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05/04/2011
Uno abandonado na praia
05/04/2011

“Sem dinheiro, não tem como dar prazo para a Ponte Hercílio Luz”

Consultor do Consórcio Monumento e um expert em pontes suspensas no mundo, o egípcio Khaled Mahmoud alerta para o processo de deterioração da estrutura de ferro
O engenheiro Khaled Mahmoud é o homem por trás do engenhoso projeto de restauração da Ponte Hercílio Luz, em Florianópolis. De origem egípcia mas com residência fixa nos EUA, Khaled foi contratado em março de 2009 pelo Consórcio Monumento, responsável pela obra, depois que inspeções na ponte detectaram um problema na estrutura até então desconhecido: a deterioração das quatro rótulas onde são apoiadas as duas torres de sustentação. Ao lado das barras de olhal no topo das torres, as rótulas são essenciais na dinâmica de sustentação da estrutura. Elas se movimentam para manter as 5,5 mil toneladas em equilíbrio. Como estão trincadas e oxidadas, as rótulas não se movem.
Diante deste novo obstáculo, Khaled orientou sobre o risco de restaurar a ponte segurando-a por cabos de aço na parte superior, como estava previsto no projeto original. Chamou atenção, ainda, para a necessidade de uma sustentação provisória na parte inferior. A partir daí, projetou-se a chamada ponte sob a ponte (veja ilustração na página 5).
O engenheiro visitou a Hercílio Luz pelo menos 10 vezes – em 2009, quase que uma vez por mês. Semanalmente, recebe relatórios técnicos e conversa com o engenheiro Cássio Magalhães, coordenador do consórcio, sobre a restauração, e mostra conhecer cada detalhe do projeto – inclusive o custo da obra e quanto já foi investido.
Khaled é um dos principais experts em pontes suspensas do mundo. O currículo dele é longo e entre os destaques está a presidência da Consultoria Tecnológica de Pontes, empresa de Nova York especializada em grandes estruturas. Participou da restauração de algumas das maiores do mundo como a Simon Kenton, Verrazano-Narrows, Bronx-Whitestone, Mid-Hudson, Throgs Neck, Triborough Suspension Bridges nos EUA e da Bordeaux Lift Bridge, na França. Editou quatro livros sobre engenharia e é presidente e fundador a Associação de Engenheiros de Ponte dos EUA.
Com experiência de 20 anos na área, Khaled afirma que a Hercílio Luz está em processo constante e ininterrupto de deterioração. Só estará segura após apoiada na sustentação provisória.
A seguir, confira os principais trechos da entrevista que ele concedeu por telefone, dos Estados Unidos, ao Diário Catarinense.
A ponte pode cair
“A ponte está em processo constante de deterioração: 24 horas por dia nos 365 dias da semana. A corrosão contínua, em parceria com outros fatores como ventos fortes e a direção destes ventos, pode levá-la ao colapso. De acordo com a posição de latitude e longitude de Florianópolis, a cidade pode ter ventos de até 155 km/h. Mas danos à ponte poderiam ocorrer mesmo na velocidade do vento inferior a 100 km/h, devido à contínua degradação, deterioração e corrosão. Todos esses fatores podem contribuir para danos graves ou colapso parcial ou total.”
Os riscos de um colapso
“Claro que a probabilidade de a Hercílio Luz cair é menor do que no caso da Silver Bridge, sua irmã gêmea que despencou em 1967. Isso porque a Silver Bridge tinha apenas duas sequências de barras de olhal. A Hercílio Luz tem quatro, mas uma está fraturada e ganhou um pequeno reparo. Desta maneira, está mais fragilizada. Assim como um se rompeu, outros podem se romper também, diante do franco processo de corrosão. A chance é menor quando comparada a outra ponte, mas existe. Um ponto a se manter sempre em mente é que um desastre é conhecido e documentado somente depois que acontece. Nosso trabalho como engenheiro é evitar desastres. No rescaldo de um colapso da ponte, qualquer quantia de dinheiro é minimizada e banalizada, comparada com a perda irreparável de vidas humanas e a perda insubstituível do patrimônio.”
Prazo x dinheiro
“Antes de falar de prazos, precisamos falar de dinheiro. Considerando a fase atual e, se a partir de agora tivermos o ritmo de investimentos necessários, a ponte fica pronta em dois anos e meio. O valor do contrato é de R$ 163 milhões. Até agora, desde 2008, foram investidos R$ 27, 6 milhões. É cerca de 15% do total em dois anos. Muito pouco. Me parece que faltam recursos, mas sem eles a restauração pode se arrastar por anos. Sem dinheiro, não tem como dar prazo.”
Estrutura provisória
“Devido à vulnerabilidade atual da ponte, na base e no topo das torres, a estrutura provisória oferece a medida de segurança necessária ao apoio da estrutura a partir de agora e até o trabalho de reabilitação ser concluído.”
Monumento x mobilidade
“Eu discordo fortemente de que a ponte não pode ser uma solução para a mobilidade da Grande Florianópolis. Eu dirijo todos os dias na Brooklin Bridge. Ela foi inaugurada em 1883, ou seja 43 anos antes da Hercílio Luz, e até hoje incorpora grande parte do fluxo de veículos de Nova York. É um grande erro achar que a Hercílio Luz não pode receber o tráfego. Com o vão central reforçado, ela pode receber transporte de massa ou carros e também pedestres. Além disso, a Ponte Hercílio Luz é um símbolo de SC e do Brasil, uma raridade em pontes no mundo, um maravilhoso patrimônio que merece ser restaurando. Quando reformada, é uma ponte que vai durar mais de 100 anos.”
Barras de olhal
“Uma coisa importante é substituir as barras de olhal por cabos de aço. Eles são mais fortes e muito mais seguros. As barras de olhal são mais frágeis às vibrações e podem se romper como uma já rompeu. Os cabos duram mais, são de fácil manutenção e fabricação. Florianópolis deve aproveitar a restauração da ponte para substituir as barras por cabos.”
(DC, 05/04/2011)
Promessas continuam
R$ 14 milhões é o valor que o governo do Estado garantiu repassar à restauração da Hercílio Luz neste ano. Mas são necessários R$ 60 milhões para a conclusão da estrutura provisória que daria suporte às 5,5 mil toneladas de ferro da antiga travessia. De acordo com o Consórcio Monumento, responsável pela obra, essa seria a única forma de a primeira ligação entre Ilha e Continente sair da condição de risco. Sem investimento, na prática, não há mais prazo para completar a etapa mais importante da obra.
Se a verba de R$ 60 milhões fosse garantida, o Consórcio Monumento afirma que o suporte do vão central, uma espécie de ponte sob a ponte, ficaria pronto em maio de 2012. Com R$ 14 milhões, é possível fazer apenas as quatro fundações até setembro de 2011. Ficaria faltando a estrutura de ferro sobre os pilares, onde a Hercílio Luz seria escorada. Para o próximo ano, o secretário de Estado de Infraestrutura, Valdir Cobalchini, diz que ainda não está programado o valor a ser direcionado para a reforma. Apesar de não haver previsões, as promessas continuam:
– Não temos uma maquininha de fazer dinheiro, mas vamos concluir. A gente nasce envelhece e morre, a ponte é igual. Ela tem a sua vida útil e, se não for feito nada, vai cair. Mas não vamos deixar isso acontecer. Não houve paralisação da obra, continua sendo uma prioridade para nós e estará concluída neste mandato.
Discurso à parte, nas ações a restauração não parece ser tratada com tanta urgência. O governo anterior tinha previsto para a obra R$ 20 milhões da Lei de Orçamento Anual de 2011 e R$ 40 milhões do FundoSocial. A gestão atual decidiu redirecionar parte da verba para outras demandas, como construção e restauração de rodovias. De acordo com Cobalchini, o investimento que iria para a Hercílio Luz será utilizado para outras obras porque ela é a única com valor histórico e que poderia ser financiada por meio da Lei Rouanet de Incentivo à Cultura.
– Não posso buscar fontes culturais para a duplicação da SC-401, mas para a Hercílio Luz consigo. Como gestor, não tenho que pensar só na ponte, mas no acesso ao aeroporto e em todo o sistema viário catarinense – justifica o secretário.
Por ser um bem tombado, pode-se captar recursos pela Lei Rouanet. A dificuldade será conseguir investidores para um projeto caro com esse. Para se ter uma ideia, entre 2008 e 2011, todos os projetos culturais em SC conseguiram captar R$ 63 milhões, pouco mais do que o valor necessário apenas para tirar a ponte do risco de cair.
(DC, 05/04/2011)

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