Moradores da Lagoa apreensivos com decisão judicial que determina demolições no bairro

Moradores da Lagoa apreensivos com decisão judicial que determina demolições no bairro

Margem para incertezas
Os moradores da Lagoa da Conceição estão apreensivos com a decisão da Justiça que exige a demolição de construções a 15 metros da faixa de areia. A medida é para pôr em prática o Plano Diretor dos Balneários. A lei de 1985 determina, ainda, a abertura de passagens para acesso ao público até a margem em cada 125 metros.
Opresidente da Associação de Moradores da Lagoa (Amola), José da Costa é contra a decisão. Segundo ele, existem casas e estabelecimentos comerciais em toda a orla. As construções, segundo Costa, foram aprovadas pela prefeitura de Florianópolis, portanto, estão regulares.
É o caso do supermercado do Chico, que paga o Imposto Sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) para o município, além de uma taxa (laudêmio) para a União.
– Estamos aqui antes mesmo da criação das leis. São mais de 40 anos prestando serviços. Se for determinada a demolição, as famílias de 20 funcionários perderão o seu sustento – lamenta uma das proprietárias do supermercado, Eliane Silveira.
No Canto da Lagoa não há como se aproximar da água sem passar por dentro de terrenos particulares. Até mesmo o posto de saúde, o núcleo de ensino infantil e a escola municipal ficam a menos de 15 metros da orla.Uma das donas do restaurante Carlito, Luisa Maria Garcez, diz que está há 17 anos no local e que deveriam ter interditado a construção na época em que foi erguida.
– Acho que quando abrirem as passagens para a Lagoa vão escolher a casa dos pobres e não a dos ricos.
O procurador-geral do Município, Jaime de Souza, disse já ter providenciado junto ao Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf) o levantamento onde serão necessário os acessos. Ao mesmo tempo, foi solicitada à Secretaria da Receita a lista de ocupações dentro dos 15 metros a partir da orla (onde deverão haver demolições) e entre 15 metros e 30 metros (deverão ser identificados e comunicados à Justiça).
– Depois do levantamento, vamos notificar os proprietários para deixar os 15 metros livres. Junto com a Justiça, vamos tratando o assunto com prudência. Não queremos passar a máquina por cima de uma hora para outra, mas precisamos respeitar o Plano Diretor dos Balneários – afirmou o procurador, que salientou que a prefeitura não tem como arcar com as indenizações e desapropriações.
A Justiça não deu prazo para as demolições, mas estipulou multa diária para o não cumprimento da lei em R$ 10 mil por dia.
Desapropriações já estão sendo discutidas

Autora da ação do Ministério Público Federal, a procuradora da República Analúcia Hartmann se reuniu ontem com o superintendente da Fundação de Meio Ambiente de Florianópolis (Floram), Gerson Basso, para tratar da lojística das desapropriações. De acordo com Basso, é uma ação de difícil cumprimento, pois conta com locais habitados e outras construções consolidadas. A procuradora passou a tarde em audiência e não pode atender a reportagem.
Perto do posto de saúde do Canto da Lagoa é possível avistar uma casa sendo erguida em um dos morros. O local fica a mais de 15 metros da faixa de areia, mas houve desmatamento para a construção. De acordo com o superintendente da Floram, a licença partiu da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano. O titular da pasta, José Carlos Rauen, informou que o local é de área de proteção limitada, onde pode haver construção em até 10% do terreno.
– A prefeitura deveria proibir novas construções, mas quem já está deveria ter o direito de ficar. Enquanto ficam discutindo prédios existentes, tem gente desmatando os morros para construir novas moradas – alerta o presidente da Amola, José da Costa.
O advogado Everton Staub explica que o direito adquirido dos moradores e comerciantes vale apenas para construções anteriores à legislação do assunto. Os parâmetros utilizados é a lei que cria as terras da marinha a partir de 1835, o Plano Diretor dos Balneários, de 1985 e o Código Florestal de 1965.
– Cada caso deve ser avaliado separamente – diz Staub.
LUISA MARIA GARCEZ
Dona de restaurante
Acho que quando abrirem as passagens para a Lagoa vão escolher a casa dos pobres e não a dos ricos.
ELIANE SILVEIRA
Dona de supermercado
Estamos aqui antes mesmo da criação das leis. São mais de 40 anos prestando serviços. Se for determinada a demolição, as famílias de 20 funcionários perderão o seu sustento.
A situação
2010
– Fevereiro – Justiça Federal em Santa Catarina atende ação civil pública do Ministério Público Federal, que determina demolição das construções na faixa de 15 metros da orla.
– Março – Prefeitura entra com recurso no Tribunal Regional de Justiça da 4ª Região, em Porto Alegre.
– Setembro – A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) negou recurso da prefeitura de Florianópolis e manteve sentença.
O QUE A PREFEITURA DEVE FAZER
– Garantir a faixa mínima de 15 metros a partir do espelho da água, como determina o Plano Diretor dos Balneários.
– Abrir acessos para a lagoa a cada 125 metros.
– Fazer o levantamento de todas as construções que estão a 30 metros do mar, considerado área de marinha.
O QUE O MINISTÉRIO PÚBLICO EXIGE
– Frear a ocupação irregular.
– Aplicar a legislação federal para impedir novas ocupações.
– Evitar o uso privativo da Lagoa por casas de veraneio, hotéis e clubes, que fiquem sobre a faixa de areia.
– Permitir o acesso à lagoa por todos os moradores e turistas.
Fonte: Sentença da A 3ª Turma do Tribunal
Regional Federal da 4ª Região (TRF4)
MAIS DE 2,5 MIL CONSTRUÇÕES
– Das 10 mil construções registradas pela Amola, estima-se que 2,5 mil estão a menos de 15 metros da água.
– De acordo com a Associação dos Moradores da Lagoa, o boom imobiliário na região começou em 1980. Atualmente são poucos os pescadores. A maioria voltou-se para o ramo da hotelaria e comércio.
(Por ROBERTA KREMER, DC, 05/10/2010)