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Ações judiciais colocam a expansão imobiliária em xeque em Florianópolis

Depois da polêmica envolvendo imóveis construídos nas margens da Lagoa da Conceição e que podem ser demolidos por decisão da Justiça Federal, a Prefeitura de Florianópolis terá que responder a outros dois casos judiciais. Esses devem envolver a expansão imobiliária em todos os balneários da Capital e construções irregulares que podem ser regularizadas pela própria legislação municipal.

No primeiro caso, o MPF (Ministério Público Federal) cobra em ação ajuizada no último dia 18 de julho a construção de acessos onde não existem a cada 125 metros em todas as praias do município e readequar a mesma distância onde já existem passagens de pedestres para praias e lagoas. Em outra frente, o TJSC (Tribunal de Justiça de Santa Catarina) derrubou no dia 27 de junho deste ano uma liminar que considerava inconstitucional a lei municipal complementar 374/2010, criada para regularizar imóveis irregulares e clandestinos fora das normas ambientais em todo o município. Segundo a ação do MP-SC (Ministério Público de Santa Catarina), estabelecimentos comerciais, instalados em áreas de interesse ecológico ou histórico, poderiam, no prazo de um ano, providenciar nos órgãos competentes sua regularização indevidamente.

No caso da falta de acessos públicos aos balneários, a Prefeitura da Capital deve entregar suas alegações até a próxima terça-feira ao juiz federal Marcelo Krás Borges, da 6ª Vara Federal. O magistrado é o mesmo que tentará intermediar em audiência de conciliação no dia 13 de agosto para o cumprimento da sentença de demolição de casas na região da Lagoa da Conceição construídas a partir de 2005, após a decisão definitiva sobre o caso na Justiça Federal.

O inquérito civil público sobre os acessos foi aberto em 28 de setembro de 2006, segundo o MPF, para garantir a “manutenção e respeito ao livre acesso às praias no município”. Na época, a administração municipal informou ter criado um grupo executivo com o objetivo de construir um novo Plano Diretor para a cidade, que deveria ser concluído no segundo semestre de 2007.

Mas em maio de 2007, o MPF registrou reportagem do jornal A Notícia que denunciou a falta de acessos entre as praias de Jurerê e Canasvieiras. No local, pelo menos na época, a distância entre um acesso e outro chegava a 500 metros, sendo que o Plano Diretor dos Balneários de Florianópolis determina que os acessos para pedestres à orla marítima, fluvial e lacustre deverão estar localizados numa distância não superior a 125 metros um do outro, tendo a largura mínima de três metros. É o que estabelece o artigo 91 da lei 2.193/85.

A mesma legislação foi revogada pela lei complementar 482/2014, que regulamenta o novo Plano Diretor, mas que manteve nos seus artigos 205 e 206 a mesma determinação da lei de 1985. Estes são os dois principais argumentos jurídicos do MPF para entrar com a ação na Justiça Federal cinco anos depois de iniciada a investigação pela Procuradoria Federal em Santa Catarina.

Problemas nas praias da Galega e do Campeche

No histórico da ação, o procurador Walmor Alves Moreira também afirma que nas praias da Galega e do Campeche foram construídos condomínios e hotéis que impediram o livre acesso dos pedestres à orla marítima. Além disso, segundo Moreira, a Assessoria Pericial do Ministério Público Federal realizou vistoria por amostragem na praia da Lagoinha no dia 20 de agosto de 2008. No local, diz a ação, os peritos constataram a existência de quatro acessos à orla marítima. Mas a distância entre os dois primeiros chegava a 600 metros. “Verificaram, ainda, que apenas um acesso tinha a largura exigida pelo Plano Diretor dos Balneários”, diz a ação.

Em 29 de setembro de 2006, o MPF fez nova recomendação à prefeitura exigindo que a lei fosse cumprida. Em resposta, a administração municipal informou em 2 de fevereiro de 2012 que o problema seria resolvido pelo Projeto Orla. E o Ipuf (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis) alegou dificuldades de fiscalização de uma zona costeira tão extensa na cidade.

Já a SMDU (Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano) informou que a aplicação da norma vinha sendo efetivada somente em casos de aprovação de projetos de parcelamento do solo, principalmente em novos loteamentos. E confirmou que não vinha exigindo o cumprimento da lei nos casos de aprovação de novos projetos para construção de edifícios ou residências em áreas próximas aos terrenos de marinha. Segundo a SMDU, a exigência implicaria em desapropriação da área particular e que o município não tinha orçamento para criar os acessos. As respostas, segundo o MPF, motivaram a entrada da ação “considerando o reiterado desrespeito à lei por parte do poder público municipal e a ineficácia da tentativa de resolução dos problemas pela via administrativa”.

O ND tentou contato com o procurador, mas, segundo a assessoria de imprensa do MPF, ele está de férias e nenhum outro procurador poderia se pronunciar sobre o caso. Alécio dos Passos, presidente da Amola (Associação de Moradores da Lagoa), concorda que devem existir espaços públicos na orla. “A Lagoa é um canteiro de obras, não que concordamos com a demolição de casas, acho que cada caso é um caso, mas está demais. Defendo que sejam abertos acessos à orla da Lagoa”, disse.

Acessos serão debatidos no Orla, diz procurador

O procurador-geral do município, Alessandro Abreu, também aposta, como a gestão anterior, no Projeto Orla para resolver a questão da falta de acessos em toda a costa da Ilha de Santa Catarina, como pede o MPF. “É nesse sentido que buscaremos um entendimento. Esta é mais uma ação, com a Lagoa, sem fatos determinados, não se aponta onde devem ser esses acessos”, criticou.

Segundo o procurador, a medida pode atingir milhares de imóveis em uma ação sem precedentes na cidade. “Isso terá um custo altíssimo aos cofres do município. São imóveis com altos valores de mercado”, concluiu.

Para Abreu, o município não tem estrutura suficiente para fazer o levantamento de toda a costa e apontar os locais que devem abrir passagem ao mar. A manifestação da prefeitura sobre a ação deve ser protocolada na Justiça Federal na próxima semana.

Só ação na Justiça garantiu acesso à praia do Barcela

A ocupação desordenada tanto na Lagoa da Conceição como às margens dos balneários que circundam a Ilha de Santa Catarina proporcionou privilégios à revelia das leis ambientais. Enquanto alguns têm a praia como quintal de casa, parte da população não pode acessar o mar, as lagoas e os rios. A falta de passagem a cada 125 metros, requerida na ação recente do MPF (Ministério Público Federal), já foi alvo de situações isoladas, como na praia do Barcela, onde a Justiça Federal determinou a derrubada de um muro para garantir a passagem de pescadores e moradores à pequena praia de 650 metros de comprimento.

A briga do morador Edson Osmar Pires durou quatro longos anos, desde a construção de um muro que obstruiu acesso ao mar. Neste período, pescadores precisavam pular muros ou passar por dentro de propriedades privadas para desenvolverem a pesca artesanal. A briga só terminou no início deste ano, quando enfim o muro veio ao chão e abriu passagem ao mar. A mesma ação, pedia ainda, que após estudos fossem abertos cinco acessos para as praias na região do bairro João Paulo, a uma distância de 125 metros cada, o que ainda não aconteceu.

Projeto Orla

Uma das saídas para os conflitos à beira-mar pode vir por meio de planejamentos estratégicos de longo prazo. Uma dessas apostas é o Projeto Orla, que busca construir com a própria comunidade, através de oficinas, um planejamento de ocupação e uso sustentável dos recursos naturais. “O projeto não trata apenas de questões arquitetônicas em si, mas da construção de metas e objetivos de longo prazo, desde ações pontuais a programas que podem durar anos”, disse Mariana Claro, coordenadora do projeto por parte da Prefeitura de Florianópolis. O programa é desenvolvido entre a SPU (Secretaria de Patrimônio da União) e o Ipuf (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis).

Os argumentos de que o Projeto Orla possa ser a saída para os dilemas ambientais da cidade já foram usados por administrações passadas, mas a falta de verba específica para desenvolver as ações e o baixo envolvimento da sociedade fazem com que os trabalhos caminhem lentamente. A expectativa mais otimista é de que as oficinas sejam finalizadas nos próximos dois anos, quando uma série de ações serão encaminhadas aos órgãos competentes — Câmara de Vereadores, prefeitura, Casan, entre outros — para execução. “O projeto está caminhando a passos lentos, o ideal é que estivesse integrado ao Plano Diretor, o que não aconteceu, mas as oficinas estão sendo realizadas”, declarou o vereador Pedro Assis (PP), um dos poucos parlamentares da cidade envolvido no processo.

Os técnicos do Ipuf estão trabalhando na finalização dos projetos para o Norte da Ilha (entre Daniela e Praia Brava) e no Sul (entre o Campeche e Pântano do Sul). “Estamos trabalhando por etapas, o próximo projeto será o da Lagoa da Conceição e depois Santo Antônio de Lisboa”, informou Mariana.

Lei de 2010 legaliza construções irregulares, após decisão do TJ

Entre os alvarás cancelados no começo da gestão do prefeito Cesar Souza Júnior sob suspeita de irregularidades, está a licença para legalizar dois blocos de alvenaria de uma pousada na avenida das Rendeiras, na Lagoa da Conceição. Nas observações da prefeitura para suspender a decisão, os fiscais informam que o imóvel foi legalizado pela lei municipal complementar 374/2010. Como a lei foi suspensa por liminar concedida pelo TJSC após uma ação do MP-SC em fevereiro de 2011, o imóvel ficou novamente irregular mesmo após ter sido regularizado pela gestão anterior. Trata-se da propriedade de Maurício Manoel Vieira. Ao ser questionado na sexta-feira pela reportagem do ND,  o empresário disse que conseguiu obter as licenças do seu imóvel há um mês na prefeitura e antes do TJSC manter os efeitos da lei complementar questionada pelo MP-SC.

“Eu até estranhei, pois me colocaram junto com outras grandes obras de construtoras. Consegui finalmente regularizar a segunda parte do imóvel que fica em área de marinha, cerca de 700 m²”, explicou Vieira. Segundo o empresário, entre 1985 e 2005 pagou um valor muito acima do IPTU pela área de marinha do imóvel. “Em dezembro recebi outra carta dizendo que terei que pagar novamente, mas está tudo regularizado na prefeitura”, disse.

Para o MP-SC, prazo de um ano concedido pela norma impede inclusive que o Corpo de Bombeiros exerça suas atribuições concedidas pela Constituição do Estado de vistoriar os imóveis e adotar medidas contra os que não possuem o habite-se. O Ministério Público também argumenta que para construções em áreas de proteção histórica e ambiental sejam regularizadas, bastaria parecer favorável do órgão da prefeitura.

Na ação, o MP-SC lembra que a proteção destas áreas é regida por diversas normas federais, e ressalta que “não pode um parecer emitido pelo município contrariar as exigências de tais normas a pretexto de regularizar edificação construída em local que não poderia se destinar a este fim”. Mas o Órgão Especial do TJ não acatou os argumentos da Centro de Apoio Operacional de Controle da Constitucionalidade do MP-SC e das 28ª e 29ª Promotorias de Justiça da Capital, autores da Ação Direta de Inconstitucionalidade. No dia 27 de junho, a maioria dos desembargadores acompanhou o voto do relator do caso, desembargador Cesar Abreu.

Segundo o magistrado, a nova norma poderia ser “incompatível” com a própria legislação municipal e não contra a constituição estadual. “A ofensa à Constituição Estadual, assim, seria apenas reflexa ou indireta, pois no caso se estaria diante, no máximo, de lei em desacordo com o Plano Diretor”, argumentou Abreu. Procurado pela reportagem, o MP-SC disse que ainda não foi notificado da decisão publicada no dia 1º de julho e, por isso, não poderia se pronunciar ainda sobre o caso.

 

(Noticias do dia, 27/07/2014)

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