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Grande Florianópolis não se adequa à lei que determina destino certo aos resíduos sólidos

Os quatro principais municípios da Grande Florianópolis (Capital, São José, Biguaçu e Palhoça) juntos acumulam, por mês, mais de 25 mil toneladas de resíduos por dia no aterro sanitário da Proactiva, em Biguaçu. É o único regulamentado e atende toda a região e 22 cidades do Estado. Mas, segundo a engenheira sanitarista da empresa Fernanda Vanhoni, o volume poderia ser reduzido pela metade se os municípios, governo, setor privado e cidadãos tratassem melhor os resíduos que produzem.

Isso significa que metade do que está ali não é lixo. Há mistura de material orgânico e reciclável, como garrafas pet, embalagens, sacos plásticos e até roupas. O plástico, por exemplo, é leve, mas rouba volume que deveria ser apenas do rejeito. E essa redução e separação adequada é a proposta do PNRS (Plano Nacional de Resíduos Sólidos), estipulado pela lei 12.305 de 2010, que em duas semanas poderá ser o motivo de os municípios não receberem mais recursos da União para serviços relacionados ao saneamento, à gestão de resíduos sólidos e para financiamentos de entidades federais de crédito.

No dia 2 de agosto termina o prazo para os municípios apresentarem seus planos de gestão de resíduos e darem a destinação adequada a todo o material, deixando apenas o que é lixo de fato e não pode ser reaproveitado (fraldas e papel higiênico), para ser aterrado. Lixões (áreas a céu aberto e sem preparação do solo, diferente dos aterros sanitários) não poderão mais existir e todo resíduo gerado deve ser descartado de maneira ambientalmente adequada.

Mas em apenas duas semanas os municípios não conseguirão concluir os trabalhos que não conseguiram fazer em quatro anos. Serão necessárias ações que visem evitar a geração, fomentem a redução, reutilização, reciclagem e tratamento dos resíduos sólidos. Além disso, a responsabilidade pelo ciclo de vida dos produtos deixa de ser apenas dos governantes e passa a ser compartilhada entre cidadão, empresas e governo.

O aterro sanitário da Proactiva funciona 24 horas, com 86 funcionários em três turnos. Os resíduos, acumulados desde 1990, ocupam 19 hectares, separados por células, que hoje formam um monte de 75 metros de altura. O volume gera diariamente, por hora, cerca de 20 m³ de chorume e 3.600 m³ de gás.

Se continuar recebendo esse volume – que cresce a cada ano –, o aterro terá vida útil de mais 20 anos, apenas. Com a aplicação de ações propostas na lei, haveria a diminuição de volume de resíduos e o aterro teria vida útil maior.

Quando não tiver mais espaço e precisar encerrar as atividades, a área de aterro deve ficar fechada e monitorada durante pelo menos 20 anos. Depois, o solo pode ser reaproveitado para diversas finalidades, uma possibilidade é um parque ambiental.

Apesar de Santa Catarina ser livre de lixões, os municípios ainda não tem um plano de gestão de acordo com o PNRS e está distante do ideal proposto pelo governo federal. Há dois anos a SDS (Secretaria de Estado de Desenvolvimento Sustentável) elaborou o Plano Estadual de Gestão Integrada de Resíduos Sólidos, que divide Santa Catarina em 16 regiões e, em abril, firmou um termo de cooperação com 126 municípios de Santa Catarina, por meio de associações dos municípios, para elaborar um plano de gestão integrada.

Porém, os planos ainda estão sendo elaborados. Segundo o diretor de Saneamento e Meio Ambiente da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável, Luiz Antônio Garcia Corrêa, a previsão é de que parte dos planos municipais contratados pelas associações de municípios fique pronto no final do ano e o restante em 2015. Para isso, deve liberar até o final da execução dos planos R$ 4,9 milhões.

A Granfpolis (Associação dos Municípios da Grande Florianópolis), por enquanto, ficou de fora da parceria com a SDS e aguarda retorno da SDR (Secretaria de Desenvolvimento Regional) da Grande Florianópolis, responsável pela licitação pública para a contratação de empresa que execute os planos municipais.

O gerente Regional de Projetos Especiais da SDR José Luiz Sardá disse que o edital será lançado ainda este mês, e os trabalhos, que terão prazo para conclusão em julho de 2015, começarão assim que for conhecida a empresa vencedora. Segundo ele, são gerados cerca de 1,5 milhão de toneladas de resíduos por ano em Santa Catarina, e quase tudo ainda vai para os aterros. A meta do Estado é reduzir para 70% os resíduos secos que ainda vão para os aterros.

“Os municípios que não trabalharem de forma integrada terão problemas no futuro. Em conjunto, é possível dar mais celeridade”, afirma.

Apesar do interesse e disposição do governo estadual, os municípios da Grande Florianópolis estão distantes da ideia consorciada e alguns nem conversaram sobre o assunto. Cada um busca individualmente ações para se enquadrar na nova legislação.

O negócio de Ribeiro é reaproveitar

Mesmo encontrando dificuldade em achar empresas que trabalhem com a logística reversa, que se responsabilizem e coletem de volta o que foi produzido, há cidadãos e empresários que já viram o potencial que este material tem. Aluir da Silva Ribeiro, 51, viu que poderia fazer diferença há 24 anos, quando fundou a Alumetal Comércio de Metais e Materiais de Reaproveitamento.

Não é à toa que a empresa estabelecida em Palhoça serviu de cenário para filmes universitários e curtas e é procurada para ensaios fotográficos. A variedade de peças usadas, entre metais, cadeiras e cercas antigas, esquadrias, motores, vidros e decorações somam 1.200 toneladas.

Ribeiro compra e revende materiais usados que podem ser recuperados. Além de sustentar sua família, hoje o negócio emprega mais 16 pessoas. “Isso poderia estar por aí espalhado, poluindo ou no lugar errado, mas está aqui organizado, esperando alguém que possa reaproveitar. Na natureza nada se perde. O que não serve para você serve a outro, e alguém tem que fazer esse papel de recuperar o que iria para o lixo, eu me dispus”, rebate.

O material vem de demolições, leilões, hotéis, empresas que querem renovar o mobiliário e de pessoas que o procuram para vender e comprar materiais. Com a experiência, Ribeiro construiu a sua casa de maneira ousada. Mais da metade do material utilizado foi de reaproveitamento gastando um terço do que gastaria comprando novo. Uma cadeira estilo Luís 15 e uma porta que foi da Casa d’Agronômica (residência oficial do governador) estão entre as peças inusitadas de sua morada.

Mudança de cultura e educação ambiental são os caminhos

Em uma questão, pelo menos, todos os agentes envolvidos no processo de produção e descarte de resíduos concordam: é necessário mais informação e educação ambiental. Mas o processo de mudança cultural é trabalhoso. A professora Marcia Regina da Cunha realiza um projeto de reciclagem há 20 anos na escola municipal Dilma Lúcia dos Santos, na Armação do Pântano do Sul, em Florianópolis. A atividade faz parte da grade curricular regular dos pequenos do primeiro ao quarto ano e, a partir do quinto ano, os estudantes podem participar no contraturno escolar.

Mesmo depois de tanto tempo, a educadora diz que ainda é preciso insistir, porque os alunos gostam do lúdico, de mexer no papel picado, pintar, colar e recriar. Mas na hora de recolher e separar os materiais a tarefa é mais árdua. Para ela, o trabalho em conjunto com a família em casa também é fundamental para formar um adulto interessado. Na própria escola, às vezes, é preciso chamar a atenção de professores que ainda têm a ideia condicionada e não mudam hábitos, descartam tudo junto de qualquer jeito.

“É preciso falar nisso para encucar a ideia neles, conscientizar que a roupa do irmão mais velho, que passou para o mais novo, e o arroz do almoço na janta é reaproveitamento. A partir da brincadeira que se desenvolve a conscientização ambiental, mas é preciso incentivar sempre, às vezes, até forçar”, avalia Marcia.

As crianças, além de reciclar papel, aprendem a fazer novos objetos e brinquedos a partir do material que é descartado. Para as colegas do quinto e nono ano, é uma experiência nova. No projeto, elas construíram um banco de garrafas pet e uma casa de boneca de papelão.

“A gente aprende a importância de separar tudo para não prejudicar o meio ambiente e ainda podemos reaproveitar para nosso próprio benefício”, diz Manoela Hossein, 11. Ana Carolina Müller, 13, também gosta da experiência e no seu primeiro ano do projeto ficou surpresa com o próprio objeto que produziu. “Não imaginei que eu conseguiria fazer um banco e que ele aguentaria, achei que seria fraco. A casa de bonecas também foi muito legal”, disse.

Parque ecológico incentiva cidadão a fazer sua parte

Quem já cresceu, e não tem a oportunidade de reaprender na escola, não tem desculpas para largar os resíduos que produz em qualquer canto, principalmente o que é orgânico. Além de ter pontos de entrega voluntária, há maneiras simples de fazer o processo de compostagem e reaproveitamento da terra até em apartamentos.

No parque Ecológico do Córrego Grande, em Florianópolis, além de ter um ponto de entrega de pilhas e óleo de cozinha, o engenheiro ambiental Gilberto Napoleão realiza o projeto Família Casca, em que os moradores da região podem ir até o local, depositar em galões seus resíduos orgânicos e aprender mais sobre compostagem – técnica que estimula a decomposição de materiais orgânicos transformando em adubo. A proposta é desenvolver um modelo de gestão local de resíduos orgânicos com envolvimento comunitário, reduzindo a quantidade enviada ao aterro sanitário.

“Conseguimos tratar um pouco e possibilitar que as pessoas tratem em casa. São ações complementares, o que fazemos aqui não vai resolver a situação do município. O trabalho é para aqueles que querem fazer alguma coisa”, explica.

São recolhidos de cinco a sete toneladas por semana. O material recolhido é depositado em leiras de compostagem. Sobre a camada de resíduos, é colocada uma camada de folhas secas. Todo o material é revirado a cada 15 dias. O processo de decomposição pode levar até sete meses, mas com o minhocário o processo é acelerado porque as minhocas higienizam o resíduo.

Em um mês, o volume já reduz em 30% e, ao fim do processo, o material é transformado em terra adubada, pronta para o plantio e é doada à comunidade. A proposta é estender o projeto para os outros parques municipais da cidade até o fim do ano.

Confederação pede prorrogação do prazo

Os municípios têm encontrado dificuldades em cumprir as determinações do Plano Nacional de Resíduos Sólidos e, por causa disso, a Confederação Nacional de Municípios pediu adiamento do prazo. A entidade realiza uma pesquisa, que deve ser concluída até o fim do mês, para saber a situação real dos municípios e quantos conseguirão cumprir o que exige a lei, mas aguarda o posicionamento do Congresso.

Porém, o Ministério Do Meio Ambiente informou, por meio da assessoria de imprensa, que a extensão do prazo só pode ser feita alterando o artigo 54 da lei 12.305 e há um projeto tramitando na Câmara dos Deputados sobre o assunto. Apesar disso, ressalta que desconhece os argumentos que levaram o Congresso Nacional a propor e aprovar tal prazo.

A nota diz ainda que, após a sanção da Lei de Resíduos Sólidos, em 2010, o Ministério do Meio Ambiente disponibilizou, em 2011 e 2012, recursos federais para que Estados e municípios pudessem elaborar seus planos de gestão de resíduos sólidos, investindo R$ 57 milhões, que oram repassados a 19 Estados e 616 municípios.

O Senado também tem uma Subcomissão Temporária de Resíduos Sólidos, que faz um diagnóstico sobre os avanços tecnológicos, as deficiências e dificuldades que as prefeituras têm para implantar o plano. O relatório, em fase de elaboração, deve ser apresentado até o fim do ano.

(Notícias do dia, 19/07/2014)

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