09 jan No litoral de Santa Catarina, águas variam entre verde, azul, marrom e até cinza
Fenômeno impressiona moradores e turistas
Mar e lagoa estão entre os maiores atrativos de Santa Catarina no verão. Águas que variam entre verde, azul, marrom e até cinza fazem a satisfação de moradores e visitantes do Estado. Por trás de cores, que muitas vezes os olhos custam a acreditar, estão vários elementos naturais. Mas afinal, o que determina estas colorações que costumam vir em ondas?
Especialistas destacam que a combinação de inúmeros fatores influencia nos tons finais e é responsável justamente pela singularidade dos balneários. O oceanógrafo da Universidade Federal de SC (UFSC) Afonso Bainy explica que a cor é caracterizada pela composição e espessura dos grãos de areia, pelas formações geológicas, pelas correntes marítimas com diferentes tipos de microalgas e, inclusive, pela profundidade da água. A poluição por esgotos também pode dar um indesejável aspecto escuro. Com a influência do vento, a mudança de cor pode ocorrer até de um dia para o outro.
Pelo recorte das praias, que protegem as regiões em relação a ondas e ventanias, e pela composição dos sedimentos, o oceanógrafo do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) de Florianópolis Sílvio de Souza Júnior aponta que Santa Catarina concentra alguns dos melhores pontos de mergulho do país. Essa característica tende a se perder da porção sul do Estado, a partir de Laguna, até o Rio Grande do Sul. De acordo com o professor, a coloração mais escura da região se deve à maior concentração de argila na areia e à maior influência da corrente marítima que vem das Malvinas.
Vale enumerar, então, algumas referências de praias em Santa Catarina, com tons mais claros ou mesmo mais escuros, mas sem esquecer que o caráter dessas águas é passageiro. Se o filósofo grego Heráclito disse que ninguém se banha duas vezes no mesmo rio, especialistas comprovam que é igualmente impossível tomar banho mais de uma vez no mesmo mar.
Águas escuras nas baías da Ilha
O mar das baías tende a ser mais escuro, como explica o oceanógrafo Sílvio de Souza Júnior. Essas praias sofrem influência da saída de água doce da região do Continente e da Ilha. As praias de Jurerê e Daniela são alguns exemplos. Segundo o especialista, os rios carregam sedimentos de decomposição de folhas, além de areia e barro, que têm uma coloração marrom.
O geógrafo da Fundação do Meio Ambiente (Fatma) David Vieira Fernandes complementa que há lodo no fundo das praias das baías da Ilha, presente também nos manguezais. Com as ondas, esse fundo se desprende, deixando a água mais turva. O profissional destaca que esse lodo é uma matéria orgânica natural. Ele só lamenta que, em alguns casos, o lodo se soma ainda ao despejo de esgoto, o que torna impróprios pontos de praias do Norte, como acontece em Canasvieiras.
Apesar do tom mais escuro, quando limpas, as praias principais da baías Norte e Sul da Ilha garantem a preferência de veranistas.
— Todo mundo fala que Jurerê, por exemplo, está entre as mais lindas — afirma José Paulo Miranda, de Tatuí, SP.
Um processo semelhante, com a grande presença de rios, com grande material orgânico, ocorre nas praias do Litoral Norte do Estado, como Itajaí e Navegantes.
Na parte rasa, é transparente; e na parte funda, lodo deixa água marrom
As lagoas já têm um aspecto naturalmente marrom, pelo material orgânico natural, pelo lodo no fundo e em decorrência de vegetações em decomposição, que chegam pelas chuvas. Porém, a principal razão das duas ou três cores da Lagoa da Conceição são os problemas ambientais, como apontam os especialistas.
O oceanógrafo do ICMBio Sílvio de Souza Júnior explica que as algas que se proliferam pela contaminação de esgoto se decompõem e apodrecem, soltando um material marrom. A água chega a ficar transparente, nas partes que estão muito rasas. Sílvio expõe que a região está perdendo profundidade com a areia vinda das dunas. Porém, a construção de casas na região, com a retirada de vegetação dos morros, o que amplia o deslocamento de lama, o que pode acelerar esse processo de assoreamento.
A cor pode mudar ainda conforme o reflexo do sol e a influência do vento.
O geógrafo da Fatma destaca que, depois do terceiro dia de vento sul, a água costuma ficar mais clara. Já o vento do norte ou nordeste tende a remover mais o fundo da praia, trazendo mais sedimentos para a superfície. Hipótese que os moradores da Ilha sabem de cor.
— O vento norte remexe o fundo, enquanto o sul leva a sujeira embora — conta o instrutor de remo Pablo Bernardes, de 30 anos.
Em Governador Celso Ramos, as características geográficas deixam a água limpa
A tonalidade das praias de Bombinhas, de um modo geral, é generosa na concentração de azul. As praias centrais do município são lotadas de turistas que vieram em busca de um mar mais claro.
— A água é muito clara, boa para mergulhar — diz João Lenon Lopes, de 20 anos, de Joinville.
Na Praia da Sepultura, se encontram turistas ainda mais incrédulos com a cor da água.
— Quando olhamos a praia de cima, achamos que não podia ter essa cor, que não tinha como ser mar — expõe a gaúcha Gislaine de Campos, em visita a Bombinhas com o marido e os amigos.
O oceanógrafo da UFSC Afonso Bainy explica que o recorte do município protege as praias de ondas e ventos, o que evita a suspensão da areia que pode escurecer a água. Além disso, não há saídas de rios trazendo matéria orgânica. A água clara no local conta ainda com a presença dos costões que auxiliam na proliferação de peixes. Esse contexto faz o paraíso dos visitantes.
— Vimos muitos peixes — entusiasma-se a estudante argentina Diana Sargo, de 22 anos.
O oceanógrafo da ICMBio Sílvio de Souza Júnior conta que as praias de Governador Celso Ramos têm condições semelhantes. De acordo com ele, a área se aproxima a uma península, sem grandes quantidades de água doce que possam mudar a coloração. A formação facilita ainda a influência da corrente marítima do Brasil, caracterizada por águas mais quentes e que, de acordo com Sílvio, tendem a ser mais claras.
Protegida de ondas fortes, a Ilha do Campeche oferece um mar transparente
A cor da Praia do Campeche, como toda a parte leste, costuma ser mais clara, em relação ao outro lado da Ilha de SC. A região é contemplada pelo mar aberto e é menos influenciada pela matéria orgânica dos rios. Mesmo assim, a clareza não se iguala à da Praia da Sepultura, em Bombinhas. De acordo com o oceanógrafo do ICMBio Sílvio de Souza Júnior, a corrente marítima do sul, vinda das Malvinas, se encontra com a corrente do Brasil, vinda do norte, na altura do litoral catarinense. Na área de Florianópolis, ainda tem mais influência a corrente das Malvinas, de águas mais frias e cor mais escura.
Além disso, em dias de vento, a água do Campeche pode ser mais turva. O geógrafo da Fatma David Vieira Fernandes destaca que as águas mais escuras da região das baías podem dar a volta à Ilha e chegarem à praia. De acordo com ele, é um volume muito grande de água que está em dinâmica constante, atingida também pela direção dos ventos.
O fluxo constante de água de mar aberto, aliado à falta de rios trazendo material orgânico e à areia mais clara constroem o cenário único da Ilha do Campeche. Os oceanógrafos ainda ressaltam que o próprio continente protege a Ilha de ondas mais fortes, que poderiam colocar sedimentos em suspensão. Os privilegiados que chegam ao local encontram uma água de um azul tão claro que chega a ser quase incolor.
Corrente azulada
O geógrafo da Fatma David Vieira Fernandes conta que não é raro se ver, pelo litoral de todo o Brasil, inclusive de SC, uma corrente divisória de água mais azul em meio ao restante mais escuro.
Segundo o especialista, são correntes de águas quentes que, em constante movimentação, atravessam as praias e, nesta época do ano, se aproximam da costa.
Essas correntes que passam por águas mais profundas são muito procuradas pelos pescadores, por trazerem espécies de peixes como o dourado e o marlim-azul.
(Por Gabrielle Bittelbrun, DC, 08/01/2012)