29 ago Vidal Ramos e João Pinto. Os contrastes do Centro Histórico de Florianópolis
Enquanto comerciantes disputam o aluguel de uma loja na rua Vidal Ramos, há poucos passos dali na João Pinto as portas se fecham
Se forem colocadas lado a lado, Vidal Ramos e João Pinto têm diferenças que chocam. Enquanto na primeira os comerciantes aguardam por floreiras que deixarão o local ainda mais atraente, na segunda, os pedestres andam com os narizes tapados por casacos, blusas e lenços. Qualquer coisa para evitar o desagradável cheiro sentido em toda a extensão do calçadão.
Os anos de descuido com o centro histórico de Florianópolis motivaram um grupo de comerciantes, liderados por Rose Macedo Coelho, coordenadora do núcleo de lojistas da Vidal Ramos, a revitalizar a rua que agora será conhecida como um open shopping, ainda que conte com seis condomínios residenciais. Todo o processo começou há três anos com as primeiras reuniões entre os comerciantes, Acif (Associação Comercial e Industrial de Florianópolis) e Prefeitura Municipal. O grande objetivo do grupo é atrair consumidores para as 56 lojas de rua, que estavam perdendo espaço para os shoppings da cidade.
Somente a Secretaria Municipal de Obras investiu R$ 400 mil na revitalização da rua Vidal Ramos totalizando quase R$ 700 mil. Os R$ 300 mil restantes foram investidos pelos comerciantes e pela Acif (Associação Comercial e Industrial de Florianópolis).
Na próxima semana, a rua deve receber mais novidades com a colocação de iluminação especial nos toldos das lojas. Até setembro a revitalização deve ficar pronta, com o recebimento de equipamentos, como floreiras e mais bancos.
União que faz a diferença
Há três anos, quando começaram as primeiras reuniões para a reestruturação do espaço na rua Vidal Ramos, um ou outro comerciante aparecia para debater as melhoras. Hoje com 80% dos 56 estabelecimentos comerciais participando do projeto, Rose Macedo Coelho, que coordena o núcleo de lojistas da Vidal Ramos, comemora o sucesso do primeiro passo da revitalização.
“Trabalho aqui há 20 anos e entendi que precisava fazer a diferença de alguma maneira. Acredito que se os comerciantes não arregaçassem as mangas para melhorar o ambiente, o poder público não agiria sozinho”, desabafa Rose.
O resultado da parceria feita pelos comerciantes com a iniciativa pública tornou-se exemplo na opinião da diretora de planejamento do Ipuf (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis), Vera Lúcia Gonçalves. “É necessário acontecer esse tipo de união, afinal, precisamos de todos os setores trabalhando em conjunto para que alguma melhoria aconteça”, destaca Vera Lúcia.
Possibilidades para o Centro Histórico
Muito se fala em melhorar as outras ruas que compõe o Centro Histórico de Florianópolis, entretanto, poucas ações específicas são feitas para transformar o espaço. A diretora de planejamento do IPUF (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis), Vera Lúcia Gonçalves salienta que a Capital está participando do plano PAC-CH (Programa de Aceleração do Crescimento de Cidades Históricas), mas o recurso para a revitalização de toda a área ainda não foi aprovado. “A prioridade é começar as ações pelo Largo da Alfândega”, diz Vera Lúcia.
No calçadão da João Pinto, um dos comerciantes que encabeça o processo de revitalização é o proprietário da Medic Formula, Antônio Carlos Wiezorkoski. Ele é vinculado à CDL (Câmara de Dirigentes Lojistas, onde há um grupo que debate sobre as melhorias para a região desde o ano 2009, porém, ele garante que desde 2003 há comerciantes unidos informalmente para melhorar a João Pinto. “Nós como cidadãos precisamos nos unir para criar uma democracia participativa para saber como exigir do governo. É a união dos comerciantes que vai dar força ao movimento”, diz Antônio.
Os comerciantes das ruas Francisco Tolentino e Conselheiro Mafra também se engajaram em ação semelhante àquela feita na rua Vidal Ramos. “A Acif (Associação Comercial Industrial de Florianópolis) está apoiando essa ação junto aos comerciantes que se interessarem em melhorar a situação das ruas e avenidas do Centro Histórico”, aponta a consultora dos núcleos setoriais da Acif, Isabel Guenther.
Da beleza…
Enquanto esperava as portas das lojas abrirem, a atendente Adriana Neves, 21, aproveita um dia de sol para ler um livro sentada em um dos bancos da rua Vidal Ramos. Pela via revitalizada, ela nem se incomoda com os carros, afinal, eles seguem o ritmo da rua e trafegam muito mais devagar em relação a outros lugares. “Está mais bonito, dá vontade de estar aqui. Tem ruas do Centro que eu tenho até medo de andar”, garante Adriana.
Além da beleza da rua, lojas de calçados e roupas são chamarizes da Vidal Ramos. A secretária Viviane Masqueio, 36, faz questão de visitar a rua quando precisa ir às compras e conferir as novidades da estação.
“Temos a via gastronômica de Coqueiros e agora acho que teremos a via dos sapatos e das roupas com direito a alguns cafés para matar a fome”, compara Viviane. A vaidade feminina foi privilegiada em todos os sentidos. Com a calçada adequada na Vidal Ramos, os saltos altos estão liberados nos passeios sem interferências de buracos.
De acordo com Isabel Guenther, consultora de núcleos setoriais da Acif, desde que ganhou um aspecto novo, aumentou o número de pessoas que têm a Vidal Ramos como trajeto diário. “Ainda não temos uma pesquisa concreta, mas os comerciantes estão sentido diferença”, esclarece.
…para o abandono
Mal cheiro, sujeira e esgoto correndo à céu aberto é um resumo do que o calçadão da João Pinto apresenta àqueles que passam por ele. O espaço abandonado não atrai os turistas, sendo freqüentado por estudantes de cursinhos pré-vestibulares que mantêm as aulas na rua do calçadão. À noite a João Pinto é tomada por usuários de drogas e álcool que vêem no Terminal Cidade de Florianópolis, localizado ao lado do calçadão, dormitório.
Nem mesmo bancos estão disponibilizados na João Pinto, tanto que os estudantes Thaís Leite, 29, e Paulo Macedo, 35, não têm onde fazer um lanche no intervalo de aula. “Precisamos comer em pé mesmo”, reclama Thaís. Os estudantes, vindos de São Paulo (SP), dizem-se preocupados com a violência da região onde estudam. “Decidimos fazer cursinho pela manhã porque ficamos com receio de vir até aqui durante a noite”, pondera Paulo.
O reflexo de tanto desleixo dá as caras na situação comércio. O pouco movimento de pedestres obrigou muitos lojistas a fechar as portas. Em bons tempos, Cláudio Zeferino, contava com oito funcionários. Hoje ele está sozinho na loja de utilidades herdada do pai. “Como ninguém faz nada para melhorar a região, vou pintar a loja para tentar melhorar o visual”, comenta Zeferino que dedica tempo do fim de semana para pintar de vermelho berrante, a fachada que será seu cartão de visitas.
(Por Saraga Schiestl, ND, 28/08/2011)