04 abr A luz que vem do campo
A expansão da economia é um grande feito tanto para as camadas mais pobres da população, que passam a ter acesso a uma série de bens, como eletrodomésticos, quanto para a indústria brasileira, que os produz. Mas esse fenômeno tem um lado preocupante – o aumento do consumo de energia elétrica, que no ano passado foi de 6,5%.
Para atender ao crescimento da demanda, governo e setor produtivo estão numa corrida contra o tempo. As projeções são de que o consumo de energia elétrica deve, num cenário conservador, crescer no mínimo 5% ao ano até 2012. A demanda passaria dos atuais 5 200 megawatts médios para 64 200, segundo a consultoria especializada PSR.
Nesse cenário, o país terá de acrescentar 3 000 megawatts a cada ano, apenas para manter o atual quadro de oferta extremamente apertada. Se quiser voltar a ter folga, o ideal seria acrescentar 4 000 megawatts anualmente, montante superior à geração esperada da futura hidrelétrica de Santo Antônio, no rio Madeira, a ser inaugurada em 2012. A questão é: de onde virá a energia adicional que o Brasil vai necessitar nos próximos anos?
Para remendar o chamado “cobertor curto” do mercado nos próximos anos, a solução será uma combinação de alternativas energéticas. As hidrelétricas, tanto as de grande porte quanto as centrais pequenas, continuarão a ser a principal fonte do país, seguidas das termelétricas movidas a gás, óleo e carvão.
Mas há uma novidade que pode ser a chance de o país se livrar da corda bamba: é a energia elétrica gerada pela biomassa, especialmente do bagaço de cana-de-açúcar, considerada pelo governo como o combustível alternativo mais promissor na falta de chuva. A biomassa deve contribuir com 13% do total a ser acrescentado na geração de energia até 2012. Parece pouco, mas é exatamente essa diferença que pode evitar um novo apagão. Atualmente, a maioria das usinas usa a cana apenas para retirar o caldo – e fazer açúcar ou álcool com ele.
Agora, deve aproveitar também o bagaço para queimá-lo, gerando vapor que move turbinas de energia elétrica. “A entrada da biomassa significa uma folga para o mercado num período particularmente crítico”, diz o economista José Rosenblatt, da PSR. “Até a virada da década podemos continuar vulneráveis, sujeitos à boa vontade de São Pedro.”
De onde virá o que falta
Desde setembro do ano passado, o governo estuda um modelo de negócios que viabilize a geração de energia elétrica aproveitando o bagaço da cana.
DE SUA PARTE, OS USINEIROS ENXERGAM no bagaço da cana uma suculenta oportunidade de novos negócios. “A Santa Elisa vai participar do leilão. A perspectiva da biomassa é excelente”, diz Luiz Biagi, sócio da usina Santelisa Vale, uma das maiores do setor. No entanto, para entregar a mercadoria no prazo, a partir de maio de 2009 os usineiros terão de cumprir um cronograma apertado.
Boa parte das usinas precisa comprar novos equipamentos, como caldeiras de alta pressão para produzir, com o bagaço, o vapor que move as turbinas para gerar a eletricidade. Mas vários grupos já saíram na frente. “Todas as nossas usinas vão gerar energia”, afirma Clayton Hygino de Miranda, presidente da ETH Bioenergia, empresa do Grupo Odebrecht criada em 2007 para produzir açúcar, etanol e energia elétrica. “Contamos que até 20% de retorno do investimento virá da venda de energia.” A Cosan, maior produtora de açúcar e álcool do Brasil, deve gerar 288 megawatts de energia provenientes de biomassa até 2012.
Linha de distribuição: oferta apertada
DivulgaçãoDe acordo com estimativas da Associação Paulista de Cogeração de Energia, as usinas de álcool deverão investir 1,5 bilhão de reais nessa frente. No que diz respeito às linhas de transmissão, serão necessários outros 2 bilhões de reais. A Aneel planeja realizar um segundo leilão, ainda sem data marcada, exclusivamente para as linhas de transmissão que farão a energia gerada pelas usinas chegar à rede existente. Em São Paulo e Minas Gerais, onde está a maioria das usinas, será preciso fazer apenas o reforço e a ampliação das linhas existentes. Mas em Goiás e Mato Grosso do Sul elas serão erguidas quase do zero.
A entrada de uma nova fonte geradora no mercado é uma boa notícia do ponto de vista do combate ao risco de escassez – embora haja dúvidas quanto ao preço que essa energia será vendida no futuro, provavelmente bem acima dos valores atuais. Mas é certo que o país terá de fazer mais para afastar de vez o risco de apagão. Para os especialistas, o Brasil precisa tirar duas lições dessa crise. A primeira, que está saindo do papel, é a construção de novas hidrelétricas, como as do rio Madeira.
Elas devem responder por um terço da energia adicional a ser gerada nos próximos anos. A segunda é a inevitável diversificação da matriz energética. “Além do potencial da biomassa e do gás, temos de investir em fontes como carvão mineral e até energia nuclear”, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura. Dado o aperto na oferta, o governo determinou que as termelétricas continuassem operando a gás, óleo diesel e óleo combustível. Hoje, as termelétricas têm capacidade para produzir cerca de 20% do consumo do país.
Mas, em razão da falta de combustível, causada pela mudança política na Bolívia, elas só têm produzido 13%. É aí que, de acordo com as piadas do mercado, mais uma divindade entra em ação — depois de são Pedro e santo Antônio, vem o Espírito Santo. Explica-se: é de terras capixabas que o governo espera despachar, até o final do ano, 5 milhões de metros cúbicos de gás por dia para a geração de eletricidade, o que equivaleria a adicionar 1 000 megawatts à capacidade do país.
Mas só haverá gás nacional suficiente para garantir imunidade aos humores do governo boliviano na virada da próxima década, com o funcionamento do campo de Tupi, na bacia de Santos. Ou seja, a sorte do Brasil depende de uma vontade conjunta de todos os santos.
De acordo com estimativas da Associação Paulista de Cogeração de Energia, as usinas de álcool deverão investir 1,5 bilhão de reais nessa frente. No que diz respeito às linhas de transmissão, serão necessários outros 2 bilhões de reais. A Aneel planeja realizar um segundo leilão, ainda sem data marcada, exclusivamente para as linhas de transmissão que farão a energia gerada pelas usinas chegar à rede existente. Em São Paulo e Minas Gerais, onde está a maioria das usinas, será preciso fazer apenas o reforço e a ampliação das linhas existentes. Mas em Goiás e Mato Grosso do Sul elas serão erguidas quase do zero.
A entrada de uma nova fonte geradora no mercado é uma boa notícia do ponto de vista do combate ao risco de escassez — embora haja dúvidas quanto ao preço que essa energia será vendida no futuro, provavelmente bem acima dos valores atuais. Mas é certo que o país terá de fazer mais para afastar de vez o risco de apagão. Para os especialistas, o Brasil precisa tirar duas lições dessa crise. A primeira, que está saindo do papel, é a construção de novas hidrelétricas, como as do rio Madeira.
Elas devem responder por um terço da energia adicional a ser gerada nos próximos anos. A segunda é a inevitável diversificação da matriz energética. “Além do potencial da biomassa e do gás, temos de investir em fontes como carvão mineral e até energia nuclear”, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura. Dado o aperto na oferta, o governo determinou que as termelétricas continuassem operando a gás, óleo diesel e óleo combustível. Hoje, as termelétricas têm capacidade para produzir cerca de 20% do consumo do país.
Mas, em razão da falta de combustível, causada pela mudança política na Bolívia, elas só têm produzido 13%. É aí que, de acordo com as piadas do mercado, mais uma divindade entra em ação — depois de são Pedro e santo Antônio, vem o Espírito Santo. Explica-se: é de terras capixabas que o governo espera despachar, até o final do ano, 5 milhões de metros cúbicos de gás por dia para a geração de eletricidade, o que equivaleria a adicionar 1 000 megawatts à capacidade do país. Mas só haverá gás nacional suficiente para garantir imunidade aos humores do governo boliviano na virada da próxima década, com o funcionamento do campo de Tupi, na bacia de Santos. Ou seja, a sorte do Brasil depende de uma vontade conjunta de todos os santos.
(Ângela Pimenta, Planeta Sustentável, 26/03/08)