27 nov Privatização da água volta ao debate
A aprovação de um projeto de emenda à Lei Orgânica de Florianópolis, proibindo a privatização da água e esgoto no município, estimula o debate sobre o futuro do saneamento na cidade, num momento em que diversos setores se manifestam sobre o tema. Tudo isso motivado pelo fim do contrato de concessão assinado há 30 anos entre a Prefeitura da Capital e a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan), em fevereiro de 2007.
O projeto apresentado pela vereadora Angela Albino (PCdoB) foi votado em 21 de novembro, sendo aprovado por oito votos a seis, faltando apenas a segunda votação para que possa ser transformado em lei, o que deve ocorrer até meados de dezembro. “A água é um bem necessário à manutenção da vida, portanto, é fundamental que a população detenha o controle social sobre ela”, justifica Angela.
A base governista na Câmara tentou protelar a votação por meio de um requerimento apresentado pelo vereador Jair Mioto (PTB), líder do governo, mas foi rejeitado. Com o plenário lotado por funcionários da Casan, mobilizados pelo sindicato da categoria, o projeto foi finalmente a votação. Os votos favoráveis dos vereadores João Batista Nunes (PDT), Ptolomeu Bittencourt Júnior (PFL) e João Itamar da Silveira (PMDB), foram decisivos para a aprovação.
Para o presidente da Câmara de Vereadores, Marcílio Ávila (PSDB), “o poder de decisão sobre o futuro da água e do esgoto de Florianópolis é do Legislativo”, que optou por não privatizar o setor. Para ele existem duas alternativas: a municipalização e criação de um órgão para gerenciar o saneamento ou a renovação do contrato de concessão com a Casan por mais três anos.
“Acho que a segunda alternativa é a mais viável, desde que essa renovação seja condicionada a algumas exigências”, destaca Marcílio, como a de ampliação da cobertura por redes de esgoto dos atuais 47% da população para 85%. “Se a meta não for atingida, o contrato fica automaticamente desfeito”, explica.
Para que o objetivo seja atingido será necessário o investimento de aproximadamente R$ 200 milhões, recursos que estão sendo garantidos pela Casan por meio de empréstimo externo. “Esse valor que a Casan está obtendo seria aplicado em vários municípios do Estado, mas como cidades como Joinville e Lages romperam com a empresa, vão sobrar mais recursos para Florianópolis”, argumenta Marcílio Ávila.
“Um grande negócio”, diz engenheiro
“A área de saneamento em Santa Catarina se tornou um grande negócio”, afirma o engenheiro Grover Alvarado, assessor de planejamento da Casan, citando como exemplo a receita mensal da empresa com o fornecimento de água na Capital: cerca de R$ 6 milhões. “A água é um bem que não pode ser privatizado”, acrescenta, citando os problemas que ocorrem nas cidades que não renovaram seus contratos com a Casan.
Em Itajaí, por exemplo, “a Casan atuou durante décadas sem fornecer água salgada à população, como está ocorrendo”. Em Itapema, o serviço foi entregue a uma empresa do Mato Grosso do Sul, que “furta a água que nós tratamos e a distribui para a população, cobrando e não pagando nada”. O caso foi parar na Justiça, que determinou à Casan que forneça a água até o acerto de um preço pelo serviço. “Isso não foi estabelecido até hoje”.
Em Lages, a Prefeitura encampou o sistema de coleta e tratamento de esgotos, quando faltavam apenas 200 metros de um total de cem quilômetros para sua conclusão. “Até hoje, não terminaram esses 200 metros”, destaca Grover. Ele cita casos de privatização da água que não deram certo em outras partes do mundo, como nas Filipinas e na Alemanha. “Um vereador de Florianópolis chegou a me dizer que dos R$ 6 milhões mensais arrecadados com a água, R$ 4 milhões seriam reaplicados no setor e os R$ 2 milhões restantes teriam outros destinos”, acrescenta. “É preciso que a população saiba que a privatização da água não deu certo em nenhum lugar, para que isso não venha a ocorrer aqui”, complementou.
Administração compartilhada
O sistema de administração compartilhada proposto pelo vereador Marcílio Ávila para Florianópolis, acaba de ser assinado entre a Casan e a Prefeitura de Santo Amaro da Imperatriz, renovando o contrato de concessão de serviços de água e saneamento básico no município por mais três anos. Em troca, a Casan se compromete a concluir o sistema de coleta de esgotos na região central da cidade. A estação de tratamento já está concluída, faltando apenas o assentamento de parte da rede de coleta. Atualmente, a unidade da Casan no município é responsável por 4.800 ligações de água, com 13 servidores lotados.
Fórum deve ter participação de especialistas e entidades
O futuro da água e do esgoto em Florianópolis será debatido durante um fórum que a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (Abes/SC) realiza em 4 de dezembro, na sede da seccional catarinense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/SC), com a presença de técnicos, entidades e autoridades do setor.
A iniciativa tem o apoio da Associação Comercial e Industrial de Florianópolis (Acif), que coordenou a realização de 15 reuniões com entidades interessadas na discussão do assunto. Uma sugestão elaborada pela Abes/SC, intitulada “Novo modelo proposto para águas e esgoto” (ver quadro), vai servir de base para os debates.
Segundo o documento, caberá ao poder público “examinar o que é vantajoso para a sociedade em geral, do ponto de vista dos serviços, da estruturação, da eficiência técnica, da capacidade operacional, a experiência empresarial, do investimento, da qualidade, da responsabilidade e da garantia do sistema”. Os resultados do encontro serão levados ao governo do Estado e para a Prefeitura de Florianópolis.
(Celso Martins, A Notícia, 27/11/2006)