04 abr Risco de desabamento é o novo capítulo da Ponte Hercílio Luz
Consórcio responsável pela obra usa relatório reservado, faz contatos, e se mexe nos bastidores para alertar sobre uma fatalidade se o novo governo mantiver a decisão de contrariar o anterior e não priorizar a ponte em 2011, liberando R$ 60 milhões
O novo capítulo da novela da restauração da Ponte Hercílio Luz é o alerta de que ela corre o risco de desabar. Nos bastidores, o Consórcio Monumento percorreu na última semana gabinetes de deputados e meios de comunicação para afirmar que a mais antiga ligação entre Continente e Ilha de Santa Catarina não está em segurança. Até um relatório sobre os riscos foi feito.
Desde 2008 atuando na obra e com parte da responsabilidade sobre atrasos no cronograma, é a primeira vez que o consórcio levanta em tom de alarme a hipótese de que a ponte pode cair. Isso ocorre justamente quando o governo de Raimundo Colombo anuncia que vai diminuir drasticamente a liberação de verba e que não há mais prazo para terminar a obra, postura contrária a da gestão anterior.
De acordo com o coordenador do Consórcio Monumento, Cássio Magalhães, a Hercílio Luz só estará em segurança após a construção da estrutura de sustentação provisória do vão central, uma espécie de ponte sob a ponte. Enquanto isso não for feito, Magalhães diz que a qualquer momento pode ocorrer uma fatalidade.
Apesar de o aviso vir com teor de novidade, a ponte está em risco desde quando foi interditada em 1982, com base em um laudo do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo.
Mesmo com o alerta do consórcio, o governador Raimundo Colombo não mudou a sua postura. Diz que está trabalhando para diminuir os riscos da ponte, mas salienta que é uma obra muito cara para os cofres do Estado e que não resolve o problema de tráfego. Para ele, a Hercílio Luz se trata somente de um monumento.
– A obra não está parada, mas tem um custo elevado. É um símbolo de Florianópolis e merece atenção. Para solucionar o problema de trânsito vamos nos concentrar em uma nova travessia, que é mais barata do que investir na Hercílio Luz, que vai ter seu uso limitado – afirma Colombo, demonstrando a sua prioridade de governo.
A restauração não está parada, mas segue a passos lentos. O governo estadual está disposto a injetar R$ 14 milhões na obra em 2011. Mas só para a construção da estrutura provisória que garantiria a segurança da ponte, o Consórcio Monumento aponta que precisa de pelo menos R$ 60 milhões. Esse valor é justamente, a quantia prevista pelo governo anterior para investir na Hercílio Luz este ano.
Pela Lei de Orçamento Anual de 2011, foram reservados R$ 20 milhões dos cofres do Estado e R$ 40 milhões do FundoSocial.
Segundo o secretário de Infraestrutura, Valdir Cobalchini, a nova gestão vai redirecionar a destinação de parte dos recursos para a construção e recuperação de estradas. Ele diz que o orçamento da secretaria tem que ser utilizado em obras de mobilidade urbana e transporte. Para se ter ideia do que o valor previsto para a Hercílio Luz representa no sistema viário do Estado, R$ 60 milhões é o quanto a pasta gastará com a restauração das rodovias danificadas pela chuva desde janeiro.
– Ainda não decidimos, mas a ponte, será usada para pedestres e atividades de visitação – diz o secretário.
Ao considerar a ponte como um bem cultural e turístico, Cobalchini alega que o ideal é buscar investimentos em parcerias público-privadas e da Lei Rouanet de Incentivo à Cultura para terminar a restauração, ideia que outros governos propuseram, mas não tiveram êxito. O secretário diz que está elaborando um projeto para apresentar às empresas e entidades financiadoras.
Os contatos já começaram a ser feitos. De certa forma, é como se a restauração estivesse voltando à estaca zero, já que não se sabe quanto tempo o governo levará para conseguir o recurso. Isso se, realmente, alcançar esse objetivo, já que a obra é cara: ainda são necessários R$ 172 milhões para finalizá-la totalmente.
(DC, 04/03/2011)
LHS e Colombo discordam
Mesmo sendo aliados, o governador anterior discorda do atual sobre a importância da Ponte Hercílio Luz para desafogar o trânsito da Capital. Não priorizar o monumento é uma das mudanças de rumo desta gestão, considerada de continuidade. Enquanto Raimundo Colombo não vê a restauração da primeira ligação Ilha-Continente como solução, o seu antecessor Luiz Henrique da Silveira prometia a recuperação para uso de transporte de massa. O hoje senador não conseguiu concluir a obra e diz que mantém sua opinião. O Consórcio Monumento também garante que a ponte suportaria o tráfego de veículos.
Segundo LHS, pelos estudos feitos, a ponte restaurada suportaria um metrô de superfície por ter sido projetada para receber também a passagem de trem. A licitação do estudo de viabilidade para o sistema foi aberta em 2009, mas a segunda colocada recorreu no Tribunal de Justiça, que ainda não julgou a ação. O valor do veículo seria alto, mais de R$ 300 milhões. O governo anterior afirma que existem linhas de financiamento internacionais para investir em projetos deste tipo.
– O metrô de superfície reduziria o tráfego de milhares de veículos individuais, o que poderia dispensar a construção de uma quarta ponte – defende Luiz Henrique.
O senador observa que a Hercílio Luz já está em obras, por isso é importante terminá-la enquanto são feitos os estudos e licitação da quarta ponte, pois essas etapas precisariam de mais de três anos. Sobre os motivos que levaram à não conclusão da restauração do monumento em sua gestão, com atrasos de mais de dois anos, ele afirma que houve problemas ambientais e necessidade de mudanças técnicas.
De acordo com o coordenador do Consórcio Monumento, Cássio Magalhães, a ponte também estaria apta a receber a passagem de veículos. Ele observa que a Hercílio Luz teria a capacidade de absorver 30% do tráfego das Pontes Pedro Ivo Campos e Colombo Salles (hoje com 170 mil carros/dia.
– Após a restauração, qualquer veículo, até ônibus ou caminhão, poderá passar pela ponte – garante Magalhães.
(DC, 04/04/2011)
De mão em mão em 14 governos
Quando a Ponte Hercílio Luz foi interditada, em 1982, a prioridade foi construir a terceira travessia. Quase 30 anos se passaram, o assunto do momento já é a quarta ligação Ilha-Continente e ainda não foi finalizada a restauração da mais antiga. Durante todo esse período foram 14 governadores, de diversos partidos, mas com discursos similares: o Estado não tem verba, é necessário buscar financiamentos.
A decisão de interditar a ponte ficou a cargo do então governador Jorge Bornhausen, em janeiro de 1982, três meses antes de deixar o mandato para concorrer na eleição ao Senado. Ele procurou redirecionar recursos buscados junto ao governo federal para a continuação do aterro da Baía Sul para a construção da terceira ponte.
– Naquela época, nem sabíamos se era possível restaurar a Hercílio Luz. Precisávamos fazer uma nova travessia – conta Bornhausen.
Até a conclusão da Pedro Ivo, a restauração da primeira ligação era levada em banho-maria. A única coisa feita de imediato foi reforçar com cabo de aço o olhal rompido.
Em 1983 começou a negociação para contratar a Steinmann Birdsall, empresa que projetou a ponte, mas a proposta de trocar toda a barra de olhal por cabo de aço trouxe questionamento sobre o custo de US$ 30 milhões e a alteração das características originais. A UFSC propôs um projeto de recuperação que consistia em reforçar o olhal rompido com outro, ao lado. Entre idas e vindas, os dois pré-projetos só foram finalizados em 1997, no governo de Paulo Afonso Vieira. Nenhum deles foi utilizado.
A restauração começou a ganhar forma com a licitação do projeto, em 1998, financiado pelo Departamento Nacional de Estradas e Rodagens (DNER – atual Dnit) por R$ 5 milhões. O documento foi entregue somente em 2003.
O deputado federal Esperidião Amin, no período em que foi senador (1991/1999), foi um dos políticos que negociaram com o governo federal o investimento no projeto. Em 2001, quando foi governador pela segunda vez, tentou inserir a execução da obra no pacote de financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o BID 4. Não conseguiu porque, para receber a verba, o projeto deveria estar pronto.
– Naquela época, calculávamos que a restauração custaria US$ 40 milhões (cerca de R$ 100 milhões pela cotação do dólar na época) e o BID financiaria no mesmo pacote de investimentos para a duplicação da BR-101 Sul – lembra Amin.
Somente quando LHS assumiu, em 2003, o projeto foi entregue. Começou o processo de licitação para a recuperação da ponte. A previsão era de que a obra ficaria pronta em 2010, mas com os atrasos, a parte mais cara da restauração, o vão central, ficou para o atual governo. Com o aumento dos prazos e novas demandas, a obra estimada em R$ 120 milhões há oito anos, já custa R$ 271,1 milhões.
(DC, 04/04/2011)