10 jul A dor de cabeça dos prefeitos
O Estatuto das Cidades (lei federal 10.257) entrou em vigor em outubro de 2001 e estabeleceu um prazo de cinco anos para que os municípios com mais de 20 mil habitantes ou integrantes de regiões metropolitanas elaborem seu plano diretor – a lei municipal que regula toda a organização do espaço urbano, determinando o que pode ser construído e onde. Mas nem todas essas cidades conseguirão aprovar seu plano diretor dentro do prazo. O prefeitos que não cumprirem a lei até outubro deste ano correm o risco de incorrer em crime de improbidade administrativa (que pode inclusive levar à suspensão de direitos políticos) se não conseguirem cumprir até outubro deste ano exigências de uma lei federal aprovada em 2001.
Entre os municípios do entorno da Capital, cinco enquadram-se no critérios de cidade com mais de 20 mil habitantes, de acordo com última estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): Florianópolis, São José, Palhoça, Biguaçu e Tijucas. A gerente de Desenvolvimento Urbano da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável, Terezinha Marcon, lembra no entanto que a lei complementar estadual 162/1998 criou a Região Metropolitana da Grande Florianópolis, reunindo as 21 cidades que integram a Associação dos Municípios (Granfpolis). “Em decorrência dessa lei, todos os 21 municípios da região enquadram-se na exigência do Estatuto das Cidades de ter seu plano diretor, inclusive os menores”, esclareceu a gerente.
A exigência da lei atinge municípios muito diferentes, como a capital Florianópolis, com quase 400 mil habitantes, e Anitápolis, com menos de 3 mil. Mesmo em Florianópolis, onde o debate sobre a regulamentação dos espaços urbanos está mais avançada, nem todos ainda compreendem o que significa um plano diretor. “O processo de elaboração do plano diretor tem duas fases, a identificação e a ocupação das áreas do município”, explicou Lúcio Dias da Silva Filho, integrante da Associação de Amigos do Parque da Luz, uma das entidades comunitárias que participam das discussões em Florianópolis.
A lei deve determinar quais áreas devem ser preservadas e quais podem ser ocupadas (identificação). Depois de feito esse macrozoneamento, entra a fase mais complicada, a de definir como cada uma dessas áreas pode ser utilizada, como por exemplo, onde se pode erguer prédios de 15 andares e onde só pode existir uma praça. O plano diretor também pode envolver o planejamento do sistema de transporte público da cidade, vital nas aglomerações urbanas maiores.
Capital não cumprirá Estatuto
Em Florianópolis, já é certo que o novo plano diretor não será aprovado no prazo que estabelece a lei. Mas um esforço envolvendo o Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf), vários outros órgãos municipais, Câmara de Vereadores e entidades da sociedade civil está em movimento para elaborar o novo plano, ainda que com atraso. Na quinta-feira, o Ipuf reuniu cerca de 300 pessoas, representando entidades públicas e não-governamentais, para discutir a composição de um “núcleo gestor” colegiado, com a função de acompanhar a elaboração do projeto de lei, bem como tomar algumas decisões quando a diretrizes a serem adotadas.
Florianópolis tem um plano diretor aprovado em 1997 (Lei Complementar 001), antes do Estatuto das Cidades, que entrou em vigor em 2001. O Fórum da Cidade, uma reunião de técnicos e entidades comunitárias que discute e propõe medidas para o desenvolvimento sustentável da Capital, argumenta no entanto que o atual plano diretor não atende às exigências do Estatuto, e por isso um novo deveria ser aprovado no prazo de cinco anos, que expira em outubro. “O plano diretor atual não foi elaborado de forma participativa, com audiências públicas, e por isso não atende à lei”, disse a integrante do Conselho de Articulação do Fórum da Cidade Telma de Oliveira.
O presidente do Ipuf, Ildo Rosa, propõe outras interpretações da lei, em reunião na Câmara de Vereadores no mês passado. “O Estatuto das Cidades estabelece o prazo de cinco anos para as cidades que ainda não tinham plano diretor quando a lei federal entrou em vigor, e determina a revisão do plano diretor a cada dez anos. Como Florianópolis já tem um plano diretor, de 1997, o prazo para revisão iria até 2007”, disse Ildo Rosa. O Fórum da Cidade discorda, e o próprio Ipuf mobilizou o núcleo gestor para, até outubro, apresentar pelo menos as diretrizes gerais. A criação do núcleo foi instituída pelo decreto 4.215/2006, assinado pelo prefeito Dário Berger (PSDB), no dia 12 de junho
Núcleo gerenciará propostas
Mais de 300 pessoas, entre representantes de organizações não-governamentais, entidades empresariais e órgãos públicos, participaram na quinta-feira de uma reunião no Teatro Álvaro de Carvalho (TAC) para discutir o processo de elaboracão do novo plano diretor da Capital. O Ipuf apresentou a proposta de composição do Núcleo Gestor (40% governamental, 30% de ONGs e 30% de entidade empresariais). Uma audiência pública a ser convocada até o fim do mês vai ratificar essa composição e estabelecer um sistema de discussão do projeto nas comunidades.
De acordo com o presidente do Ipuf, Ildo Rosa, a cidade será dividida em 12 ou 14 regiões, que elegerão seus delegados. Esses representantes levarão ao Núcleo Gestor as demandas das comunidades, que serão combinadas com a leitura feita pelos técnicos, para daí tirar as propostas que entrarão no plano diretor. Depois de feita essa compilação entre a leitura da comunidade e dos técnicos, as propostas do Núcleo Gestor serão discutidas novamente nas regiões, para que então possa ser decidido o que entrará ou não na proposta de plano diretor. O texto final de todo esse processo será ainda encaminhado como projeto de lei à Câmara de Vereadores, para que aprove o novo plano diretor.
Rosa reconhece que todo esse processo leva tempo. “O prazo antes definido, para outubro, foi para o espaço”, disse. “Nas discussões, houve consenso de que não se deveria apresentar à Câmara uma proposa incompleta ou feita no afogadilho, por isso as discussões vão se estender, de forma democrática, para que o novo plano diretor tenha realmente participação da população”.
Para Ildo Rosa há razões que justificam o atraso do Ipuf em cumprir o Estatuto das Cidades. “A própria lei prevê financiamento do Ministério da Cidade para a elaboração do plano, e o termo de referência foi encaminhado ao governo federal, para o repasse de R$ 500 mil, mas o dinheiro não veio. Essa é uma das razões”, disse o presidente do Ipuf.
(Carlito Costa, A Notícia, 10/07/2006)