21 jul Ponte Hercílio Luz: Mão de obra que veio de longe
Vinte trabalhadores de São Paulo e do Nordeste dão forma à balsa que será usada na restauração do cartão-postal de SC
A máscara de soldador esconde o sorriso largo e cativante do construtor naval Wilson José Correia, 65 anos, conhecido pelos colegas e amigos como Dinho. Mesmo aposentado, ele não se dá o direito de ficar em casa, sem fazer nada. A paixão pelo trabalho, que se traduz na falta de rotina, trouxe-o até Florianópolis. Com outros 19 homens, vindos de São Paulo e do Nordeste, o sergipano Dinho participa da montagem de uma das duas balsas que serão usadas na restauração da Ponte Hercílio Luz.
O trabalho para montar a balsa, chamada de Flutuante Ilha 3, deve ser finalizado nos próximos 15 dias. Ela será usada para transportar os equipamentos para perfurar as rochas da fundação da estrutura provisória de sustentação do vão central da ponte. Uma balsa menor, a Flutuante Gisel, já está pronta e servirá de apoio para a maior.
O serviço é puxado – quase 12 horas por dia –, mas não é motivo para tirar o bom humor dos trabalhadores. Ao contrário, os sorrisos só não são vistos quando a máscara, usada para proteção durante a solda, encobre os rostos dos construtores navais.
O dia começa cedo. Às vezes, antes mesmo de o sol nascer. Quase todos dormem no alojamento, perto a um dos canteiros de obras da ponte. Dinho divide o quarto com outros três colegas. Às 6h, quem acorda primeiro chama os outros.
A pé ou de ônibus, vão até a Passarela Nego Quirido, onde está a balsa. Por volta das 7h30min, tomam café e, logo em seguida, dão início às atividades, feitas no convés ou no casco da Ilha 3.
Soldar, cortar e unir as chapas de aço são verbos que os homens conjugam todos os dias durante a jornada de trabalho, que termina depois que o sol se põe. Almoço, lanche e jantar são feitos em um contêiner, com mesa e bancos que lembram uma cozinha improvisada.
O intervalo das refeições também serve para pôr o papo em dia e estreitar a convivência.
– A gente convive meses como se fosse uma família e acaba ficando amigo. A boa convivência com os colegas é a melhor coisa do trabalho.
De Aracaju a Tramandaí, um trabalho sem rotina
Depois do almoço e da “conversa fora”, Dinho se distrai com as gaivotas. Recolhe um pouco da comida que sobrou e dá para as aves. A prática já virou hábito em Florianópolis. Ele lamenta não ter tido tempo para conhecer as belezas das praias e não ter conseguido ir aos pagodes.
Há 30 anos no ramo, o aposentado já percorreu o Brasil em construções de oleodutos e montagem de balsas. Conhece de Aracaju (SE) a Tramandaí (RS). As três décadas de trabalho dariam direito ao descanso da aposentadoria. Mesmo assim, Dinho prefere não ficar parado. Não gosta de não ter o que fazer.
As viagens constantes ensinaram Dinho a driblar a saudade da família.
– A gente se acostuma, mas ainda dói. Entre nós, uma coisa é comum: a saudade de casa.
Para remediar a falta da mulher e do filho de quatro anos, Dinho liga a cada oito dias para a família. A saudade ameniza, mas não passa. Apesar disso, não troca o trabalho por nada.
– Não temos rotina. Trabalho ao ar livre, vejo o mar, conheço lugares lindos e faço muitos amigos.
(DC, 21/07/2010)