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29/10/2012

Garapuvu, árvore símbolo de Florianópolis, colore de amarelo as montanhas da Ilha

Na Costa da Lagoa, onde floração amarelada encanta turistas e pescadores, mestre canoeiro passa o tempo espalhando mudas e sementes na mata
Quando desliza sem pressa com a pequena canoa de um pau à procura de tainhas e camarões, ainda fartos naquelas águas, ou simplesmente se desloca de um ponto ao outro da Costa da Lagoa, Ernesto Bertoldo Seara, o Zico, 59 anos, não tira os olhos da mata. Era lá, no alto da montanha, que ele buscava matéria prima e inspiração para entalhar na madeira o jeito simples de viver herdado da mistura de índios carijós com os primeiros pescadores luso-açorianos na Ilha, a partir do século 17.
O tombamento do garapuvu como árvore símbolo de Florianópolis, em 1992, foi uma espécie de tributo a sua importância histórica e floração, mas representou também uma reviravolta na vida do pescador. Além da proibição de corte, vieram as dores nas costas e o antigo ofício virou apenas lembrança. A canoa hoje é marco do passado, relíquia que sucumbe com a pesca artesanal nas comunidades tradicionais da Ilha.
Adaptado à nova realidade, o mestre canoeiro descobriu outras maneiras de sobreviver e motivo para dedicar parte do tempo à multiplicação da espécie nas matas do Leste da Ilha. Com a mesma disposição de quem subia o morro do Tijuca para cortar os maiores troncos, agora ele costuma atravessar a lagoa a remo e espalhar sementes e mudas da árvore na restinga que resiste em meio à floresta de pinus que predomina na área do Parque Florestal do Rio Vermelho.
“Quando está assim, florida, ela é a árvore mais bonita da mata. Já tem bastante por aí, mas é sempre bom espalhar em outros lugares”, aponta o velho canoeiro. Zico só transplanta aquelas que não teriam espaço para crescer embaixo de outras mais velhas e altas.
A relação dele com o garapuvu começou cedo, ainda na infância. Filho e neto de pescadores, o menino curioso aprendeu a entalhar com o avô paterno e um dos tios. Fez a primeira canoa, sozinho, aos 15 anos.
As árvores mais adequadas eram escolhidas de longe, pelo porte, e o corte do tronco era feito ainda na mata. Depois, era arrastado em mutirão até a praia, onde era entalhada, primeiro com machado e depois com dois tipos de enchó – reta e goiva. “Popa e proa, que são curvas, dão mais trabalho”, diz. A espessura do casco varia entre dois centímetros na borda, quatro no bojo e seis no calado abaloado. A navegabilidade, segundo Zico, depende do equilíbrio do canoeiro.
Matéria prima para canoas e artesanato
Experientes, os velhos canoeiros escolhiam apenas árvores com mais de 15 anos para corte entre junho e agosto, meses de poda e que antecedem à floração. “É quando a madeira está madura e mais resistente. Não racha no sol”, explica Ernesto Bertoldo Seara, o Zico.
Segundo o pescador, nas matas da Ilha são comuns quatro tipos de garapuvu – amarelo e vermelho (os mais resistentes), cedro (rajado por dentro), e branco – , colorações referentes apenas ao tronco, todos têm cachos amarelos na copa.
Zico perdeu a conta das canoas que entalhou na Costa, mas lembra que levava, em média, 15 dias para deixar pronta uma com cinco metros de comprimento. “Abaixo deste tamanho são catralhas e batelões, que também já fiz muitos”, acrescenta. O acabamento era feito com tinta a óleo marítima, e uma das exigências burocráticas para navegar é o registro na Capitania dos Portos.
Pescador e dono de restaurante, Nilson Nicodemos Frutuoso, o Taba, 60, descobriu há dez anos o dom do artesanato em madeira. Hoje, quando não está pescando ou atendendo a clientela, ele utiliza galhos derrubados pelo vento para esculpir miniaturas de barcos e aviões, passatempo que ajuda no orçamento da casa. “Já produzi mais de 750 peças, que valem de R$ 300 a R$ 3 mil”, garante. Como propaganda é a alma do negócio, ele faz questão de repetir, orgulhoso, que tem trabalhos comprados por turistas de São Paulo e do Rio de Janeiro.
Inverno atípico causa fenômeno na mata
A floração simultânea de árvores jovens e velhas, chamou a atenção do geógrafo Sidney Linhares, 51, observador atento das recentes mudanças do tempo e das matas da Ilha. Segundo ele, trata-se de um fenômeno causado pelo inverno atípico deste ano, com pouco frio e períodos de chuva mal distribuídos.
“Parece até que eles combinaram”, resume Linhares, destacando o “tom patriótico” que a floração amarelada acrescentou ao verde das montanhas no entorno da cidade.
Segundo o professor, a seca no início e o excesso de chuva no final do inverno interferiram no ciclo biológico da árvore, antecipando o processo reprodutivo em plantas mais jovens. “A paisagem ficou ainda mais exuberante no interior da Ilha. Há 23 anos que observo atentamente as influências do tempo na mata local, e jamais vi na semelhante”, acrescenta.
Habituado a fazer o trajeto de barca entre a Costa e a Lagoa da Conceição, Amilton Cândido Tomé, 49, também costuma perder tempo para olhar as pinturas amarelas no morro do Tijuca.
Com a simplicidade típica dos nativos, o pescador concorda que neste ano a floração está concentrada nas plantas mais novas. “É, está bonito, mas ainda está fraco de flor. Muitas árvores velhas ainda não floresceram”, diz. E, sorridente, aponta o morro do Badejo, no Canto da Lagoa, um dos pontos de maior concentração da árvore símbolo da cidade.
Pouco resistente, a madeira do garapuvu é a mais adequada para a fabricação das canoas de um pau só, exatamente pela leveza e facilidade de entalhe. Em comunidades pesqueiras da Ilha, foi utilizada como principal matéria prima de mestres canoeiros até 15 de junho de 1992, quando a Lei Municipal 3.771 a transformou na árvore símbolo da cidade.
Com a proibição do corte na mata, apenas troncos ou galhos derrubados por vendavais ou raios podem ser utilizados para manter a tradição dos pescadores artesanais da Ilha. Mesmo assim, o licenciamento depende de vistoria técnica da Floram (Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis), após abertura de processo administrativo no Pró-Cidadão.
Muito leve, é indicada também para miolos de painéis e portas, brinquedos, saltos de sapatos, gamelas, formas de concreto, compensados e caixotaria.
Sementes e folhas são estudadas na produção de antídotos a efeitos lesivos de acidentes ofídicos, por grupo de pesquisa da Universidade Federal de Uberlândia (MG), a partir de antigos hábitos de comunidades rurais do Triângulo Mineiro. Também são usadas no artesanato tradicional para colares e botões.
Replantio depende do vento e do homem
Neste período de floração, o amarelo do garapuvu destaca-se entre as árvores de grande porte da mata atlântica e transforma-se em um dos principais atrativos para abelhas. Seu desenvolvimento é rápido, atingindo, em média, 30 metros em dez anos, início da fase adulta e estagnação do crescimento.
O fruto amadurece no outono, em forma de vagens bivalvas. Cada um carrega apenas uma semente grande, lisa e rígida, que se dispersa pelos ventos. Apesar de não alimentar pássaros, o pescador Ernesto Bertoldo Seara, 59, da Costa da Lagoa, já viu ser levada no bico de gralhas azuis, talvez confundida com pinhão. “É uma forma de espalhar a árvore pelo morro”, diz.
É apropriada para jardins extensos, parques e praças, modificando em poucos anos a paisagem. Além do aspecto escultural do caule e da copa, o garapuvu tem importante papel no reflorestamento de áreas degradadas de mata atlântica.
Deve ser cultivada sob sol pleno, em solo fértil, enriquecido com matéria orgânica e irrigado regularmente no primeiro ano. O garapuvu prefere locais úmidos como as margens dos rios, lagos e proximidades de nascentes em encostas.
Multiplica-se por sementes, e para facilitar a brotação é recomendada a quebra mecânica da dormência, com desgaste do lado oposto ao hilo. O transplante de mudas com cerca de um metro de altura é outra forma de perpetuação da espécie, desde que a retirada da mata seja monitorada e licenciada pela Floram, ou tenham sido produzidas em áreas particulares.
Árvore símbolo de Florianópolis
Lei municipal 3.771, de 15/06/1992
Identidade
Schizolobium parahyba. Inicialmente descrita por J. M. C. Vellozo, em 1825 recebeu o nome de Cassia parahyba.
Também é conhecida como guarapuvu, guapiruvu, garapivu, guaburuvu, ficheira, bacurubu, badarra, bacuruva, birosca, faveira, pau-de-vintém, pataqueira, pau-de-tamanco, pau-de-canoa ou umbela.
Características
Altura entre 20 e 30 metros, com 60 a 80 centímetros de diâmetro.
Flores grandes, vistosas, amarelas, entre outubro e novembro.
Tronco elegante, majestoso, reto e alto com ramificações apenas no alto.
Copa alta e aberta, de pouca sombra.
Casca lisa, acinzentada, com cicatrizes provocadas pela queda das folhas.
Folhas grandes caem com o passar do tempo.
Frutos amadurecem no outono e são vagens pardas.
Semente grande e lisa, se dispersa pelos ventos.
Raízes têm formato tabular, onde eventualmente brotam rebentos.
No Brasil, ocorre da Bahia até Santa Catarina na floresta pluvial da encosta atlântica. Comum também na Bolívia, no Paraguai, na Venezuela, no Equador, no Panamá, na Nicarágua, em Honduras, na Guatemala, em El Salvador, na Costa Rica, em Belize e no México.
(ND, 28/10/2012)

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