento de pelo menos 33 documentos, aba­lou as estruturas da construção civil na região. Além de prejuízo financeiro, entidades e empresá­rios reclamam da falta de seguran­ça jurídica na cidade, o que pode comprometer a captação de novos investimentos imobiliários.

Embora favorável ao reforço na fiscalização, o presidente da Associação Comercial e Industrial de Florianópolis (Acif), Doreni Ca­ramori Jr., teme pelos impactos negativos da medida. “Melhorar é sempre bom, mas se a cada qua­tro anos o novo prefeito fizer uma revisão do trabalho do prefeito anterior teremos dificuldades em desenvolver a cidade. Até porque os técnicos são os mesmos, quem muda é o prefeito”, avalia.

Como parte dos projetos que tiveram o alvará suspenso já es­tava em obras, Caramori Jr. acre­dita que a medida agrava o clima de insegurança jurídica. “Sou fa­vorável à melhora do processo, mas revisar por revisar gera uma insegurança que não é compatível com uma cidade que quer atrair investimentos”.

E se confirmada a suspensão dos 33 alvarás, após apresenta­ção de defesa por parte das cons­trutoras, o prejuízo também pode chegar ao bolso do consumidor, já que pela lei da oferta e da procura, com menos imóveis no mercado, os preços sobem, aler­tam empresários.

A prefeitura defende-se afir­mando que o objetivo da mudan­ça é justamente estabelecer regras claras em um mercado onde antes havia clima de incertezas. Para o procurador-geral do município, Julio Cesar Marcellino Júnior, a cidade passa, sim, a ser mais atra­tiva para os investidores sérios. “Vamos atrair os empresários que deixaram de investir em Florianó­polis por falta de critérios bem de­finidos nesse importante setor, que é construção civil”, afirma.

Instabilidade começou em janeiro

Além de revisar os alvarás concedidos no último semestre de 2012, a prefeitura passou os três primeiros meses deste ano sem emitir novos documentos, o que, segundo o presidente do Sindicato da Indústria da Construção (Sinduscon) da Grande Florianópolis, Helio Bairros, significa que cerca de R$ 500 milhões deixaram de ser movimentados na economia local, aplicados na contratação de profissionais, compra de insumos e pagamento de impostos para a própria prefeitura.

A conta fica ainda maior considerando o impacto nos projetos que tiveram alvará emitido em 2012 e agora estão ameaçados. Bairros explica que os empreendimentos são programados a partir da consulta de viabilidade, que é alicerçada no Plano Diretor e emitida ainda antes dos alvarás. “A partir do momento que a construtora tem essa autorização, é como se a prefeitura afirmasse: vá em frente, continue investindo porque você está dentro da lei”, compara.

Só a construtora Hantei havia investido R$ 22 milhões no projeto do Parque Hotel Marina Ponta do Coral, um dos empreendimentos que tinha aval inicial e agora recebeu parecer da prefeitura sugerindo cancelamento do alvará. Segundo o diretor da Hantei, Aliator Silveira, foram recursos gastos em estudos e análises feitos por iniciativa da empresa ou por pedidos dos órgãos de licenciamento. Ele diz que o projeto é antigo e está embasado em uma lei complementar de 2005, aprovada pela Câmara de Vereadores da Capital, que autoriza o aterro na região, desde que o investidor assuma uma série de contrapartidas, já previstas pela Hantei.

Preocupação entre os empresários

Dono da maior construtora do Estado, a Criciúma Construções, Rogério Cizeski, também vê a medida da prefeitura da Capital com preocupação. Embora a empresa criciumense não tenha sido afetada pela revisão dos alvarás, ele reforça o coro dos empresários que reclamam da insegurança jurídica em Florianópolis. “Dar a licença e depois retirá-la é algo muito complicado, um problema sério que só gera impactos negativos para o setor da construção civil”, afirma o empresário.

A Daros Engenharia, de Florianópolis, teve uma de suas obras, um prédio residencial no bairro Trindade, com recomendação de suspensão de alvará. Ainda sem a comunicação oficial da suspensão, o empresário Célio Daros contesta a decisão, lembrando que com o alvará em mãos a empresa já inicia as obas. “Quem dá o alvará é a prefeitura, não o prefeito. Não faz sentido o órgão liberar o alvará e depois ele mesmo retirá-lo. Nossos projetos passam por todos os tramites legais dentro da prefeitura”, afirma.

Novo padrão de projeto

A revisão dos alvarás para construções faz parte de uma nova política de desenvolvimen­to urbano proposta pela equipe que assumiu a prefeitura neste início de ano. Para o procura­dor-geral do município, Julio Cesar Marcellino Júnior, o que gera o clima de segurança jurí­dica reivindicado pelas empre­sas são justamente regras claras e empreendimentos funcionan­do dentro da lei. E é isso que as adequações propostas estão buscando oferecer ao mercado, segundo ele.

O secretário de Meio Am­biente e Desenvolvimento Ur­bano, Dalmo Vieira Filho, diz que não há exagero por parte das novas medidas, mas sim “uma qualificação para que as ações de hoje não afetem o fu­turo da cidade, prevalecendo o que é do interesse público”. Ele cita como exemplo a exigência de um maior comprometimento de cada empreendimento com seu entorno imediato, fazen­do com que novas construções possam agregar soluções e não apenas acirrar problemas que a cidade já possui. “Uma empresa que só olha para o seu lote, sem considerar a vizinhança, não é responsável”, afirma.

O presidente do Sinduscon da Grande Florianópolis, Helio Bairros, acredita que as em­presas que tiveram alvará sus­pensos conseguirão reverter o quadro, mas caso a situação se mantenha a prefeitura poderá ter que arcar com indenizações tanto para as construtoras como para os proprietários dos terre­nos, uma vez que o aval inicial para o negócio já havia sido li­berado pelo órgão responsável do município.

O procurador Marcellino Jú­nior, no entanto, lembra que a administração pública tem o de­ver de reavaliar todo ato defla­grado com vício, independente­mente de prejuízos financeiros que possa causar. Ou seja, con­firmadas as pendências ou irre­gularidades, a prefeitura estaria livre de qualquer indenização, mesmo ue acionada. Mas ele afirma que a proposta não é de parar obras. “A ideia é chamar os empresários para ver a docu­mentação e pedir os ajustes ne­cessários”.

Concorrência com prédios irregulares

O presidente da Acif, Doreni Caramori Jr., cobra que a mesma atenção da prefeitura com os projetos em andamento seja dada aos casos de obras irregulares sem qualquer tipo de alvará.

“O principal esforço do poder público para conter o crescimento urbano de Florianópolis é voltar o olhar para o que está acontecendo à revelia da prefeitura, como as ocupações irregulares e as obras sem qualquer documentação. É fundamental melhorar o controle dos alvarás. Mas é ainda mais fundamental fazer com que todas as obras peçam esse alvará”, defende Doreni.

O diretor da Hantei, Aliator Silveira, concorda: “Ao empreendimento formal pode estar faltando um documento ou outro, e é certo cobrar isso. Mas ao informal, falta tudo. São construções que não contribuem em nada para o município e estão cada vez mais presentes na cidade”. Ele diz que os bairros de Canasvieiras e Ingleses são exemplos de áreas com crescente ocupação irregular.

ENTENDA O CASO

Os antigos alvarás

No início do ano, a nova gestão da prefeitura determinou a revisão dos requerimentos de consultas de viabilidade, de projetos aprovados e de alvarás de licença concedidos referentes a obras de construção, reconstrução, ampliação, reforma, trasladação e demolição de edificações multifamiliares com mais de 2 mil metros quadrados. A medida vale para os documentos emitidos entre 1º de junho e 31 de dezembro de 2012.

A prefeitura analisou 150 projetos e apenas 27 (18%) foram considerados aptos a manterem as licenças. Outros 33 (22%) tiverem alvarás suspensos e 90 (60%) deverão apresentar novos documentos e/ou revisar projetos. Segundo a prefeitura, foram apontados problemas como falta de licenças ou uso irregular de determinadas áreas. Após oficialmente notificadas, as empresas terão 15 dias para apresentar defesa.

Os novos alvarás

No início do ano, a nova gestão da prefeitura cancelou as concessões de alvarás para empreendimentos com mais de 2 mil metros quadrados por três meses. O decreto perdeu a validade na última terça-feira, dia 2.

Entre as exigências válidas a partir de agora, baseadas no atual Plano Diretor e no Código de Obras, estão questões como estudo específico de tráfego; localização em rua com iluminação pública e recolhimento de lixo; viabilidade técnica do fornecimento de energia elétrica pela Celesc; viabilidade técnica de fornecimento de água pela Casan; e projetos com análise de drenagem, captação no solo e vazão de águas pluviais.

Ainda estão suspensas as concessões de novos alvarás para as construções com mais de dois mil metros quadrados na Lagoa da Conceição. A norma vale até que ocorra a aprovação do novo Plano Diretor de Florianópolis, que previsto para ser enviado à Câmara de Vereadores no segundo semestre.

(Notícias do Dia, 06/04/2013)