A Tecnologia, o Consumismo e seus Impactos Sócio-ambientais

A Tecnologia, o Consumismo e seus Impactos Sócio-ambientais

A humanidade herdou um acúmulo de 3,8 bilhões de anos de capital natural: mantendo-se os padrões atuais de uso e degradação, muito pouco há de restar até o fim do século XXI. Considerando a recente crise econômica, que tanto tem preocupado a população e os governos mundiais, ninguém percebe que se está perdendo mais dinheiro com o desaparecimento das florestas do que com a atual crise financeira global, segundo conclusões de um estudo encomendado pela União Européia. A pesquisa foi realizada por um economista do Deutsche Bank, que calculou que os desperdícios anuais com o desmatamento variam em uma faixa de US$ 2 trilhões a US$ 5 trilhões.

Para se chegar a esses números, é necessário saber que os serviços de armazenamento de água e da regulação do ciclo de carbono, entre outros, realizados gratuitamente pela natureza, criam condição para um meio ambiente saudável, oferecendo não só água e ar limpos, chuvas, produtividade oceânica, solo fértil e elasticidade das bacias fluviais, como também certas funções menos valorizadas, mas imprescindíveis para a manutenção da sustentabilidade, tais como: a) o processamento de resíduos (naturais e industriais); b) a proteção contra os extremos do clima; e c) a regeneração atmosférica.

Contudo, nas últimas três décadas se consumiu um terço dos recursos da Terra, ou seja, de sua riqueza natural. É sabido que ecossistema é um sistema aberto integrado por todos os organismos vivos, inclusive o homem, e os elementos não viventes de um setor ambiental definido no tempo e no espaço. Suas propriedades globais de funcionamento (fluxo de energia e ciclagem da matéria) e auto-regulação (controle) derivam das relações entre todos os seus componentes, tanto pertencentes aos sistemas naturais, quanto aos criados ou modificados pelo Homem.

Com o aumento populacional que se deu no último século e com o surgimento de novas tecnologias, aceleraram-se as atividades econômicas de acordo com suas supérfluas e ilimitadas necessidades, em uma velocidade jamais vista. Tudo isso acontece a partir de uma visão antropocêntrica clássica – o homem e suas interações com o ambiente à sua volta devem se fazer de forma prioritária, e descompromissada, modificando e transformando os ambientes naturais para que sejam satisfeitas as suas vontades.

Os resultados dessas ações são facilmente perceptíveis ao longo de toda a biosfera. Esta interferência ocorre em diversos níveis, agindo diferentemente sobre os componentes ambientais: ar, solo, água e seres vivos. Os reflexos, geralmente desastrosos, podem ser observados, por exemplo, nas atividades agropecuárias e florestais, particularmente quando praticadas de forma extensiva, causando profundas alterações na paisagem, em nível mundial. Nos sistemas urbanos, também, são encontradas marcas profundas da intervenção humana.

Essa situação se agravou a partir da Revolução Industrial, que criou o modelo de capitalismo atual, cujos processos de produção consideravam como pólos excludentes o homem e a natureza, com a concepção desta como fonte ilimitada de recursos à sua disposição. A partir dessa época, a capacidade produtiva humana começou a crescer exponencialmente e a força de trabalho se tornou capaz de fabricar um volume muito maior de produtos básicos, a custos reduzidos. Esse fato elevou rapidamente o padrão de vida e os salários reais, fazendo crescer a demanda dos diversos produtos das indústrias, lançando os fundamentos do comércio moderno.

No entanto, o que se percebe, é que as sucessivas agressões que o meio ambiente vem sofrendo em decorrência das atividades humanas, vêm causando impactos negativos e causando uma série de prejuízos sócio-econômicos e ambientais. Ao meio da crise econômica e ambiental atuais, e de tamanha confusão, as pessoas, desinformadas, perguntam-se: “o que fazer?”; “como fazer?”; “a quem recorrer”; ou “em quem acreditar?” As alternativas são várias para solucionar tais problemas; mas o que tem gerado bastante discussão é se as medidas tomadas só defendem os interesses de cada país ou interesses pessoais… ou se realmente pensam na coletividade… Será que realmente existe a intenção de solução definitiva para as questões sociais e ambientais?

Para exemplificar, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, depois de fazer diversas reuniões com parlamentares da bancada ruralista, entregou nessa semana à Casa Civil uma proposta que reduz as punições contra desmatadores. Pressionado, ele aceitou alterar ou revogar artigos do decreto que assinou no fim de julho, com o presidente Lula, para endurecer a Lei de Crimes Ambientais. O anúncio foi feito na Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado. Na mesma reunião, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, fez duras críticas à legislação ambiental do país, dizendo: “se todas as regras atuais forem respeitadas, é melhor fechar o Brasil”.

Ou seja, o nosso grande problema é que vivemos em um mundo capitalista, onde negócios e lucros são as únicas referências, de fato, consideradas importantes. Para se atingir esse objetivo, incrementa-se o consumo, estimulado por campanhas maciças na mídia. O modismo é outro aspecto que acaba nos influenciando: se um modelo de computador está “na moda”, o que compramos há pouco tempo já parece estar ultrapassado e isso faz com que acabemos comprando um novo modelo. O mesmo acontece com o telefone celular e outros bens de consumo.

Na verdade, esse comportamento é resultado de uma estratégia usada pelo modelo capitalista que criou o consumismo obsoletista, onde um produto já é lançado tendo o seu sucessor mais moderno na prateleira para ser apresentado em pouco mais de seis meses ou um ano. Uma verdade, que poucos se dão conta, é que nos dias atuais, de toda a produção mundial, apenas 1% tem vida útil superior a seis meses e, em nossa euforia de consumo, devido ao desconhecimento do ciclo de vida dos produtos, não damos conta que é o meio ambiente que estará sendo afetado. Não podemos esquecer que a primeira etapa da fabricação de um produto se dá com a extração de recursos naturais, cuja exploração está se dando de forma exagerada e desordenada, e o seu destino final também será em um determinado local do ambiente.

Outra dimensão da insustentabilidade do consumo atual das economias humanas passa pela forma socialmente desigual da distribuição das riquezas e da renda. Ou seja, há uma pressão diferenciada exercida pelos consumidores sobre os ecossistemas. Ao contrário, as populações dos países ricos são responsáveis pela apropriação de 80% dos recursos naturais e de energia, sendo que representam menos de 20% da população global. Qual a conseqüência desse modelo? A atual crise global da economia… e que afetará, indiscriminadamente, todos os países do Planeta.

Na verdade, quando analisamos o comportamento da humanidade ao longo de sua história, observamos um enorme fascínio pelo uso de novas tecnologias, associadas ao desenvolvimento de novos produtos e, ou, processos de produção. Porém, apesar de significativas vantagens proporcionadas com essas inovações, servindo de auxílio para a solução de grandes problemas, questiona-se a sua efetividade, inclusive com inúmeras dúvidas sobre os efeitos à saúde, por exemplo, quanto ao uso desse novo “brinquedo”, o telefone celular.

Nessa semana, especialistas de todo o mundo se reúnem no Rio de Janeiro para discutir dados científicos relacionados aos efeitos biológicos de radiações ionizantes, notadamente aquelas emitidas por antenas e equipamentos de telefonia celular, estações transmissoras de rádio e TV, linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica, além de discutir aspectos de proteção e limites de exposição. A Comissão Internacional de Proteção contra as Radiações Não-Ionizantes promove o encontro internacional com o objetivo de apresentar os seus avanços científicos. As discussões subsidiam novas recomendações para limites de exposição, conforme recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS).

No futuro, há de se perceber, que os avanços científicos e tecnológicos voltados para o setor produtivo, deverão permitir a implantação de indústrias limpas, que estão na base de um crescimento econômico mais equilibrado e integrado como o meio ambiente. O primeiro passo para uma grande mudança é consumir menos e poder utilizar os recursos naturais de maneira sustentável. Contudo, a Educação Ambiental, que é o caminho mais curto para se atingir esse objetivo, a sua efetiva inclusão no currículo, de forma incompreensível, vem sendo protelada pelo Ministério da Educação.

De fato, carecem de uma visão equilibrada e integrada do meio ambiente, holística e sistêmica, que favoreçam a própria gestão da tecnologia. Os modos de produção necessitam de um novo modelo. No meio urbano, a implantação de sistemas de gestão ambiental que estimulem a produção mais limpa seria uma alternativa; na área rural, os modelos de produção agroecológicos podem ser considerados fortemente inseridos nessas propostas.

(Maurício Novaes Souza (*) e Maria Angélica Alves da Silva (**), Ambiente Brasil, 14/10/2008)

* Engenheiro Agrônomo, Mestre em Ciências Florestais/Recuperação de Áreas Degradadas e doutorando em Engenharia de Água e Solo pela UFV. É professor do CEFET – Rio Pomba, coordenador dos cursos Técnico em Meio Ambiente, EAD em Gestão Ambiental e Pós-graduação em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável; consultor do IBAMA e conselheiro do COPAM da Zona da Mata, MG.
mauriciosnovaes@yahoo.com.br.

** Pedagoga e especialista em Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável. É professora das disciplinas Sociologia, Filosofia, História e Políticas Educacionais do CEFET – Rio Pomba.
gecamau@yahoo.com.br.