06 ago O perigo pode estar no outro lado da linha
O nome dele é de anjo: Gabriel! Mas ninguém sabe ao certo o que se esconde atrás de sua verdadeira identidade. Pelo telefone, ele promete realizar inúmeras fantasias sexuais. O anúncio de sua performance está espalhado por banheiros e orelhões de Florianópolis. Assim como ele, dezenas de pessoas utilizam o patrimônio público para colocar ofertas que vão desde propostas sexuais à locação de imóveis. Nos primeiros seis meses de 2007, somente na Capital, foram danificados 984 orelhões.
A gerente comercial Yohana (nome fictício), 23 anos, diz que sempre ficava intrigada quando ia a um orelhão e lia as frases escritas na parte interna. Num dia, com uma amiga decidiu ligar para um daqueles números. A proposta, diz ela, era tentadora. O rapaz se identificou como “Eros”, o Deus do Amor, e prometia realizar todas as fantasias sexuais com total discrição. “Ficamos tentadas a saber se era verdade. Mesmo com medo ligamos”, relembra.
Por trás da linha apareceu uma voz doce e suave. O rapaz, num primeiro momento, se mostrou tímido e retraído com a conversa, mas depois foi se soltando. Segundo Yohana, ele desconfiou que a ligação poderia ser um trote mas deixou o papo rolar. Ela conta que tinha intenção de desligar, mas que, a voz envolvente do rapaz despertou nela o desejo de continuar. “Me senti atraída por aquilo.”
O que era apenas uma curiosidade foi tomando outro rumo até o ponto dela marcar um encontro com o garoto de programa para aquela mesma noite. Pela descrição física dada por telefone, Eros deveria ser o sonho de consumo de toda mulher: alto, forte, musculoso, romântico e totalmente discreto. O programa custaria R$ 150 por uma hora, sendo as despesas do motel pagas pela cliente. Yohana diz que convidou uma amiga para irem juntas ao local.
Dez e meia da noite. Este foi o horário marcado para o encontro. Ele estaria na praça 15 de Novembro, com um gorro preto e com o logotipo do time de futebol do São Paulo. O que ele não sabia era que Yohana não tinha intenção de fazer o programa. “Meia hora antes do horário estacionei o carro perto do ponto e fiquei observando. Vi quando ele chegou e não acreditei. Ele era tudo aquilo que havia prometido.”
Apesar da tentação de falar pessoalmente com ele, Yohana diz que teve medo e decidiu ir embora, mas confessa que até hoje sente-se perturbada quando lembra dessa história.
Policial alerta contra “armadilha”
Segundo o delegado do 2º Distrito Policial de Florianópolis, Adalberto Safanelli, Yohana fez a escolha certa ao não aceitar o programa, pois anúncios como o de Eros são cada vez mais comuns nas grandes cidades e representam um risco real à população. “Esse golpe é recorrente na cidade, mas não aparece nas estatísticas policiais porque as vítimas têm vergonha de revelarem a identidade”, justificou.
Extorsão, assalto, roubo, agressão física ou morte são apenas alguns dos riscos que as pessoas que marcam encontros estão sujeitas. Safanelli alerta que, em hipótese alguma, a população deve cair nessa “armadilha”, comparável a outro famoso golpe, o do “conto do bilhete”. “A prostituição e o favorecimento dela são apenas um dos crimes que podem ser cometidos através desses anúncios, mas existem problemas bem maiores”.
Para a auxiliar de corte Suzana Pereira Barbosa, 29 anos, pichar patrimônios públicos é um desrespeito que deve ser punido. Ela diz que nunca se interessou por esses anúncios, mas que uma irmã ligou para alguns que prometiam empregos.
Depredação provoca prejuízos
Na Grande Florianópolis, nos primeiros seis meses do ano, 1.792 orelhões foram danificados. Quase mil deles só na Capital. O vandalismo e as falhas nos componentes mais expostos ao uso, como monofone, cabo e leitura de cartões são outras falhas freqüentes encontradas pela Brasil Telecom – empresa concessionária de telefonia púbica.
De acordo com a assessoria de imprensa da companhia, 99 % dos pedidos de reparos são feitos em até oito horas. As pessoas podem contribuir para a manutenção desses aparelhos denunciando os atos de vandalismo, assim como os pedidos de reparos.
Quanto à pichação dos aparelhos, a Brasil Telecom afirma que na região metropolitana da Capital, quando um telefone público sofre este tipo de depredação, a equipe responsável pela manutenção dos aparelhos faz a limpeza das cúpulas.
Propagandas oferecem de tudo
O preço do programa é alto: R$ 200, porém, não há limites de horário. Segundo o “anjo” Gabriel, isso dependerá muito da “química” entre ele e o cliente, o que pode aumentar ou reduzir o tempo do encontro. Para chegar até Gabriel e a outras pessoas que fazem programa na cidade anunciando em patrimônios públicos, foram percorridos vários bairros de Florianópolis e também alguns banheiros públicos do Centro para anotar o contato dos “classificados”.
Após mais de 15 minutos de conversa, Gabriel passou um endereço através do orkut (site de relacionamentos virtuais) para que pudesse ser visto por fotos e, se houvesse interesse, seria marcado o programa. Ele confessou que trabalha como garoto de programa porque sente prazer nessa atividade e é um dinheiro que ajuda nas suas despesas. Em momento algum foi revelado que se tratava-se de matéria jornalística.
O único nome fornecido por ela foi o apelido: “Bia”. Ela se vendeu como uma garota experiente e fogosa, que realiza todas as fantasias de um homem. Morena jambo, 26 anos 1,70 m, seios durinhos, bumbum empinado e coxa grossa. Os encontros são no seu apartamento, no Centro, pelo preço de R$ 40, por 40 minutos e; R$ 60, por uma hora. Se o programa se estender por mais tempo, o preço pode subir para até R$ 200. “Faço porque gosto, e trabalho de manhã até a noite”, disse.
Mas, não é somente sexo que é vendido nesses anúncios. Com o mesmo pretexto de que havia visto um anúncio num orelhão, a reportagem ligou para um dos números de um topógrafo – uma das ofertas mais comuns encontradas na cidade. O rapaz se identificou como engenheiro e disse que fazia trabalhos de topografia, mas que o contato inicial deveria ser feito no seu escritório, em Canasvieiras. “Foi um estagiário que tive e andou colocando os serviços dele nos orelhões. Depois comprei o celular dele”.
Outro anúncio encontrado em um orelhão foi o de um imóvel para locação na Agronômica. Segundo o anunciante, essa opção é cômoda porque ele não tem que pagar nada por isso e atrai mais clientes do que se fosse publicada em jornal.
Saiba mais
Crimes que podem ser enquadrados os anunciantes:
• Prostituição e favorecimento à prostituição: detenção de dois a cinco anos
• Extorsão: quatro a dez anos de detenção
• Furto: um a cinco anos de detenção
• Crime contra o patrimônio público: de um a cinco anos de detenção
(André Luís Cia, A Notícia, 05/08/2007)