28 ago Morador de rua sofre com frio e chuva
Segunda-feira de manhã. Uma chuva fina de inverno teimava em cair na Capital. Enquanto as pessoas se preparavam para sair de casa e seguir para o trabalho ou escola; muitos moradores de rua de Florianópolis procuravam o abrigo das árvores ou marquizes para se proteger do frio.
Na maioria das vezes, os motivos que levam essas pessoas para as ruas são semelhantes: alcoolismo, drogas ou desentendimentos familiares. Há quatro meses, Joel Dias, 42 anos, mora na rua. Ele diz que escolheu esse caminho para cumprir com suas obrigações de pai. Com cinco filhas, com idades que vão dos 12 aos 23 anos, conta que foi obrigado pela Justiça a pagar pensão das três menores, mas que, acabou indo para a rua para evitar gastos extras com aluguel. “O dinheiro que gastaria em casa economizo e dou como pensão para minhas filhas.”
Ele não tem emprego fixo e diz que sobrevive hoje graças à solidariedade das pessoas que lhe dão alimentos em troca da sua ajuda para “olhar” os carros que são estacionados na rua Monsenhor Toff – uma das laterais da rua Mauro Ramos, no Centro. Dias garante que os banhos são tomados num hotel próximo dali e que quando pode paga uma pensão na praça da Luz por três ou quatro dias. “Não gosto de ficar na rua, mas fui eu mesmo que escolhi esse caminho, pois não quero voltar para casa.”
A responsável pelo programa de gerência da família da Secretaria de Desenvolvimento Social da Prefeitura de Florianópolis, Elizabeth Goulart, foi procurada várias vezes durante toda manhã e início da tarde de ontem, mas não retornou às ligações para comentar sobre os programas sociais realizados na cidade. A reportagem também tentou outras pessoas na mesma Secretaria, inclusive a responsável pela pasta, Rosemeri Berger, mas não houve retorno. Na assessoria de imprensa, a informação é de que somente na Secretaria estas informações poderiam ser repassadas.
Albergue auxilia as pessoas que chegam na cidade
Para quem vem de outra cidade e não tem onde ficar em Florianópolis, a dica é procurar pelo albergue noturno Manoel Galdino Vieira. O local, que conta com 25 vagas masculinas e oito femininas, atende diariamente pessoas carentes que chegam à cidade e precisam de um amparo inicial.
De acordo com a administradora do albergue, Leodigária Maria Rocha Cardoso, não são admitidas pessoas alcoólatras ou usuárias de outros tipos de drogas. As pessoas podem permanecer por até dez noites seguidas. O local funciona das 19h30 às 7 horas diariamente. “Nós trabalhamos para ajudar estas pessoas que não têm residência fixa e precisam da ajuda para conseguir um emprego.”
O albergue está localizado na avenida Hercílio Luz, 506, no Centro. O atendimento é totalmente gratuito e além do dormitório, os hóspedes têm direito a duas refeições (jantar e café da manhã) e a um banho. Informações pelo telefone: 3222-2424.
Trio divide comida e a cachaça
A praça 15, na área central de Florianópolis, é um dos locais de maior fluxo de pessoas na Capital e também um dos principais pontos de mendigos e moradores de rua. Ontem pela manhã, a reportagem encontrou três deles sentados num dos bancos, próximo ao banheiro público.
A cachaça era usada para “espantar” o frio. Suas histórias são confusas, mas esbarram num mesmo problema: a desigualdade social e as brigas familiares. Joceli Reginaldo dos Santos, 31 anos, George Marcel Alexandre, 41, e Genésio Ribeiro Reis, 45, se conheceram nas ruas, mas confessam que a amizade entre eles é muito mais forte e verdadeira do que de pessoas da própria família.
“Cada um de nós parou aqui por um motivo, mas o legal é que a gente é unido. O que um tem divide com o outro e assim passamos o nosso dia”, disse o mineiro Reis.
Ele aponta que já percorreu muitos estados brasileiros e trabalhou em empregos temporários, mas que o problema do alcoolismo afetou sua vida pessoal e profissional.
Há três anos morando nas ruas. Ele afirma que sobrevive apenas com um salário que recebe por estar “encostado” pelo INSS por ter tido vários problemas, como a hanseníase.
“Foi depois de ter essa doença que acabei me tornando alcoólatra e daí perdi o rumo de vez na minha vida”, lamenta.
“A gente se torna esquecido pelo governo”
Para os três moradores de rua abordados ontem na praça 15, o sonho de uma vida melhor, distante das ruas e com possibilidade de trabalho e moradia fixa, depende muito mais da iniciativa do governo municipal que precisa olhar o problema com “outros olhos” do que força de vontade e iniciativa deles para sair dessa situação.
“A gente se torna esquecido pelo governo. Não é fácil viver sem ter para onde ir, sem trabalho, distante da família e muitas vezes passando fome”, lamentou Joceli Reginaldo dos Santos, 31 anos, o caçula do grupo. Gaúcho da cidade de Cachoeira do Sul, diz que há seis meses saiu de sua casa para conhecer as praias de Santa Catarina, mas acabou se “perdendo” pelas estradas e não teve como voltar para seu Estado. “Na primeira vez fui para Balneário Camboriú. Fiquei um tempo lá e acabei parando aqui, mas quero voltar para casa logo.”
George Marcel Alexandre, 41 anos, é o único nascido em Florianópolis. Visivelmente embriagado, apesar de ainda ser nove horas da manhã no momento da entrevista, ele confessou que a falta de oportunidades o levou para a rua. Do seu passado só se recorda que teve cinco filhos, mas diz que não sabe como vive a sua família hoje. “Sei que eles moram na Prainha, mas há muito tempo que eu não vejo ninguém.”
Para eles, a maior dificuldade de morar nas ruas não é nem a questão da insegurança, mas a falta de perspectiva profissional. “Tem dias que a gente não tem o quer comer e passa o tempo todo apenas com um pedaço de pão no estômago”, lamentou Genésio Ribeiro Reis.
Eles admitiram que aceitariam qualquer emprego para sair da rua e que têm experiência como pedreiro, pintor, ajudante, guarda, entre outros.
(Andre Luís Cia, A Notícia, 28/08/2007)