28 jan Proprietários de terreno invadido em Florianópolis descartam acordo para desapropriação
Acordo para implantação de assentamento de reforma agrária no terreno ocupado há 44 dias, na Vargem Pequena, Norte de Florianópolis, foi descartado ontem pelo advogado Sérgio Jates Gomes, um dos defensores da empresa Florianópolis Golf Club e dos familiares do ex-deputado estadual Artêmio Paludo, proprietários da área.
“Não há qualquer possibilidade”, reagiu Gomes, também genro de Paludo. O único acordo viável para a família na audiência pública de conciliação, no dia 7 de fevereiro, na Capital, é permitir a desocupação pacífica do terreno. “Sem necessidade de força policial ou trauma social. Temos posse desde 1979”, diz. Ele questiona a informação de que são 1.500 pessoas e que 98% trabalham. “Como chegam e saem diariamente sem interferir no trânsito do bairro?”
Entre os acampados, a expectativa é provar que nem toda a área está escriturada, e garantir a desapropriação para fins sociais. Na Vara Agrária, a ação de reintegração de posse é referente a duas áreas localizadas no km 14 da SC 401, ao lado do rio Ratones. Uma com matrícula 71.263 e 2.030.484 m²; e outra com matrícula 71.264, com 23.130 m², somando 25.050.000 m², ou seja, 250 hectares.
O acampamento, segundo o secretário da Segurança Pública, César Grubba, é monitorado de fora pelo serviço de inteligência da Polícia Militar, que atua no entorno. “Por determinação da Justiça, não podemos entrar na área”, argumenta Grubba.
De acordo com levantamento do 21º BPM (Batalhão da Polícia Militar, e da 7ª Delegacia da Polícia Civil, com jurisdição no Norte da Ilha, não foi registrado aumento dos índices de criminalidade na região desde o início da ocupação, em 15 de dezembro do ano passado. Vargem Pequena, com cerca de 1.500 moradores fixos – mesmo número acampados – ainda é um dos bairros mais seguros daquela região da cidade.
César Grubba levou ao governador Raimundo Colombo (PSD) o despacho do juiz agrário, Jeferson Zanini. A relação dos acampados, com identificação dos chefes de família por meio de RG (carteira de identidade) e CPF, foi entregue sexta feira ao Incra (Instituto Nacional de Reforma Agrária), que encaminhará ao judiciário. (Colaborou Colombo de Souza)
Partes trocam acusações
Enquanto se preparam para a audiência de 7 de fevereiro no Fórum Antônio Luz, as partes travam batalha judicial nos bastidores. O advogado Sergio Tajes Gomes denuncia que uma casa da família também foi arrombada e invadida na área. “É duplo crime”, diz. O porta-voz dos acampados rebate com denúncia de investimento público no projeto de criação de camarão em cativeiro, em 1985.
Naquele ano, portaria da extinta Sudepe [Superintendência do Desenvolvimento da Pesca], ligada ao Ministério da Agricultura, declarou o projeto Paludo Agropesca “de interesse para o desenvolvimento do setor pesqueiro e merecedor da colaboração Financeira do Fiset [Fundo de Investimentos Setoriais], e condiciona a continuidade dos repasses à prestação de contas dos primeiros módulos implantados.
O projeto da Paludo Agropesca foi extinto em 1990, segundo o empresário Artêmio Paludo, entrou em falência depois de afetado pelo vírus da mancha branca, doença que causou mortandade e inviabilizou o processo produtivo do crustáceo.
ENTENDA O CASO
PASSO A PASSO
Dezembro de 2013
Dias 15/16
Grupo de 52 famílias ocupa terreno entre a margem Norte do rio Ratones e a SC-401, em Vargem Pequena, para fazer reforma agrária urbana. No local, entre 1996 e 2001 funcionou cultivo de camarão em cativeiro.
Dia 23
Liminar assinada pelo juiz Fernando Vieira Luiz, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Florianópolis, determina imediata reintegração de posse à empresa dona do terreno. Oficial de Justiça pede reforço policial, mas despejo é adiado.
Dia 26
Grupo de 52 índios da etnia kaingang, do Rio Grande do Sul, se une ao grupo. Em apenas 11 dias, a ocupação “Amarildo de Souza” já contava com mais de 200 pessoas, entre adultos e crianças. De cinco a 10 famílias chegavam por dia à ocupação.
Janeiro de 2014
Dia 10
Juiz Fernando Vieira Luiz, da 2ª Vara da Fazenda Pública, dá vistas ao Ministério Público, mas recesso de fim de ano atrasa encaminhamento de ofício. Cresce número de famílias acampadas.
Dia 15
Conselho Tutelar da Criança e do Adolescente se manifesta, informalmente, sobre falta de infraestrutura básica e condições de saúde e higiene das crianças acampadas com os pais. Não há vagas em creches e escolas públicas na região.
Dia 20
Já são 400 famílias acampadas. Promotor Raul Rabelo, da 17ª Promotoria de Florianópolis, dá vistas ao processo e recomenda permanência na 2ª Vara da fazenda Pública de Florianópolis, e cumprimento da reintegração de posse.
Juiz Fernando Vieira Luz, com base em resolução do Conselho de Magistratura, se considera incompetente para julgar conflito, e transfere processo para Vara Especial Agrária, com sede no Fórum de Chapecó. Acampados festejam vitória.
Dia 22
Juiz agrário Jeferson Zanini marca audiência pública para 7 de fevereiro em Florianópolis, e proíbe entrada de novas famílias. Incra, Polícia Militar, Funai, Prefeitura de Florianópolis, proprietários e acampados são convocados para conciliação.
Dia 23
Representantes do Incra e da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SC visitam o acampamento, e são informados que a lista dos acampados seria entregue no dia seguinte. Advogado Camilo Simões Filho, dos proprietários, decide esperar audiência, sem novo recurso ao TJ/SC.
Dia 24
Advogado Robson Ceron e coordenação entregam ao ouvidor agrário Fernando Souza lista dos acampados, com nomes, RG e CPF dos chefes de cada uma das 725 famílias cadastradas, conforme determinou juiz agrário Jeferson Zanini.
(Notícias do Dia, 28/01/2014)