“O dólar baixo torna o Brasil caro”

“O dólar baixo torna o Brasil caro”

Do blog da Estela Benetti (30/01/2010)

A entrevista completa do empresário Fernando Marcondes de Mattos:

Esta temporada de verão está melhor que a anterior para o Costão do Santinho Resort, mas o número de turistas poderia ser maior se o dólar não estivesse baixo e a concorrência de navios de cruzeiros, que não pagam impostos e encargos trabalhistas, fosse menor.

A avaliação é do empresário Fernando Marcondes de Matto, 71 anos, fundador e presidente do conselho da CostãoVille, de Florianópolis, empresa que reúne o Costão do Santinho, Costão Golf, Costão Residence, e também controla a Inplac, indústria de embalagens em Biguaçu.

Empreendedor e polêmico, o empresário falou para a coluna sobre temas como alternativas para melhorar o turismo e busca de um sócio para o resort. Disse que foi injustiçado nas operações Moeda Verde e Tríade, da Polícia Federal, nas quais foi preso duas vezes, e também criticou gestão do secretário de Estado do Turismo, Gilmar Knaesel. Apesar de ter a família na gestão do negócio – a mulher, Iolanda e os filhos Felipe, Flávia e Fernanda –, o empresário diz que trabalha em três turnos. O grupo fatura R$ 300 milhões/ano e oferece 1,7 mil empregos diretos.

Perfil

Fernando Marcondes de Mattos é presidente do conselho de administração da CostãoVille, holding que controla o Costão de Santinho Resort, Costão Golf, Costão Residence e a indústria Inplac. Economista, advogado e ex-professor universitário, Marcondes tem 71 anos, é casado com Iolanda Marcondes de Mattos, tem três filhos _ Fernanda, Flávia e Felipe _ e seis netos. Foi secretário de Estado da Fazenda e de Administração. Em 2008, lançou o livro A Saga de um Visionário, contando sua trajetória.

Como está o fluxo de turistas nesta temporada?

Fernando Marcondes de Mattos _ Ano passado tivemos o rescaldo das chuvas no Vale do Itajaí. A hotelaria da Capital sofreu muito embora não tivesse sido afetada. Este ano, eu até esperava fluxo pior pela questão econômica da Argentina, mas estamos com um número razoável de argentinos e está aumentando bastante o de chilenos. A maioria do nosso público é do Brasil.

O dólar baixo afeta muito o setor?

Marcondes _ O dólar baixo é o nosso grande inimigo, torna o Brasil caro. Para o turismo de SC é desastroso. O Brasil, hoje, é um dos países mais caros, o que desmotiva a vinda de visitantes estrangeiros. Esse é o primeiro movimento ruim. O segundo, é que todo o mundo vai para o exterior. O meu irmão foi para Nova York, a minha cunhada foi para Nova York, o meu “irmão” Glauco Côrte foi para Nova York, o meu “irmão” Henrique Malta foi para Nova York. O Brasil inteiro está indo para o exterior. Essa questão de menos gente vindo e mais gente saindo fez com que a balança de turismo fechasse negativa em US$ 5,5 bilhões, dinheiro que poderia ser injetados no nosso Litoral, que depende do turismo. Porque onde tem turismo, é a única atividade. O dólar é um desastre para o Litoral do Nordeste.

O senhor mantém as críticas aos navios de cruzeiro?

Marcondes _ O terceiro ponto negativo para o nosso turismo de Litoral é a pirataria dos cruzeiros de cabotagem. Eu sou uma voz isolada contra isso. As pessoas se entusiasmam com o glamour, mas eles roubam os lugares da hotelaria de três, quatro e também de cinco estrelas porque não pagam imposto nenhum e não cumprem legislação trabalhista. Só nos custos trabalhistas, há uma diferença de alguns milhões entre um navio e um resort. O navio é um resort ambulante. Há navios com dois mil ou três mil leitos. Nós temos 1,8 mil leitos aqui no Costão. A Constituição de 1988 abriu a possibilidade da indústria de cabotagem, mas não regulou. Há empregados de navios que trabalham 14 horas por dia, sete dias por semana, sem o apoio de uma legislação trabalhista. A alimentação principal dessas embarcações vem do exterior, aqui eles compram só as verduras, e muitas vezes, sem pagar impostos. E ainda eles têm o maldito cassino que nós não podemos ter. É uma concorrência absolutamente desleal. Essas três coisas: muitos brasileiros viajando para o exterior, poucos estrangeiros vindo ao Brasil e a concorrência dos cruzeiros, seguramente roubam 50% do mercado brasileiro de turismo para lazer. É por isso que todos os hotéis estão sofrendo muito, inclusive nós. Vamos ter uma temporada razoável, mas insuficiente para remunerar o patrimônio e o resort. Podemos citar a costa do Sauípe que não consegue sair desse impasse de vende ou não vende.

Vocês já conseguiram um sócio para o Costão do Santinho?

Marcondes _ Nós tivemos a visita de um grupo alemão e de outros também. Temos interesse em negociar 50% do capital do Costão com dois objetivos, fortalecer financeiramente a empresa e, se possível, abrir canal com a Europa. Nós acreditamos que, mais cedo ou mais tarde, essa conexão com a Europa vai ser fundamental. Para isso, precisamos de voos da Europa que podem ter uma parada em São Paulo, mas que a aduana seja feita em Florianópolis. E o nosso aeroporto precisa de 500 metros mais de pista, sem isso, as grandes aeronaves não conseguem decolar. A diretora da Infraero, Maria Edwiges Madeira, é muito atuante eu tenho a impressão de que ela será nossa aliada nesse desafio.

Como enfrentar a sazonalidade?

Marcondes _ O estudo do WTTC apontou que o segredo nosso é a baixa estação. Nós temos que reduzir o impacto da baixa sazonalidade e ampliar o painel de atrações regionais. Temos que incluir as águas termais, as serras, etc… Eu gostaria de citar duas coisas. Primeiro, todos os balneários do mundo cobrem a baixa sazonalidade com equipamentos. Na costa do Sol, na Espanha, os campos de golfe são os equipamentos mais importantes. Aqui no litoral de SC o mais importante, na minha opinão, são as marinas. Com esses 500 quilômetros de costa nós deveríamos ter, pelo menos, 50 boas marinas. Aqui no Costão não conseguimos fazer. Os pescadores querem construir um trapiche na Praia dos Ingleses. Se me perguntassem, cite uma ação para melhorar o turismo do Estado, eu indicaria marinas. Cada barco cria dois ou três empregos e, além disso, temos uma vocação para a indústria naval.

Os investimentos do Costão no campo de golfe e no pavilhão para o congresso do WTTC estão dando retorno?

Marcondes _ Sem dúvida, o campo de golfe é uma necessidade, não existe um resort de padrão internacional sem um campo de golfe. O Brasil cresceu e vai crescer muito por causa das Olimpíadas de 2016 que, pela primeira vez, terão competições de golfe. Nós estamos formando uma equipe de cinco atletas, duas meninas e três meninos. Uma menina de 13 anos já tem handicap (pontuação) três. Vamos apostar nesses cinco jogadores para ver se eles chegam em condições de representar o Brasil, que terá dois golfista na competição. O pavilhão Tuguá é um equipamento para três mil pessoas sentadas, temos usado para eventos e shows. Já promovemos shows de Lulu Santos, Elba Ramalho, Daniela Mercury e outros. Em março, teremos um evento com 1,8 mil pessoas. O Costão do Santinho tem a maior estrutura para eventos do litoral brasileiro. Em seis anos ganhamos como maior estrutura e fomos eleitos por cinco vezes consecutivas o melhor resort de praia do Brasil pelos leitores da revista Viagem e Turismo, da Editora Abril.

Como estão os negócios da área imobiliária?

Marcondes _ Do Costão das Gaivotas, um dos nossos projetos, com 124 apartamentos, já entregamos cerca de 60% e vendemos 70%. Temos o Costão Golf, com venda de terrenos e construção de casas. São 45 lotes à venda, com seis casas em fase final de conclusão e, ano que vem, pretendemos construir mais seis casas. É um projeto bonito, importante para Florianópolis e dentro da tendência mundial. Estamos em fase final de negociações de um projeto em Canasvieiras que devemos lançar em 2011, com apartamentos e escritórios. Em Biguaçu, há uma área de 600 mil metros quadrados, a melhor da região no eixo da BR-101, da qual temos um terço. Ela poderá sediar um grande projeto residencial vertical para 40 mil pessoas.

Como está o processo da Moeda Verde?

Marcondes _ No Moeda Verde incluíram o Costão das Gaivotas, que é um projeto limpo, nunca teve questão ambiental, e o golfe, que teve a obra embargada durante um ano e meio sem embasamento técnico, causando um prejuízo gigantesco, que estimamos em R$ 20 milhões de reais. O condomínio residencial do Costão Golf já deveria estar todo vendido e tivemos que nos socorrer de banco para cobrir o déficit de caixa. Eu me considero absolutamente injustiçado com essa operação Moeda Verde. Aliás, a promotoria pública federal considerou dessa forma, não apresentou denúncia contra mim. Só que um juiz federal resolveu me incluir, sem eu saber por que e acabei na sela com mais três, que já tinha sido ocupada por Fernandinho Beiramar, com direito a duas horas de sol por dia. Também fui injustamente preso na operação Tríade, em Biguaçu, porque fizemos uma vala a pedido da prefeitura local.

Por que deixou a presidência do Conselho Estadual do Turismo?

Marcondes _ Fui muito honrado com o convite feito pelo governador Luiz Henrique da Silveira e, depois, me frustrei muito porque eu entendia que os recursos do fundo deveriam ser canalizados para um programa estratégico de desenvolvimento e não de forma pontual, cobrindo solicitações. Fui vencido, prevalecendo a posição do secretário de Esporte, Turismo e Lazer, Gilmar Knaesel, que desprestigiou o Conselho. Fiquei muito aborrecido porque decisões do conselho não foram cumpridas pelo secretário. Um exemplo foi estudo de todo o Litoral catarinense, tema levantado no Consult, o conselho superior do governo, pelo conselheiro Jorge Gerdau, que mostrou extrema preocupação com o futuro do nosso Litoral. Em função da sugestão, encaminhei a proposta de um estudo técnico feito por arquitetos e urbanistas para o Litoral, das praias até 50 quilômetros para dentro. Esse foi o ápice da minha frustração.

Em 2008 o senhor teve um problema cardíaco. Como está cuidando da saúde?

Marcondes _ Estou no conselho de administração das empresas. A gestão da área imobiliária está com o meu filho Felipe e a do resort, com a Iolanda, minha mulher. Minha saúde é muito boa, mas o estresse é alto, provavelmente, por causa dessas coisas que falamos, frustrações, injustiças, operação Moeda Verde, operação Tríade. Eu corria todas as manhãs antes do problema cardíaco, agora estou jogando tênis e me preparando para retomar as caminhadas às 6h.

Notas

Três turnos
Apaixonado por natação e por mar, o empresário Marcondes de Mattos conta que projetou o Costão do Santinho Resort durante 10 anos antes de iniciar o projeto, em 1991. Mesmo no conselho das empresas, diz que trabalha três turnos há 52 anos. Durante o dia cuida das empresas e, há noite, lê jornais e livros. A propósito, quando fez 70 anos, lançou o livro que conta sua trajetória como servidor público e empresário.
Lazer
Para reduzir a sazonalidade, o Costão do Santinho conta com pavilhão e campo de golfe. Outro segredo do sucesso do resort é o forte marketing das suas atrações de lazer e eventos.

– O Costão do Santinho tem a maior infraestrutura para eventos do litoral brasileiro. Em seis anos ganhamos como maior estrutura e fomos eleitos por cinco vezes consecutivas o melhor resort de praia do Brasil pelos leitores da revista Viagem e Turismo, da Editora Abril – destaca o empresário.
WTTC
O Costão do Santinho Resort foi o endereço, em maio do ano passado, do congresso anual do Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC). Para receber o evento, investiu R$ 10 milhões em modernização e construção do pavilhão Tuguá. O grupo espera ter o retorno desse investimento a médio prazo porque a ampla divulgação do endereço no evento poderá trazer mais turistas.