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Lagoa da Conceição resiste à omissão do poder público

O vento nordeste que faz marolas na água escura quase atrapalha, mas não im­pede que o motorista aposentado Adão Ci­ciliano Libânia, 60 anos, repita uma rotina que conheceu ainda na infância. De tanto observar os movimentos do pai, aprendeu o jeitinho de jogar a tarrafa sempre aberta, sem amontoar. Seguido por uma gaivota à espera de sobras, ele caminha lentamen­te com água pela cintura, sem perceber a pressa de quem passa de carro pela aveni­da Osni Ortiga, no Porto da Lagoa.

Pesca sem medo no mesmo trecho onde o excesso de matéria orgânica causa o acú­mulo de algas apodrecidas e acentua o odor característico da poluição. Principalmente no verão, quando triplica a quantidade de esgoto in natura jogada diretamente na lagoa por parcela da população e do co­mércio e pela própria Casan (Companhia Catarinense de Saneamento).

Paciente, Adão espera o momento cer­to de tarrafear. Logo, traz à tona três tai­nhotas médias presas às malhas. Em duas horas de pescaria, o aposentado percorre pouco mais de um quilômetro da orla e consegue pelo menos três quilos de peixes variados – também vêm paratis, bicudas e carapicus. “Aqui, passa fome quem tem preguiça. Sempre se consegue um peixi­nho para garantir a refeição da família”, diz, entre uma tarrafada e outra.

Assim como Adão, a maioria dos atu­ais pescadores da lagoa são amadores, profissionais de outras áreas que apro­veitam as horas de folga para juntar o útil ao agradável. “É uma forma de pas­sar o tempo e economizar nas despesas de casa”, acrescenta sorrindo. Mesmo sem a abundância do passado, peixes e camarões pescados na lagoa, segundo ele, ainda são essenciais na alimenta­ção da família: “Cresci brincando nestas águas, e criei meus quatro filhos da mes­ma forma que meu pai, com muita luta.

Com a experiência de quem olha a Lagoa diariamente do quintal da pró­pria casa, Adão não tem dúvidas de que poluição e assoreamento são os males a serem combatidos. “A carga de esgoto é cada vez maior, e reduziu os cardumes. A Lagoa também está cada vez mais rasa, dificultando a oxigenação e a circulação dos peixes que entram pelo canal da bar­ra”, relata.

E recorda com saudade dos tempos de fartura de camarões. “Há uns 15 anos, se pescava muito até durante o dia. Hoje, só dá alguma coisa à noite, e com muita sorte”, diz resignado.

Barco leva crianças ao cinema

O bote Magnífico 8º, da Cooperbarco, fez uma viagem especial ao centrinho da Lagoa da Conceição. Os passageiros eram 26 alunos do 1º ao 4º ano da Escola Desdobrada e Núcleo de Educação Infantil da Costa da Lagoa, presenteados com uma sessão de curtas da Mostra do Cinema Infantil de Florianópolis.

A atividade extraclasse no Casarão Cultural da praça Bento Silvério fez parte da programação dos 287 anos de Florianópolis, em 23 de março. A maioria das crianças nunca tinha ido ao cinema, e poucos vão com frequência ao Centrinho, segundo a professora Nailde Marques, 46 anos.

Antes do retorno à Costa, alunos e professores lancharam a bordo. Carmem Kuhnen, 34, que também acompanhou a turma, ressaltou que a ida das crianças à Lagoa, navegando pelo trajeto que seus pais fazem diariamente para irem ao trabalho teve aspecto pedagógico. “Assim, aprendem a importância da Lagoa no contexto da comunidade em que vivem”, ensina.

Quando as crianças se preparavam para voltar à Costa, os holandeses Harry Van den Deyssel, 58, e Rita Van den Berg, 53, desembarcavam no terminal da Lagoa. “Nem parece que está poluída”, reflete Harry. Quem lhes indicou a Lagoa como roteiro da viagem foi o filho, que veio passear no Brasil, casou-se com uma moça nativa e decidiu morar em Florianópolis.

Vento é aliado para deslizar na água

O mesmo vento que atrapalha a lida do pescador Adão Libânia na orla da avenida Osni Ortiga, garante aulas bem sucedidas para o gaúcho Joel Couto, 31 anos, instru­tor da escola de kitesurfe baseada há oito anos em área pública da Ponta das Almas, no outro extremo da Lagoa. A localização estratégica, segundo o professor, possibili­ta o melhor aproveitamento dos ventos sul e nordeste, predominantes na região.

O sambaqui da Ponta das Almas é con­siderado pelos praticantes o mais adequa­do entre os outros quatro pontos ocupados por escolas de kite na orla da Lagoa, não só pela oscilação dos ventos. Outras van­tagens apontadas pelo instrutor são os inúmeros baixios, partes rasas que eviden­ciam o assoreamento crescente e facilitam o aprendizado sem riscos de afogamentos. “Temos um bote inflável para resgate, mas o uso de colete salva-vidas é fundamental nestes casos”, avisa Couto. Para evitar aci­dentes na área terrestre, os praticantes do kitesurfe são orientados a manter a distân­cia de 100 metros da costa, longe de fiação, casas e carros.

Os conflitos com os moradores que rei­vindicavam a utilização pública do espaço ficaram para trás, segundo a empresária Samy Marins, dona da escola Gokite, pio­neira na prática do kitesurfe na Lagoa. Cou­to destaca, também, a despoluição natural daquela porção da Lagoa, pela proximidade das nascentes, na Costa, e pelos efeitos da oxigenação proporcionada pela entrada da água do mar no canal da Barra.

Detalhes que atraíram a arquiteta e de­sign de interiores Tianna Guzzi, 33, que costuma ficar 15 dias no escritório, em São Paulo, e 15 dias na Lagoa da Conceição. “O kitesurfe na Lagoa resolveu um trau­ma pessoal, perdi o medo d’água”, diz. A despoluição, na opinião dela, ainda é pos­sível. “Assim como tem aqueles que não estão nem aí com a questão ambiental, tem muita gente fazendo coisas boas. Então, é importante confiar na conscientização das pessoas”, acredita.

Efeitos acentuados do esgoto

As causas da poluição todos conhecem, e passam pela omissão do poder público. Além das ligações clandestinas à rede pluvial, resultado da fiscalização ineficiente da Vigilância Sanitária de Florianópolis, o funcionamento precário da estação de tratamento de esgoto, da Casan, contamina também o lençol freático sob as dunas. A ineficácia do sistema de tratamento foi denunciada em abril de 2012, após vistoria de técnicos da Fatma. O relatório resultará em termo de ajuste de conduta, ainda em elaboração no Ministério Público do Estado.

Na Fatma, a assessoria de imprensa confirma que não há interesse em embargar a estação da Casan. Na avaliação dos técnicos, “ruim com ela, pior sem ela”. Enquanto isso, a orientação é reforçar a fiscalização em grandes empreendimentos, em parceria com a comunidade, e retomar as campanhas de educação ambiental. Projetos mais complexos, como dragagem, desassoreamento e construção de nova ponte na avenida das Rendeiras, que ainda nem têm estudos de Impactos ambientais, por enquanto são inviáveis financeiramente.

(ND,

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