09 set A corrupção endêmica e as novas gerações
Artigo escrito por Laudelino José Sardá – graduado em Letras e Literatura (UFSC), especialista em Jornalismo Científico e doutor em Engenharia da Produção (UFSC) (Acontecendo Aqui, 08/09/2009)
O brasileiro habituou-se, em sua grande maioria, a ver a corrupção apenas como uma tirania de políticos. E a imprensa só aborda essa praga quando ela ocorre dentro do Congresso ou em órgãos públicos executivos. Sim, há políticos que roubam muito e ficam impunes, mas a corrupção é endêmica e histórica no Brasil e contamina todos os níveis hierárquicos das organizações públicas, estatais e privadas. Se fossem somados todos os recursos desviados nos últimos 50 anos, seria possível construir mais de 10 cidades como Brasília, adotar o país de uma invejável malha ferroviária e triplicar as pistas de todas as rodovias. Além disso, a nossa nação não estaria ainda exibindo cerca de 30 milhões de brasileiros que se alimentam três vezes por semana.
Você, leitor, tem idéia de como se pratica a corrupção?
Seguem alguns exemplos. Com a concentração de receitas em Brasília, governos estaduais, prefeituras e empresas privadas ficam à espera da liberação de verbas. Entra aí a figura do lobista, que em conluio com funcionários de segundo e até quinto escalões de ministérios, ficam de olho nos processos administrativos. Quando um processo está a caminho da mesa do ministro, o funcionário segura-o até o lobista negociar uma gorda recompensa com a prefeitura, governo ou empresas. Jogue agora este exemplo para os estados e municípios. É tudo igual. Parece até existir um manual de corrupção.
Quando não há lobista, funcionários de ministérios agem por conta própria, engordando as redes da libertinagem. Há outras fórmulas, como a simulação de concorrências públicas para favorecer empresas em troca de polpudas comissões pagas em dinheiro vivo, para não deixar rastro, e casos típicos como o de um serviço custar R$ 80 mil e a empresa de serviço emitir uma nota de R$ 140 mil para garantir uma gorjeta a funcionários do órgão público. Em empresa privada, os golpes são ainda mais sofisticados, com simulações contábeis. E agora com a internet, o Brasil tornou-se ainda mais vulnerável.
Um estudo realizado por um grupo de docentes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul concluiu que cerca de R$ 200 bilhões são roubados por ano dos cofres públicos – federais, estaduais e municipais -. Esses recursos seriam suficientes para zerar a pobreza, a violência e a desordem urbana das cidades. Mas, infelizmente, os órgãos que poderiam ajudar a combater a corrupção, como os Tribunais de Conta, são ainda integrados por pessoas nomeadas pelos próprios governos, ou seja, ganham uma aposentadoria invejável para não criar problemas para as contas do governo.
O assunto Tribunal de Contas deve merecer um artigo especial. Claro que há conselheiros dignos de respeito. Mas não custa nada perguntar abertamente: uma pessoa nomeada pelo governo para uma vaga, aliás, disputadíssima, de conselheiro do Tribunal de Contas, terá coragem de reprovar a prestação de conta do seu padrinho? Pode até ter, mas é muitíssimo difícil!
Por essa e outras razões, defendo que o Tribunal de Contas, ao invés de órgão de assessoria do Legislativo, fosse independente e seus membros, com mandato de dois anos, eleitos por órgãos altamente representativos, como o Conselho de Contabilistas, a OAB, Conselho de Administradores, enfim, tantos outros.
A impunidade é a grande causa dos males sociais, econômicos e políticos brasileiros. Mas há outras causas da corrupção, como a tolerância, a conivência e a omissão.
Um dos graves problemas é a ausência de fiscalização. Em países como a Nova Zelândia, Austrália, Irlanda, há uma média de 550 auditores para cada grupo de 100 mil habitantes e, por isso, são nações que praticamente não sabem o que é corrupção. No Brasil, a proporção é de apenas dois auditores para 500 mil habitantes.
Tecnologia existe para se combater a corrupção, mas é insignificante diante da lei de Gerson, aquela das vantagens pessoais. No país da impunidade, tudo fica mais fácil e estimulante. Uma pesquisa bem apurada poderia mostrar que a corrupção no Brasil envolve direta e indiretamente mais de 20% da população, ou seja, cerca de 30 milhões de pessoas. Como acabar com essa praga? Sinceramente, é difícil!, embora nada seja impossível. É preciso querer, mas, pelo jeito, estamos muito longe da vontade política de transformar o Brasil em uma nação governada por pessoas sérias.
E o pior: não estamos preparando as novas gerações para mudar o Brasil. As escolas, em sua grande maioria, são omissas na formação de cidadãos e a degeneração da classe política desestimula a juventude ao exercício de mandatos públicos. Infelizmente e danoso para a democracia, político hoje no Brasil é sinônimo de corrupto. E eles, os políticos, não estão preocupados em apagar essa marca que atrofia a nossa democracia.