09 set Relatório que aponta valor da biodiversidade para políticas locais é lançado em Curitiba
Relatório TEEB para Políticas Locais e Regionais (link em inglês) estimula autoridades locais a considerar benefícios da natureza nas ações políticas locais.
Os serviços prestados pelos diferentes ecossistemas do planeta têm um grande valor econômico; eles podem valer até trilhões de dólares. A inclusão desses serviços e valores em políticas públicas pode ajudar as cidades e autoridades a economizar dinheiro e, ao mesmo tempo, melhorar a qualidade de vida, garantir meios de subsistência da população, gerar empregos e, assim, impulsionar a economia local.
Essa é a conclusão de um estudo internacional intitulado TEEB (sigla em inglês para A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade) para Políticas Locais e Regionais, que foi lançado hoje simultaneamente no Brasil, Bélgica, Índia, Japão e África do Sul.
TEEB é um estudo independente, liderado por Pavan Sukhdev, elaborado pela iniciativa “A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade” sediada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) com apoio financeiro da Comissão Europeia, Alemanha, Reino Unido, Holanda, Noruega e Suécia. O TEEB para Políticas Locais e Regionais faz parte de uma série de cinco relatórios interligados, que incluem o Relatório sobre Fundamentos Ecológicos e Econômicos, o TEEB para Tomadores de Decisão e o TEEB para o Setor de Negócios.
No Brasil, além do lançamento do relatório, está sendo realizado (dias 9 e 10 de setembro) um workshop para autoridades locais a fim de explorar as descobertas do TEEB no contexto da América Latina e Caribe. O evento, que conta com a presença de Sukhdev, é organizado pela cidade de Curitiba em conjunto com o Programa das Nações Unidas para Meio Ambiente (PNUMA), Programa das Nações Unidas para Desenvolvimento (PNUD), Fundação Avina, Unilivre e o Programa Global Canopy.
O relatório
O objetivo do relatório TEEB para Políticas Locais e Regionais é proporcionar um ponto de partida para pensar a política local de uma nova maneira. O relatório convida os tomadores de decisão locais a compreender o valor do capital natural em suas regiões assim como dos serviços oferecidos pelos ecossistemas, e considerar os benefícios da natureza na formulação de políticas locais, tais como o gerenciamento urbano, ordenamento territorial e gestão de áreas protegidas.
Com foco na praticidade, o relatório visa estimular as autoridades locais a adotar uma abordagem gradual para avaliar opções que considerem os benefícios da natureza nas ações políticas locais. Essa abordagem inclui: avaliação dos serviços dos ecossistemas e das prováveis mudanças na sua disponibilidade e distribuição; identificação dos serviços ecossistêmicos mais relevantes para questões políticas específicas; avaliação dos impactos das opções políticas sobre diferentes grupos na comunidade.
O relatório destaca a dependência que as cidades têm da natureza, e ilustra como os serviços dos ecossistemas podem oferecer soluções eficazes para os serviços municipais. Mostra também como, no desenvolvimento rural e na gestão dos recursos naturais, os serviços ecossistêmicos com alto valor de mercado muitas vezes são promovidos em detrimento dos serviços de regulação que são igualmente importantes, mas menos óbvios. Investiga, ainda, quadros de planejamento e avaliações de impacto ambiental que podem incluir de forma proativa um forte foco em serviços de ecossistemas e identificar o potencial econômico dessa mudança de abordagem.
Na véspera do lançamento do relatório, o líder dos estudos TEEB, Pavan Sukhdev, declarou: “Toda atividade econômica, assim como o bem-estar humano, seja em um cenário urbano ou não, é baseada em um ambiente saudável e funcional. Os valores múltiplos e complexos da natureza exercem impactos econômicos diretos no bem-estar humano e nas despesas públicas a nível local e nacional”.
Sobre a aplicação do TEEB no Brasil, Sukhdev apontou que o país “possui a maior capacidade biológica do planeta e já está dando passos significativos no sentido de integrar os conceitos de capital natural. Outros países da América Latina, como o Peru, também estão reconhecendo os benefícios de considerar a dimensão econômica da biodiversidade como fator relevante no planejamento público. Esperamos que este Relatório TEEB apoie o fortalecimento da ação a nível local”, afirmou.
Para Denise Hamú, secretária-geral do WWF-Brasil, o estudo sobre a valoração dos ecossistemas não é um fim em si, mas um ponto de partida. “O estudo avalia os benefícios da manutenção de ecossistemas em relação a intervenções urbanas, por exemplo. É o início de um processo bem informado sobre o valor da biodiversidade para gestores e tomadores de decisão, com indicações de como as políticas locais podem se dar de forma articulada e valorizando a natureza”, disse Hamú.
Experiências positivas
Autoridades locais do mundo todo estão percebendo o valor de incluir a abordagem dos ecossistemas no planejamento de suas políticas públicas. Exemplos dentro da América Latina e Caribe incluem:
* A cidade de Curitiba conseguiu aumentar a área verde por pessoa de menos de 1m²/capita para 52 m²/capita. Residentes locais plantaram 1.5 milhões de árvores e incentivos fiscais foram concedidos para a criação de projetos que incluíssem áreas verdes. Além disso, a construção de novos lagos em parques ajudaram na redução das enchentes (ICLEI 2005).
* O Fundo da Água de Quito, no Equador (também conhecido como FONAG) é um mecanismo de financiamento sustentável que permite a proteção a longo prazo dos ecossistemas naturais e a prestação de serviços ecossistêmicos. A bacia hidrográfica de Quito fornece cerca de 80% da água doce. Os consumidores da água pagam para o fundo a água potável que recebem. O fundo, por sua vez, investe na conservação das florestas que cercam os rios, lagos e córregos, e também financia projetos de reflorestamento em toda a comunidade para garantir o fluxo de água potável. O FONAG tem sido modelo para outros fundos de água na região. Programas de pagamento por serviços ambientais são financiados por fundos de água em alguns municípios da Colômbia, Peru e Brasil (Fonte: Adaptado de Benitez 2010).
* Ao procurar soluções para a fragmentação da Reserva da Biosfera de Mbaracayu, no Paraguai, os tomadores de decisão mapearam os custos e benefícios de cinco serviços dos ecossistemas e descobriram que a combinação da conservação com a mitigação das alterações climáticas traria o máximo de benefícios. Os serviços estudados foram a caça sustentável de animais selvagens, exploração sustentável de madeira, bioprospecção de produtos farmacêuticos, o valor intrínseco da natureza selvagem intocada e o armazenamento de carbono. Para calcular os benefícios de conservação, dois fatores foram considerados: i) quem se beneficiaria e ii) o valor de cada serviço ecossistêmico – por parcela de floresta, em seis tipos de floresta.
Os resultados mostraram que os custos e benefícios da conservação da floresta variam consideravelmente em um cenário relativamente pequeno, o que implica que algumas opções de zoneamento alcançariam uma conservação por custos muito mais baixos do que outras. Ao incluir apenas a bioprospecção, a caça e a madeira na análise, poucas parcelas passaram no teste custo-benefício da conservação, mas quando valores de carbono foram adicionados, os benefícios ultrapassaram os custos em 98% das parcelas de floresta. (Fonte: Adaptado de Naidoo e Ricketts 2006; Gross 2006)
Fora da América Latina, a cidade sede da 10ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, Nagoya, no Japão, também reconheceu os benefícios de unir os conceitos de políticas públicas às questões de conservação. Com o objetivo de evitar que a Planície de Maré de Fujimae – área vital para escala de aves migratórias – se tornasse um aterro sanitário, a Cidade de Nagoya iniciou um programa para redução e reciclagem de lixo.
O programa teve início em 1998 e envolveu a comunidade por meio de um programa educativo extenso sobre como reciclar corretamente. Os esforços valeram a pena e Nagoya atingiu a meta de diminuir em 20% o lixo produzido em dois anos e, com isso, ganhou uma série de prêmios nacionais de prática ambiental. Nos últimos dez anos, o volume de lixo separado triplicou, o volume de lixo processado caiu em 30% e o volume de aterro gerado foi reduzido em 60%. Desde 2002, a Planície de Maré Fujimae passou a integrar a lista Ramsar de Áreas Úmidas de Importância Internacional. (Fonte: Environmental Affairs Bureau, City of Nagoya)
Outras indicações
Ademais, o relatório TEEB para Políticas Locais e Regionais também estuda áreas protegidas e o aumento dos benefícios locais da conservação, e oferece orientação sobre os incentivos de recompensa da boa administração de capital natural local, tais como sistemas de pagamento localmente adaptados por serviços ambientais, certificação e rotulagem.
O Relatório TEEB para Políticas Locais e Regionais salienta ainda três questões que vão além da avaliação dos serviços ecossistêmicos que merecem atenção se o capital natural for levado em consideração para o desenvolvimento local:
1: Assegurar a distribuição equitativa do direito aos benefícios provenientes da natureza. Mudanças na política normalmente afetam a distribuição ou acesso ao serviço e devem ser levadas em consideração durante o processo de tomada de decisão.
2: Maximizar o uso do conhecimento científico disponível e experimentá-lo como forma de prover uma linguagem comum que possa capturar visões diversas.
3: Apoiar o comprometimento de partes interessadas durante o processo de priorização e desenvolvimento de ações possíveis e efetivas de política local.
Faça o download do relatório (em inglês).
(Por Adriano Gambarini, WWF-Brasil, 08/09/2010)