Energia solar no Brasil

Energia solar no Brasil

Artigo de Alessandra Mathyas — jornalista (Carbono Brasil, 09/05/08)
Desde a década de 1970, quando pensou e iniciou o Próálcool, o físico José Bautista Vidal já afirmava: “o Brasil é o grande continente tropical do planeta, foi premiado com um reator de fusão nuclear particular: o sol”. No entanto, passados 40 anos, a energia solar pouco avançou no país. E não pela ausência de estudos e de empresas interessadas no setor, mas pela falta de estímulo público em adotar esta que é considerada a mais sublime das energias limpas.
Conforme o Atlas Brasileiro de Energia Solar, publicado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) em 2006, o país recebe mais de 2.200 horas de insolação por ano, um potencial equivalente a 15 trilhões de MWh. Isso corresponde a 50 mil vezes o consumo nacional de eletricidade.
Apesar do imenso potencial do Brasil e América Latina para a energia solar, seus defensores não pretendem mudar completamente a matriz energética atual, no caso do Brasil, a das grandes hidrelétricas. Entendem, no entanto, que a energia do sol poderá ter uma grande contribuição como coadjuvante, suprindo a carência em períodos de seca – quando os reservatórios das usinas chegam a níveis preocupantes – e levando energia às comunidades isoladas, onde nem mesmo o Estado consegue chegar com linhas de transmissão e distribuição.
Para Fábio Rosa, diretor do IDEAAS – Instituto para o Desenvolvimento de Energia Alternativa e da Auto Sustentabilidade, com sede em Porto Alegre, a energia solar tem um importante papel social a cumprir. Como exemplo, ele destaca o Projeto LUZ AGORA, que entrega energia elétrica no meio rural sem conexão com redes de distribuidores tradicionais de energia. “Trabalhando em diversas comunidades no Rio Grande do Sul, o projeto tem um teste de mercado concluído e em pleno funcionamento, com 40 sistemas solares fotovoltaicos instalados e em funcionamento no município de Encruzilhada do Sul, 20 sistemas em São José do Norte e um modelo experimental em Osório”, explica Fábio Rosa.
Além da instalação, a entidade faz um acompanhamento permanente das famílias, que pagam pelo serviço. “Fazemos um cálculo médio de quanto a família gastava com querosene, diesel e outros combustíveis para geração de energia. Ao adquirir os painéis fotovoltaicos, dividimos seu custo em parcelas que ficam até menores que o gasto médio das famílias com energia suja”, explica Rosa.
Um exemplo é a família da senhora Celanira Paulo Gomes, da cidade de Encruzilhada do Sul. Na época da instalação dos painéis fotovoltaicos, a família tinha um gasto médio mensal de R$ 78,00 com o lampião a gás. Agora, paga R$ 32,00 para ter energia solar. Em casas como a da senhora Celanira, a geração de energia é suficiente para quatro lâmpadas, chuveiro, eletrodomésticos, como geladeira, televisão, rádio, carregador de celular, bomba d’água e demais utensílios domésticos eletrônicos. Ao lembrar desta família especialmente, Fábio Rosa emociona-se ao lembrar da matriarca, senhora Filomena, já falecida.
Quando da instalação elétrica, ela pediu que colocasse uma lâmpada do lado de fora, em cima da porta da sua casa. E a explicação dá uma idéia do que significa para milhares de famílias terem energia em casa. Disse a senhora Filomena ao coordenador do IDEAAS: “Se tiver uma lâmpada do lado de fora, de noite as pessoas vão ver minha casa e eu vou receber visitas porque eu tenho luz, e a vida será mais alegre”.
Essa alegria e economia a entidade gaúcha quer levar agora aos pescadores da Lagoa dos Patos, no Rio Grande do Sul e na Lagoa de Imarui, em Santa Catarina. O IDEAAS fez um levantamento que só na Lagoa dos Patos existem 30 mil lampiões em embarcações para a pesca de camarão, atividade econômica principal de 15 mil famílias que hoje, gastam cada uma, uma média de R$ 4 mil por ano com o combustível do lampião.
Através de um convênio com a Universidade de Michigan, dos Estados Unidos, o IDEAAS está desenvolvendo o projeto Farol do Sol, um protótipo de luminária para a pesca de camarão com painéis fotovoltaicos. Segundo Rosa, que é engenheiro agrônomo, com a mudança do lampião para a luminária solar, em cada temporada de pesca, que vai de fevereiro a maio, deixarão de ser emitidas 12,5 toneladas de gás carbono.
O Laboratório Solar, da Universidade Federal de Santa Catarina, estuda para este projeto uma lâmpada que garanta a mesma luminosidade do lampião. Isso sem falar no ganho de tempo, pois não será mais necessário o abastecimento do lampião em terra nem haverá riscos à saúde, como as freqüentes queimaduras.
O projeto tem um custo de R$ 210 mil, sendo que R$ 50 mil já foram liberados através de um convênio do IDEAAS com o Instituto HSBC de Solidariedade. Além da iluminação para os pescadores de camarão, o IDEAAS através do Projeto Luz Agora na Amazônia, com recursos da fundação Lemelson dos Estados Unidos, já dispõe de 220 mil dólares para a instalação elétrica solar em 133 casas na Reserva Extrativista de Tapajós.
Tais iniciativas mostram que a energia solar é viável e tem um grande alcance social. O próprio Programa Luz para Todos, do Ministério de Minas e Energia, financia os projetos solares fotovoltaicos que tiverem viabilidade econômica. Neste caso, a responsabilidade pela instalação e gestão é das companhias energéticas estaduais. Entre as que já realizaram projetos de energia solar em comunidades isoladas estão a Coelba da Bahia, a Ampla S.A (antiga CERJ), no Rio de Janeiro, a CEAL de Alagoas e a Cemig de Minas Gerais.
Esta, com o Programa Luz Solar, já levou energia a cerca de 500 residências, 150 escolas e 50 centros comunitários de áreas rurais do estado mineiro. Para viabilizar economicamente este programa, a Cemig configurou sistemas com potências diferentes considerando as necessidades básicas de cada um desses setores. Assim, à época do início do projeto, início do ano 2000, as instalações nas escolas e centros comunitários foram patrocinadas pelo Programa de Desenvolvimento Energético de Estados e Municípios – PRODEEM.
Instituído com o propósito de levar eletricidade às áreas rurais e em comunidades isoladas, este programa realizou projetos de energia solar em instalações de caráter comunitário em 117 comunidades de 18 estados, com investimento de R$ 1,5 milhão, conforme relatório do . Na época, segundo o relatório do MME, os principais benefícios sociais desta iniciativa foram o aumento do número de alunos em escolas noturnas, incremento da produção de alimentos com a irrigação comunitária e geração de emprego e renda e maior acesso à informação e conscientização com a TV-comunitária e a TV-escola.
No entanto, uma auditoria do Tribunal de Contas da União no segundo semestre de 2002 constatou alguns problemas no programa, como o baixo envolvimento das comunidades beneficiárias, a indefinição quanto às responsabilidades dos agentes envolvidos, ausência de capacitação para operação, manutenção, assistência técnica e sustentabilidade dos sistemas e inexistência de tombamento e controle patrimonial dos ativos do PRODEEM. Havia muitas queixas que depois do equipamento instalado, as comunidades ficavam abandonadas, sem saber o que fazer em caso de falha técnica.
Assim, o TCU recomendou no Acórdão 598/2003 a revisão do modelo até então vigente com o aumento da participação das comunidades, a promoção descentralizada na execução dos programas com parcerias junto a instituições de reconhecimento técnico, treinamento e capacitação para operação em sistemas fotovoltaicos e a instituição de indicadores de desempenho. Ao todo foram 14 recomendações e oito determinações, que motivaram debates, liderados principalmente pelo CEPEL – Centro de Pesquisas de Energia Elétrica, do Rio de Janeiro.
No Plano de Revitalização e Capacitação do PRODEEM ficou estabelecido que, além do treinamento e da revitalização dos sistemas já instalados, era preciso efetuar a regularização patrimonial correspondente, em 2003, a nove mil sistemas adquiridos correspondentes a um valor aproximado de 37 milhões de dólares. Reestruturado, o PRODEEM passou a integrar o Luz para Todos. Após esta estruturação, outra concessionária estadual, a Eletroacre, instalou 20 mil sistemas fotovoltaicos através do Projeto Luz para Todos.
Saindo do meio rural e da pesca, indo para os grandes centros urbanos, aos poucos se percebe uma importante mudança a favor da energia solar. É cada vez maior o número de casas de classe média e alta que usam aquecedores solares já no projeto das edificações. Nas últimas décadas esta tecnologia tem se multiplicado e o preço ficou mais acessível, sendo inúmeras as empresas que oferecem no Brasil serviços de planejamento, engenharia e instalação destes equipamentos.
No entanto, faltava ainda a iniciativa do poder público, o que, sobretudo em 2007, teve um grande salto com a Lei 14.459/07, na cidade de São Paulo, instituindo que as novas construções sejam planejadas de forma eficiente, prevendo maior aproveitamento da luz e aquecimento solar. Segundo os defensores da iniciativa, como as entidades que compõem a RENOVE – Rede Nacional de ONGs de Energias Renováveis (sediada em Brasília), a economia estimada de energia em sistemas bem dimensionados pode chegar a 70%. Isso é bastante significativo quando se avalia a pesquisa da Eletrobrás divulgada em 2007, que aponta o pico no consumo de energia do país entre 18 e 21 horas, motivado pelo uso dos chuveiros: 60% de toda a eletricidade do país.
Há nesse meio muitas dúvidas, como um eventual desperdício da água aquecida ou a necessidade de aquecedores elétricos para uso em dias nublados. Mas na balança, os benefícios sociais, ambientais e econômicos acabam pesando mais. Há uma considerável redução na conta de energia elétrica, são gerados novos e qualificados empregos – hoje se estima mais de 30 mil trabalhadores neste setor, em todos os estados, não há a emissão de gases do efeito estufa como nas energias convencionais e a adoção destas medidas está em sintonia com os discursos mundiais para conter o aquecimento global.
Quanto à geração de energia fotovoltaica não existem estudos que quantifiquem o potencial brasileiro em GW, mas há como fazer comparações com outras fontes localizadas, como a Usina de Itaipu, por exemplo. Esta, que por décadas foi a maior usina hidrelétrica do mundo, contribui com cerca de 25% da energia consumida no Brasil, tendo uma potência instalada de 12,6 GW, conforme o Balanço Energético 2002 disponibilizado pela Eletrobrás.
Segundo o professor da Universidade Federal de Santa Catarina, Ricardo Rüther, PHD em energia solar, se uma área equivalente em tamanho ao lago de Itaipu (1350 km2) fosse coberta com sistema solar fotovoltaico, a potência instalada seria de 94,5 GW. O entrave ainda são os custos. Enquanto os últimos leilões de energia nova têm registrado um valor médio de R$ 130 MW/h nas chamadas fontes convencionais – hidro e térmicas – para as energias renováveis esse valor é bem mais alto.
“Os leilões de energia, como agora nas usinas do Rio Madeira, têm o preço inicial da obra de geração, sem contar os custos e a perda de energia na transmissão e na distribuição até chegar na tomada do consumidor. A energia solar é a tomada, sem custos extras e sem perdas”, afirma. O especialista argumenta ainda que, enquanto no Brasil a energia elétrica de fontes convencionais tem tido um reajuste médio ao ano de 14%, a indústria da energia solar vem registrando uma queda nos valores da produção em 5% ao ano. “Nossa estimativa é que em 2017 esses valores estejam equiparados”, afirma.
Ausência de legislação
Onde há o apoio do poder público a sociedade responde ao apelo ecológico e investe em energia solar, ao menos a mais barata, para aquecimento. Apesar de simples, no entanto, são poucas as leis municipais ou estaduais que definem regras e benefícios a quem usa coletores solares. Para citar alguns municípios, além da capital paulista, Birigui/SP, Varginha/MG e Porto Alegre/RS. Nesta, a prefeitura concede incentivos fiscais para residências e empresas que promovam medidas necessárias ao fomento do uso e ao desenvolvimento tecnológico de sistemas de aproveitamento de energia solar.
Há ainda inúmeros projetos em tramitação, mas sem previsão de tornarem-se leis, como em Americanas, Peruíbe, Piracicaba, São José dos Campos e Campinas em São Paulo, Curitiba, no Paraná, Juiz de Fora, em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Na Câmara dos Deputados também há projetos para regulamentar não só a energia para aquecimento, como a fotovoltaica. Entre eles, o que mais vem motivando o debate junto aos cientistas, empresários e representantes de governo é o PL 1563/2007, do deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) que, além da geração distribuída e racionalização energética, quer modificar o PROINFA e aumentar a participação de fontes alternativas na matriz energética nacional.
Este e todos os demais anteriores e posteriores foram apensados para discussão única numa comissão especial formada ainda em agosto do ano passado, mas que até agora não avançou. Decisões tomadas por comissões como esta não precisam passar pela votação em plenário, sendo encaminhadas diretamente para o Senado Federal e depois ao Presidente da República. No Congresso Nacional há ainda a Frente Parlamentar em Defesa da Energia de Fontes Renováveis e a Subcomissão de Fontes Renováveis e Uso Múltiplo da Água. Já na estrutura de Governo também há espaço para as energias renováveis, como a Coordenadoria Geral de Energias Renováveis do Ministério de Minas e Energia, responsável pelo PROINFA.
No entanto, apesar de discutir-se a importância da energia solar nas três esferas de governo – federal, estadual e municipal, falta muito para o Brasil avançar. E o grande entrave é a legislação. Hoje, quem produz energia fotovoltaica não tem a possibilidade de ofertar o excedente de sua geração própria nas redes de distribuição, o que não atrai o investimento por empresas ou mesmo em residências. Ainda assim, quando o gestor público acredita na tecnologia, busca caminhos para o avanço. Foi o que fez a Eletrosul Centrais Elétricas S. A .
Através de um convênio com o KFW – banco de fomento alemão, a empresa solicitou um estudo de viabilidade técnica para geração de energia solar no seu prédio sede, em Florianópolis. O estudo, feito pelo Laboratório Solar da Universidade Federal de Santa Catarina e o IDEAL – Instituto para o Desenvolvimento de Energias Alternativas na América Latina prevê placas fotovoltaicas em estacionamentos cobertos– o que dará visibilidade externa ao projeto – e na cobertura do prédio. Com as obras concluídas o prédio praticamente irá produzir a energia elétrica que consome e a Eletrosul será a primeira empresa pública do país autosustentável em energia solar.
O projeto, no entanto, terá que ser aprovado pelo Senado Federal, mas a matéria já está na pauta para o mês de março. Muito antes, no entanto, a empresa já mostrava publicamente seu interesse pela energia limpa. No mesmo terreno da sede está um protótipo que é exemplo nacional em eficiência energética, uso de energia solar e aproveitamento de água: a Casa Eficiente.

Bom negócio
Cientes do potencial brasileiro, sobretudo na geração de energia fotovoltaica, grandes empresas internacionais com tecnologia de ponta estão de olho no mercado brasileiro. Um exemplo é a empresa Kyocera Solar, líder na fabricação mundial de painéis fotovoltaicos. Segundo Antônio Granadeiro, presidente da empresa no Brasil, hoje o faturamento da indústria solar no mundo está em torno de três bilhões de dólares. Destes, o Brasil responde por modestos 20 milhões, sendo que a maior parte foi implantada através do Programa Luz para Todos. Mas segundo Granadeiro, o seu custo aqui ainda é muito alto, acima de R$ 14 mil por instalação.
Apesar da pouca procura nacional, a empresa aposta no mercado brasileiro, a exemplo do que vem acontecendo em outros países, onde tem se destacado, sobretudo, na venda de módulos solares para sistemas conectados à rede elétrica. “Nossos principais clientes são particulares, pessoas que compram sistemas para gerar energia em suas residências e ligar à rede”, afirma Granadeiro.
Isso acontece em outros países, especialmente na Alemanha, Japão e Estados Unidos, e mais recentemente Espanha e Portugal, onde há forte estímulo através de legislação com subsídios favoráveis. “Somente no ano passado foram instalados no mundo 2,5 GW”, comenta o empresário. As mais novas fábricas da Kyocera Solar estão no México, China e República Tcheca e a produção é praticamente toda exportada para os países onde há estímulo para a energia solar.
“O Brasil deveria adotar uma política de incentivos de pelo menos uns dez anos para viabilizar uma produção nacional. Um programa de conexão à rede como existe na Alemanha, ajudaria a indústria a se estabelecer aqui e reduzir os custos”, opina Granadeiro.
Ao que parece, a redução dos custos da indústria da energia solar é uma tendência mundial.
Conforme cálculos da ISES (Internacional Solar Energy Society), o custo está diminuindo gradativamente. “Nossa expectativa é que em 2017 o preço da energia solar seja equivalente à energia de fontes convencionais, já que esta tem tido um reajuste médio de 14% ao ano enquanto a solar tem registrado uma queda nos valores da produção em 5% ao ano”, comenta o professor Ricardo Rüther, da UFSC, membro da ISES do Brasil.

Na Europa, a tecnologia é antiga

No Hemisfério Norte, desde a década de 1970 a energia solar está na pauta permanente dos governos. Em 1980 Israel foi o primeiro país estabelecer uma política pública de energia solar. Mas atualmente o país que mais se destaca é a Alemanha. Ao estabelecer uma legislação que fixa o valor para cada kWh para cobrir os custos totais dos investimentos em placas fotovoltaicas, incluindo o financiamento, o país vem registrando um aumento significativo na produção de energia fotovoltaica.
Com esta política de investimentos e incentivos a indústria de equipamentos para energias renováveis tem tido um crescimento de 10% ao ano, com ênfase nos painéis fotovoltaicos e térmicos. Segundo Johannes Kissel, assessor do Conselho Mundial de Energia Renovável – WCRE, o KFW, banco de fomento alemão, disponibiliza créditos com juros baixos, acessíveis à população em geral.
Estas definições, somadas à determinação da Comunidade Européia em reduzir as emissões de gás carbônico e ampliar o uso de fontes renováveis de energia, fizeram com que, até 2007 fossem instalados na Alemanha 1,4 MW de energia solar fotovoltaica. De acordo com o relatório do Governo Alemão, em 2006 o país exportou seis bilhões de euros em equipamentos neste setor enquanto no ano 2000 a cifra não passou dos 500 milhões de euros. Do total de painéis já instalados na Alemanha, um a cada três é produzido no próprio país, o que tem permitido seu barateamento.
O exemplo da Alemanha mostra também que a indústria da energia solar não tem se mostrado apenas ecologicamente viável, mas criou uma necessidade de profissionais qualificados que interferiu inclusive nos cursos tecnológicos. Até o momento este setor já conta com cerca de 170 mil pessoas trabalhando, mas com o crescimento previsto, estima-se a necessidade de 510 mil pessoas em poucos anos. Caminhos semelhantes trilham 18 dos 27 estados da União Européia que já estabeleceram leis para fomentar as energias renováveis.
Com isso, além da Alemanha, na Espanha foram instalados 300 MW de energia solar até 2007. Conforme dados disponibilizados pela EPIA, Associação Internacional de Energia Fotovoltaica, até o momento estão instalados em todo o mundo 2,7 GW desta energia limpa. Ainda na Europa, a Hungria destaca-se na fabricação de painéis. Os Estados Unidos também avançaram nos parques solares, dispondo até o ano passado de 260 MW instalados. Neste país, o maior parque solar está no estado da Califórnia. Do outro lado do globo o destaque é para a Índia, que criou uma empresa púbica de fabricação de painéis fotovoltaicos. Sua produção, assegura, tem a mesma qualidade de geração de energia a um custo bem menor que os vendidos na Europa e nos Estados Unidos.
Neste contexto mundial é que se verifica as promissoras possibilidades de negócio que a energia limpa solar poderá trazer ao Brasil e à América Latina. Depois do PRODEEM, o grande programa do Governo Federal para fomentar as energias alternativas é o PROINFA, que ampliou consideravelmente as energias eólica e de biomassa no país. No entanto, para a energia solar as iniciativas são modestas. E ainda que se discuta o assunto, dificilmente a energia solar entrará definitivamente na pauta dos governos latino-americanos enquanto não houver legislações que regulem o mercado, como acontece hoje na Europa. A opinião é do presidente do Instituto IDEAL, Mauro Passos, ao se referir, por exemplo, ao estudo de planejamento integrado dos recursos energéticos realizado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE, do Ministério de Minas e Energia) intitulado Plano Nacional de Energia – 2030 , apresentado no primeiro semestre de 2007.
Em nenhum momento este estudo cita a necessidade ou a intenção do governo investir em energia solar pelas próximas duas décadas. “Enquanto o país não estabelecer condições estáveis que atrairão investidores para a fabricação deste tipo de equipamento e geração de trabalho, com vigência de pelos menos dez anos, a energia solar não irá além das boas, mas poucas ainda, iniciativas de empreendedores sociais, ONGs e pesquisas científicas”, comenta Passos.
Para ele é preciso regulamentar o PROINFA II, incluindo nele a energia solar, já que o PROINFA, mesmo contratando apenas 3.300 MW de energia de fontes renováveis que está sendo incluída no sistema interligado, garantiu financiamento do BNDES de até 80% dos empreendimentos em contratos com concessão de 20 anos. Segundo Johannes Kissel, do WCRE, especialista em legislação de energias renováveis na Europa, o PROINFA II com energia solar irá alavancar este mercado no Brasil.
NÃO FALTA PESQUISA…
São muitos os centros de pesquisa e ensino que disseminam as técnicas e as vantagens da energia solar, seja a fotovoltaica, para produção de energia elétrica, seja a térmica, para aquecimento. Em 2004, através de um acordo técnico-científico entre o Ministério de Ciência e Tecnologia, a PUC-RS e o Governo do Estado do Rio Grande do Sul, foi criado o Centro Brasileiro para Desenvolvimento de Energia Solar Fotovoltaica (CB-Solar), no Núcleo Tecnológico de Energia Solar (NT-Solar) da Faculdade de Física daquela universidade.
Considerado o mais moderno laboratório na América Latina para fabricação de células solares e módulos fotovoltaicos, os laboratórios foram projetados especificamente para desenvolver células solares e módulos fotovoltaicos convencionais e concentradores bem como para implementar e analisar sistemas fotovoltaicos e certificar os componentes. Como o CB-Solar de Porto Alegre, destaque nacional também tem o Laboratório Solar da UFSC – onde no momento está a sede da ISES (International Solar Energy Society) do Brasil, o Centro de Referência para Energia Solar e Eólica Sérgio de Salvo Brito, situado no Centro de Pesquisa em Energia Elétrica (CEPEL) no Rio de Janeiro, o Grupo de Estudos em Energia Solar da PUC-MG, o Departamento de Energia Elétrica da Universidade Federal do Ceará, o Laboratório de Energia Solar da Universidade Federal da Paraíba
Iniciativas no Brasil com energia solar
AEROPORTOS SOLARES é o projeto que o professor Ricardo Rüther, da Universidade Federal de Santa Catarina tenta viabilizar junto à INFRAERO e a bancos de fomento. A idéia é integrar geradores solares fotovoltaicos aos aeoroportos do Brasil, com objetivo é compensar a emissão de CO2 relacionada à aviação comercial. Pelo estudo do professor Rüther e sua equipe, em uma viagem de ida e volta Florianópolis- Brasília, por exemplo, cada passageiro é responsável pela emissão de cerca de 680 kg de CO2 na atmosfera, o que corresponde a uma cotação média no mercado internacional de quase R$ 40,00.
Tomando o aeroporto de Florianópolis como exemplo, para que o mesmo seja completamente abastecido por energia solar, seria necessário que, ao longo de um ano, cada um dos mais de 100 milhões de passageiros que viajam de avião no Brasil pagassem menos de 25 centavos. Já para o aeroporto de Brasília, este investimento individual ficaria em torno de R$ 1,40. Para o professor Rüther, “num primeiro momento parece caro, no entanto mais caro será o custo de nossa falta de ação pelo uso da energia de fontes renováveis de energia e no combate ao aquecimento global”.
FÁBRICA DE GELO SOLAR: uma máquina de refrigeração que funciona com energia térmica solar podendo produzir até 10 Kg de gelo por dia é um dos projetos do Laboratório de Energia Solar da Universidade Federal da Paraíba (LES-UFPB). Em Alagoas, a Fundação Teotônio Vilela desenvolveu projeto similar, criado pela empresa norte-americana SIC SOLAR ICE COMPANY e instalou a fábrica de gelo em pequenos municípios do estado.
AQUECEDOR SOLAR DE BAIXO CUSTO: a ONG Sociedade do Sol, sigla SoSol, sediada no CIETEC – Centro Incubador de Empresas Tecnológicas, no Campus da USP/IPEN está testando um aquecedor solar de água, de 200 a 1.000 litros, destinado a substituir parcialmente a energia elétrica consumida por 36 milhões de famílias brasileiras usuárias do chuveiro elétrico, em casas e apartamentos. Também já é comum o uso de aquecedores de baixo custo com garrafas pet e caixas do tipo longa vida.
Diversas escolas no país desenvolvem trabalhos de confecção destes aquecedores com os estudantes, o que é positivo, pois é um exemplo prático do uso e da importância da reciclagem. No entanto este tipo de aquecedor ainda não passou por avaliações técnicas que garantam sua eficácia e longevidade. Um dos críticos desta disseminação do aquecedor de pet é o professor Ricardo Rüther, da UFSC. “A água dentro de um balde preto exposta ao sol irá aquecer, o mesmo acontece com as pet. Mas ninguém disse ainda quanto tempo isso irá durar. Provavelmente, as garrafas terão que ser trocadas com freqüência, além da necessária limpeza, com gasto de água e energia. Então, qual a eficácia prática?”
MOTO SOLAR: Também foi desenvolvida na Universidade Federal de Santa Catarina uma adaptação para mover uma motocicleta elétrica através de energia solar. A Mobilec, como é chamada pelos pesquisadores em Florianópolis, tem uma autonomia de até 40 quilômetros com as baterias carregadas, não emite nenhum barulho ou poluição. Através de painéis solares fotovoltaicos as baterias são carregadas enquanto a moto fica estacionada. O protótipo foi desenvolvido com pedais como os de uma bicicleta, para que o usuário possa chegar até o receptor solar ou à tomada mais próximos caso a bateria descarregue. O motor da Mobilec fica junto à roda traseira e o freio é regenerativo. Assim, a cada freada a energia liberada também carrega as baterias.
ÔNIBUS SOLAR: Esta tecnologia ainda não se vê nas ruas do Brasil. Um exemplar do ônibus abastecido 100% com energia solar está em funcionamento na cidade australiana de Adelaide. Produzido pela empresa Neo-Zelandesa Designline International a partir de componentes de alta qualidade fornecidos por companhias de transporte e tecnologia como as gigantes MAN e Siemens, o veículo não possui um motor a combustão, o que o torna silencioso e sem emissões.
Outros produtos solares já no mercado: Cabine telefônica, carregador de celular, luminárias de jardim, aquecedor de piscina, bombas d’água etc
Diferenças entre energia fotovoltaica e térmica:
A principal diferença entre os módulos solares fotovoltaicos e os coletores solares térmicos está no princípio de funcionamento. Enquanto os primeiros utilizam os fótons da luz para excitar elétrons e, sob condições definidas, geram eletricidade em corrente contínua, podendo ser usada diretamente ou armazenada em baterias para uso posterior, os segundos transferem para uma superfície absorvedora pintada de preto o calor da luz do sol. O material das placas solares é diferente em cada caso. No coletor solar térmico usa-se alumínio, vidro e isolante térmico (lã de vidro). Já os painéis fotovoltaicos têm como principal elemento o silício, metal bastante caro.
Por se tratar de tecnologias distintas, os preços também são bem diferentes. Por exemplo: um coletor térmico para uso de uma família de quatro pessoas custa em torno de R$ 3.000,00. Já para a mesma família ter em casa um gerador solar fotovoltaico para gerar 200kWh/mês, o investimento será de R$ 25.000,00 a R$ 30.000,00.
Isso explica em parte a ausência de fábricas de painéis fotovoltaicos no Brasil até o momento enquanto que coletores térmicos são fabricados em toda parte, até com materiais recicláveis, como garrafas pet e caixas longa vida.