02 out PECs e pontes
(Por Sergio da Costa Ramos, DC, 02/10/2015)
Retrato de um país, uma Constituição é como se fosse o “corpo” de uma nação – cabeça, tronco e membros. Tão mais equilibrada, saudável e longeva é esta nação quanto mais sólido e consolidado for o seu organismo legal.
A Constituição de Filadélfia, de 1787, é um marco na história dos povos e dos direitos humanos. Sobrevive nos EUA há 228 anos como uma carta de princípios, com poucos artigos e 23 emendas, 10 das quais compõem o Bill of Rights, coração da democracia moderna: ali estão os direitos de livre expressão, imprensa, reunião, religião e petição junto ao Judiciário.
No Brasil, de 1834 a 1988 “elegeram-se” oito constituições, algumas outorgadas. E o retrato é confuso, tanto quanto pode ser atrapalhada uma nação presidida por uma Carta de quase 500 artigos e um sem-número de emendas, algumas tão irrelevantes quanto as que alteram artigos que deveriam estar numa lei ordinária. Na nossa Carta Cidadã, o sujeito quer aumento de salário e já pensa numa PEC – mais um remendo no “Livrinho”.
Temos aqui um sério problema de cultura, um vício rapinante: se não deu pelo caminho legal, invente-se uma saída no jeitinho, na fórmula de tornar legal o ilegal e o imoral. Mexe-se na Constituição como se esta fosse uma letra de samba experimental numa roda de bambas da Mangueira. Não há deputado ou senador que não tenha apresentado a sua PEC, na expectativa de perpetrar o seu mesquinho casuísmo.
O Brasil será mais livre e respeitado no dia em que deixarem a Constituição em paz
Parece que há uma conspiração para desqualificar qualquer homenagem ao doutor Hercílio Luz. A casa que lhe pertenceu mal sobrevive a uma eterna reforma, mais ou menos como a malsinada ponte que leva o seu nome. E o aeroporto Hercílio Luz continua onde sempre esteve: parado.
Sobre a ponte, diga-se que o mais sério esforço de restauração responsável ocorreu nos últimos quatro anos. Empenho que não merece um descosturado relatório, que quer somar e dar sentido a um enredo de duas gerações de desmazelos.
Houve, por certo – e por muito tempo – inércia e má gestão. Mas recuperar a ponte para o tráfego urbano não é uma má ideia: desde que haja seriedade técnica e gestão. Ou será zero o custo de uma nova ponte ali no canal Estreito e uma criteriosa demolição da Hercílio?