Chris Carlsson acredita na necessidade de uma remodelação das cidades

Chris Carlsson acredita na necessidade de uma remodelação das cidades

‘Massa Crítica não surgiu para protestar’, aponta o idealizador do grupo

Teve início nesta quinta-feira o Fórum Mundial da Bicicleta na Usina do Gasômetro, em Porto Alegre. O evento acontece um ano depois do atropelamento coletivo de um grupo de ciclistas na Cidade Baixa. As atividades, que contam com oficinas e passeios, vão até domingo. O norte-americano Chris Carlsson, um dos idealizadores do grupo Massa Crítica, que começou a atuar em 1992, em San Francisco, ministrará dois painéis. Em entrevista ao Jornal do Comércio, Carlsson conta como o movimento foi criado e qual a motivação que leva os ciclistas a se reunir. Ele também comenta o acidente com os ciclistas na Capital.

Jornal do Comércio – Como foi o surgimento do Massa Crítica?

Chris Carlsson – Nesta época muitas pessoas começaram a andar de bicicleta em razão dos movimentos contra os carros e contra a poluição. No início era um movimento ecológico em San Francisco. Após algumas conversas, o grupo pensou que isso poderia ser um estilo de vida; para mostrar para as pessoas que a bicicleta pode fazer as mesmas coisas que um carro. Neste momento, as pessoas começaram a se reunir no meu escritório, para beber cerveja e conversar sobre política e estilo de vida. Muitos vinham de bicicleta e decidiram voltar para casa juntos. Nesta ida para casa, como tinha bastante gente, chegaram a trancar as ruas. Ainda não existia um nome para o grupo. A partir daí esse movimento começou a acontecer mensalmente, e se deu o nome de Massa Crítica.

JC – Como era a receptividade que as pessoas tinham com o Massa Crítica no seu surgimento e como é hoje?

Carlsson – No início, as pessoas achavam muito diferente. Alguns se perguntavam: “o que esses caras estão fazendo?” Mas hoje, nos Estados Unidos, a receptividade depende muito de um local para o outro. Cerca de 60% a 80% das pessoas que estão ao redor quando o grupo passa comemoram e apoiam o uso das bicicletas. Existe um número muito pequeno, eu diria uns 5%, que fica muito zangado, porque não entende o movimento e também nos considera uns desempregados e que deveríamos estar fazendo outras coisas. Mas a aceitação está crescendo.

JC – No Brasil o movimento é bem recente. Como é possível fazer essa motivação durar, como acontece nos EUA nestes 20 anos?

Carlsson – O principal é ter prazer no que se está fazendo. Aproveitar que está andando de bicicleta e chamar os amigos. Não se pode pensar que o movimento é feito para protestar, mas sim trazer as pessoas para se conhecerem, para realizar uma atividade que te proporcione prazer. Hoje o que se vê muito é a falta de comunicação, você não conhece o seu vizinho e as pessoas em geral. Esse pode ser o espaço para essa conversa. Quando a gente vê que mais pessoas estão aderindo, é mais uma etapa que está se vencendo.

JC – Quais mudanças uma cidade precisaria fazer para que as pessoas passassem a utilizar cada vez mais a bicicleta como meio de transporte?

Carlsson – Reconstruí-la. Hoje em dia, boa parte das cidades tem as ruas projetadas para a utilização de carros. O ideal seria ter uma boa parte das faixas voltadas para pedestre e outra para quem anda de bicicleta, que é um meio mais saudável e mais correto. Também uma pequena parte para os carros e tentar reduzir ao máximo os espaços para o estacionamento de automóveis. Isso forçaria as pessoas a ir a pé, ou de bicicleta, ou outro meio que não fossem os carros. Em cidades em que existe um planejamento, as pessoas passaram a fazer mais uso da bicicleta.

JC – Qual a sua reação quando soube do atropelamento dos ciclistas, integrantes do Massa Crítica, que aconteceu há um ano em Porto Alegre? Existiram outros casos semelhantes nos países onde o movimento acontece?

Carlsson – Eu achei surreal. O pessoal que participa do Massa Crítica em diversos países, como o Peru, a Colômbia, os Estados Unidos, teve conhecimento. Foram trocados muitos e-mails e artigos foram publicados em blogs. Foram feitos cartazes como forma de protesto contra o atropelamento. Houve muita discussão sobre o fato, porque nunca havia acontecido uma coisa semelhante nesses 20 anos. Acontecem pequenos acidentes no mundo com os integrantes do grupo, muitas vezes ocasionados por policiais, que em alguns locais são muito repressivos. Entretanto, em vez de diminuir a atuação do movimento, eles fortalecem. Esse acidente de Porto Alegre foi o pior que já aconteceu com o Massa Crítica.

Evento promove passeios ciclísticos

No final da tarde desta quinta-feira, o Fórum Mundial da Bicicleta promoveu um passeio com cerca de 150 ciclistas, com o objetivo de fazer as pessoas conhecerem a cidade utilizando bicicletas. O grupo, que saiu da Usina do Gasômetro, passou por alguns pontos históricos do Centro, como o Cais Mauá, o Parque da Redenção e o Mercado Público.

Nesta sexta, o evento contará com diversas oficinas e painéis, como Bicicletas em Pauta – Mobilidade e Cicloativismo nos Grandes Meios de Comunicação; Porto Alegre e a Bicicleta – Problemas e Soluções; e Nowtopia: A Utopia do Agora – Como Programadores Piratas, Ciclistas Fora-da-lei e Jardineiros de Terrenos Baldios Estão Inventando o Futuro hoje!, com Chris Carlsson, no Parque da Redenção. Todas as atividades são gratuitas e não há necessidade de inscrição.

Ainda nesta sexta, o Massa Crítica realiza, às 18h30min, a sua pedalada mensal. No sábado, o fórum irá promover outro passeio pela cidade, desta vez ao Morro do Osso, na zona Sul. O grupo sairá às 8h. Mais informações no site http://forummundialdabici.com.

(Jessica Gustafson, Jornal do Comércio, 24/02/2012)