Justiça determina que Prefeitura impeça construções na beira da Lagoa

Justiça determina que Prefeitura impeça construções na beira da Lagoa

Justiça Federal determinou que a prefeitura de Florianópolis deve fazer um levantamento de todas as ocupações em área de Marinha na região da Lagoa e impedir construções a menos de 30 metros da faixa de areia (veja a íntegra da decisão da Justiça Federal).

Principal ponto turístico de Florianópolis, a Lagoa da Conceição está no centro de uma discussão ambiental. A Justiça Federal determinou que a prefeitura deverá cumprir a legislação federal que proíbe construções a menos de 30 metros da faixa de areia.

Em sentença publicada na semana passada, o juiz federal Guy Vanderleiy Marcuzzo determinou que o município faça o levantamento de todas as ocupações em área de Marinha no entorno da Lagoa, informando as licenças que foram concedidas e as suas datas. O objetivo é ajuizar futuras ações de demolição para os casos em que ficar caracterizado irregularidade.

O juiz atendeu a pedido do Ministério Público Federal (MPF) em ação civil pública de sete anos atrás.

– Ninguém está pensando em sair demolindo construções antigas feitas com margens na lei da época, mas sim congelar as ocupações em área de preservação permanente – disse a procuradora Analúcia de Andrade Hartmann, que atua na área de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural.

Para ela, se o governo municipal tivesse impedido novas ocupações nos últimos cinco anos, a Lagoa não estaria tão poluída e com o visual comprometido.

Um dos principais líderes comunitários da Lagoa, o vereador Renato Geske sai em defesa das construções consolidadas. Segundo ele, seria um fator complicador mexer no que foi erguido por quem pagou impostos.

O parlamentar concorda com a necessidade de frear novas obras. Ele atribui a ocupação desordenada dos últimos anos ao que chama de falta de fiscalização do poder público.

Halem Guerra Nery, do Instituto Ambiental Ecosul, lembra que há 10 anos houve intensa mobilização em defesa do gerenciamento da Lagoa, mas que o movimento deixou de existir por desinteresse da comunidade.

A exuberância faz da Lagoa um dos pontos mais visitados de Florianópolis. Em volta dela, no Leste da Ilha, estão praias badaladas, como a Mole e a Joaquina, que também atraem turistas. Mas a beleza tem sido ofuscada pela poluição e por ocupações irregulares.

(Por Diogo Vargas, DC, 26/02/2010)

Nota do editor Floripamanha.org: A decisão da Justiça foi em 14/01/2010. Veja a introdução da decisão:

“1. RELATÓRIO.
Trata-se de ação civil pública na qual se pretende franquear o livre acesso às praias da Lagoa da Conceição, situada na Capital do Estado de Santa Catarina, de conformidade com a legislação federal e a estadual. Requer-se, outrossim, a proteção do entorno da Lagoa, procedendo-se ao levantamento de todas as ocupações em faixa de marinha dessa área, com a identificação dos responsáveis e dos alvarás expedidos, para que sejam adotadas medidas a fim de se possibilitar a abertura dos acessos às suas margens. Após defender sua legitimidade ativa para a causa, o Ministério Público Federal afirma que as áreas no entorno da Lagoa são de preservação permanente (Lei 4.771/65), o que não admitiria qualquer ocupação. Alerta, assim, que as áreas ocupadas no entorno da lagoa – por se configurarem preservação permanente e de uso comum do povo – sequer seriam passíveis de regularização por parte da Secretaria do Patrimônio da União. Calcado em legislação municipal e no Código de Águas (Decreto 24.643/64), assevera que deve ser observada a faixa mínima de quinze (15) metros para a passagem e circulação de pedestres, bem como a abertura de acesso às suas margens, distantes não mais do que 125 metros um dos outro. Declara que o Poder Público Municipal vem descumprindo as legislações mencionadas, porque tem expedido alvarás e licenças para construções no entorno da Lagoa, restringindo-se a observar a sua legislação de ordenação do espaço territorial, cujo zoneamento afronta a legislação federal. Requer, assim, em liminar, que seja determinado, imediatamente, o enquadramento de toda a área do entorno da Lagoa da Conceição, no Município de Florianópolis, como área de preservação permanente, nos termos da legislação federal, desconsiderando-se nos pedidos de licenças ou alvarás municipais o zoneamento da área como AVL (área verde de lazer), sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais).” Clique para ler a íntegra da decisão.

Prefeitura diz que vai recorrer

O secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano de Florianópolis, José Carlos Rauen, anunciou ontem que a prefeitura irá recorrer da decisão judicial sobre a Lagoa da Conceição.

Mas o discurso do município parece não estar bem afinado. O superintendente da Fundação Municipal do Meio Ambiente (Floram), Gerson Basso, disse à reportagem que ajudaria a fazer o levantamento das ocupações determinado pela Justiça Federal.

Para o secretário Rauen, esse trabalho representaria altos custos ao município e obrigaria a abertura de licitação. Rauen leva em consideração ainda a grande abrangência da região da Lagoa e a sua população de 15 mil habitantes. Ele entende que a Justiça deveria ter especificado os pontos exatos em que o município deveria agir.

Na Floram, o atual superintendente, que é integrante do Partido Verde, comandou nos últimos meses mais de cem demolições. Alguns dos alvos estavam na Lagoa da Conceição. Basso afirma que está desmistificando a tese de que apenas ocupações ilegais de pobres são derrubadas pela fundação. Cita recentes ações em Jurerê Internacional e Praia Brava.

A Floram conta com 43 fiscais. Um telefone para denúncias (161) tem ajudado a equipe nas atuações. O superintendente espera melhorar a estrutura da equipe depois que a Floram for autorizada por lei municipal a emitir o licenciamento ambiental pleno de obras, o que hoje é feito pela Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fatma) e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama).

Em setembro de 2009, ao assinar o plano de gerenciamento costeiro da Capital, o prefeito Dário Berger disse que investimentos ligados ao meio ambiente poderiam representar a transformação econômica de Florianópolis. Dário defende a vinda de estaleiros, hotéis, marinas e resorts em áreas como a Lagoa.

(DC, 26/02/2010)

Líder avalia que decisão chega tarde

Para o presidente da Associação dos Moradores da Lagoa da Conceição (Amola), José da Costa, a determinação da Justiça Federal já deveria ter sido tomada antes.

Das cerca de 10 mil casas registradas pela entidade, ele estima que pelo menos 2 mil estão a menos de 15 metros da água. A lei federal determina que as construções estejam a uma distância de 30 metros da Lagoa.

– Não acredito em consequências imediatas. Será difícil derrubarem o que está construído. As pessoas pagam impostos para estarem ali. Acho que o melhor é cobrar a falta de fiscalização e impedir construções futuras. Aliás, nem há mais lugar para construir – diz.

Em locais como o Canto da Lagoa é possível ver que casas estão quase dentro da água. A partir da década de 1980, começou o boom imobiliário do local, que inicialmente era reduto de pescadores e não de badalação.

O problema, avalia José da Costa, é que, de um lado, estão os que construíram ignorando normas. De outro, o poder público municipal, que “não fiscalizou como deveria”.

Na opinião dele, deveria haver multa para cada caso em que a prefeitura deu ordem para construções irregulares – quando a documentação do proprietário da residência ou do comércio não estiver completa, a multa teria que ser para o dono do ponto e para o poder público.

O presidente da Amola diz que a questão do esgoto também tinha que preocupar mais as autoridades.

– Acho que a Justiça precisaria ficar atenta também à falta de saneamento básico no nosso bairro. Há mansões que não têm rede de tratamento de esgoto – critica.

Sidnei Olímpio da Silveira, presidente da Associação dos Moradores do Canto da Lagoa, diz que até os pescadores sofrem com a ocupação irregular na região:

– Tem áreas da lagoa com muros que impedem o acesso ao mar. Há dono­s de casas que soltam cachorros contra eles. Deveria haver tratamento igual a todos.

(Por Mariana Ortiga, DC, 26/02/2010)