Tendência no mundo todo, hortas comunitárias estimulam cooperação entre vizinhos em Florianópolis

Tendência no mundo todo, hortas comunitárias estimulam cooperação entre vizinhos em Florianópolis

Alface, couve, rabanete, beterraba, tomate, morango, flores comestíveis, milho, maracujá, ervas medicinais e tudo mais que for possível. Toda semente é bem vinda na horta orgânica comunitária do Pacuca, no Campeche, em Florianópolis, uma iniciativa do bairro que está mostrando que a união entre a comunidade, conselho comunitário e poder público de forma voluntária pode dar certo.

A semente inicial foi jogada em maio de 2015, e pouco tempo depois germinou. Centenas de voluntários chegaram para participar da horta coletiva, cada um colaborando com um pouco do seu saber e muita boa vontade. Em formato de campo de aviação, em um terreno na Rua Pequeno Príncipe, tão simbólico para o bairro, a comunidade já entendeu que a horta provém mais do que frutas, legumes e hortaliças: promove aprendizado, integração, amizade, saúde e cooperação.

Para quem participa, é mais do que ter alimentos saudáveis do lado de casa: funciona como terapia. A representante comercial Bianca Pulice, 34 anos, faz parte do Grupo Quintais de Floripa, um dos idealizadores da horta, e bate ponto toda semana no local. Natural de São Paulo, ela está morando em Florianópolis desde fevereiro, e assim que soube resolveu participar:

— Sou entusiasta da agroecologia, acho importante que todos saibam o valor de plantar o alimento. Por meio da horta foi que consegui expressar minha vontade de cuidar do mundo. A horta comunitária é uma construção diária, a gente aprende a se relacionar, faz amizades. A última coisa é a colheita — relata.

O composto inicial e o cepilho (podas urbanas trituradas) foram doados pela Comcap, mas desde dezembro os próprios resíduos orgânicos (restos de comida, cascas) que são entregues pela comunidade vão para a compostagem e são processados no local por Eduardo Elias Rodrigues, da Destino Certo, transformando o que era lixo em adubo fértil para florescer alimento, remédio e vida, fechando o ciclo da matéria orgânica.

Com o trabalho diário com as enxadas, pás, plantando e colhendo, os voluntários vão aprendendo os conceitos de permacultura e sintropia (veja no box). O terreno, que antes era um espaço de descarte de lixo irregular, vai se tornando modelo para outros bairros. Somente na região do Campeche, já são quatro hortas comunitárias:

— Fizemos uma capacitação para o grupo aprender algumas técnicas e hoje temos um zelador permacultor, que é um senhor aposentado, pois a horta exige cuidados diários. Todos que participam podem colher, sem nenhum custo, e isso vai gerando uma mudança na comunidade. Atualmente já conseguimos processar 10 toneladas de lixo orgânico por mês, muita gente vem aqui entregar o seu baldinho. Nossa meta é chegar a 250 famílias — explica.

O presidente da Associação dos Moradores do Campeche (Amocam), Ataíde Silva, destaca a importância de ocupar as áreas públicas com iniciativas da própria comunidade:

— A horta é uma ferramenta importante, tem um lado educativo, nutricional. As crianças de escolas e creches vem aqui visitar.

Poder público unido com as comunidades em mutirões

Para dar o pontapé inicial, ou melhor, a capinada inicial nas hortas, a Companhia Melhoramentos da Capital (Comcap) está agindo como uma das principais apoiadoras. O presidente Marius Bagnati explica que o início se deu em junho de 2015, quando participou de um seminário sobre resíduos orgânicos e produção de compostagem. A Companhia, responsável pela separação da matéria orgânica em Florianópolis, primeiro criou a feira de orgânicos no Centro aos sábados, dando apoio aos pequenos produtores e fornecendo o adubo proveniente da matéria orgânica.

— Começamos criando a conscientização para o consumo de alimentos locais, saudáveis e de baixo custo, e agora estamos apoiando a implantação das hortas nos bairros, emprestando ferramentas nos mutirões, fornecendo cepilho e composto orgânico — explica.

Líderes comunitários também foram capacitados em cursos do Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo (Cepagro), e a Comcap está recebendo uma demanda cada vez maior de comunidades interessadas em implantar hortas. O conceito de sintropia — aproveitamento máximo dos recursos naturais — também está sendo passado para a população:

— Nosso objetivo, além de promover a conscientização sobre consumo de alimentos saudáveis, livres de agrotóxicos, é estimular as pessoas a separar os resíduos orgânicos para produzir o composto que pode ser usado em hortas e jardins — destaca Bagnati.

Atualmente, a Comcap coleta e aterra em Biguaçu mais de 60 mil toneladas de resíduos úmidos — restos de comida, cascas de frutas, legumes, podas de árvores — por ano. Grande parte disso poderia ser reaproveitado se houvesse separação na fonte, dentro das casas, para compostagem, a exemplo do que acontece no pátio de compostagem junto à horta do Pacuca.

— Assim se fecha um ciclo, é uma questão de consciência, de cuidar do meio ambiente, e ainda diminuiria os custos da cidade com coleta, transporte e aterro sanitário.

Separando os resíduos orgânicos e os recicláveis secos recolhidos pela coleta seletiva da Comcap, sobrariam para encaminhar ao aterro sanitário apenas os rejeitos, em torno de 20% de tudo que é produzido hoje em Florianópolis.

(DC, 01/09/2016)