12 nov Desenhando uma Florianópolis melhor
O que a Capital pode aprender com o exemplo de Barcelona, que mudou conceitos no deslocamento dos moradores
Os problemas urbanísticos que Barcelona teve de enfrentar há duas décadas são os que Florianópolis precisa resolver hoje. A capital catarinense foi construída de costas para o mar e com problemas de mobilidade. Era assim a cidade da Espanha, que conseguiu reverter essa situação com as intervenções para as Olimpíadas de 1992. Florianópolis não precisa esperar por um grande evento para trabalhar as ideias espanholas.
O professor Francesc Ventura, da Universidade Politécnica da Catalunha, esteve na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), na última semana, para uma palestra sobre mobilidade. Ele foi o diretor de arquitetura e habitação do governo da Catalunha em 1992, comunidade autônoma da Espanha onde fica Barcelona. A principal ação na cidade europeia foi priorizar os pedestres, ciclistas e transporte coletivo.
Conforme a arquiteta urbanista e professora da UFSC Dora Orth, Florianópolis está cada vez mais distanciada do mar por causa da prática de aterrar para criar novas avenidas.
– A cidade cresce e não se prevê os espaço necessários. Então a saída são sempre os aterros – observa.
Segundo a arquiteta urbanista Silvia Ribeiro Lenzi, consultora aposentada do Instituto de Planejamento Urbano (Ipuf), todos os projetos de mobilidade em discussão na Capital deveriam passar pela análise do órgão municipal, inclusive os projetos executados pelo Estado. A diferença das cidades europeias, que conseguiram vencer os problemas de urbanismo e mobilidade, foi justamente planejar a longo prazo.
– Aqui a visão da gestão pública é ainda muito imediatista. Além de recompor o Ipuf, que está com defasagem de especialistas, município e Estado deveriam parar com os discursos isolados e alinhá-los com o plano diretor – defende Silvia.
(DC, 12/11/2012)
“Os responsáveis públicos souberam motivar as pessoas”
O professor Francesc Ventura, da Universidade Politécnica da Catalunha, participou do programa Condomínio Legal e foi entrevistado pelo apresentador Renato Igor, da CBN Diário. Ventura participou das alterações urbanas que melhoraram Barcelona e esteve em Florianópolis para uma palestra.
Como era Barcelona até 1992 e como foi o processo de transformação da cidade?
Francesc Ventura – Até meados dos anos 1980, a cidade vivia de costas para o mar. Havia uma linha ferroviária entre a cidade e o mar. Havia uma área industrial que também impedia que a cidade ficasse de frente para o oceano. Com os Jogos Olímpicos, tiraram a linha ferroviária, houve uma transformação no porto e toda a zona industrial foi desmantelada. Investiu-se em transporte público. E houve uma melhora no aeroporto.
Como foi possível chegar a um pacto com a sociedade local? Eles aceitaram essa transformação?
Ventura – Sim, a cidade historicamente, nos últimos 150 anos, cresceu em momentos pontuais. Não houve um crescimento contínuo. Os Jogos representavam uma oportunidade de dar um grande salto na qualidade da cidade. Os responsáveis públicos souberam motivar as pessoas.
O que foi feito do ponto de vista de trânsito e mobilidade urbana? Qual é a grande ideia que foi feita lá? O senhor acredita que ela poderia ser usada em Santa Catarina?
Ventura – Temos que resolver nossos problemas copiando dos outros, mas encontrando nossas próprias soluções também. Durante a preparação dos Jogos Olímpicos, as intervenções feitas foram voltadas para veículos privados. Essas vias novas rapidamente se congestionaram. Mais quantidade de vias, maior quantidade de veículos, maior o congestionamento. Entendemos que devíamos apostar em duas estruturas: abandonar a ideia de cidade extensa e dispersa, de zonas familiares e industriais, que obrigava mais deslocamentos e voltar para uma cidade compacta, densa, em que as atividades econômicas ficassem mais juntas. Mais de 50% dos deslocamentos são feitos a pé. O melhor modo de se mover é andar.
Barcelona tem ruas voltadas apenas para pedestres, que é um espaço de convivência. Essas ramblas já existiam nesse modelo antes da Olimpíada?
Ventura – Existiam os espaços, mas estavam voltados para o veículo privado. Tivemos que reservar espaços exclusivos para os pedestres.
De que forma Barcelona trata os ciclistas?
Ventura – Uma iniciativa com êxito extraordinário é o uso das bicicletas públicas. Mas existe um inconveniente: as pessoas usam a bicicleta para descer das partes altas, mas sobem com transporte público, e as bicicletas ficam embaixo. Temos que criar um serviço de recuperação de bicicletas para elas voltarem ao lugar.
Carro tem acesso restrito em alguns pontos? Paga pedágio?
Ventura – Só há restrições em estacionamentos. No Centro, há poucos lugares para estacionar e, os que existem, são pagos. Há muitos edifícios que têm plantas subterrâneas com estacionamentos, mas é caro. Esse mecanismo desestimula o uso de carros.
(DC, 12/11/2012)