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Metrópole sustentável: é possível algo assim?

Inez Liuth, 49 anos, é diarista e mora em São Gonçalo, município do Estado do Rio de Janeiro. Todos os dias, ela gasta cerca de três horas no trajeto entre sua casa e o trabalho, na Zona Sul do Rio – distância de cerca de 35 quilômetros. O caminho não é dos mais agradáveis: duas conduções, ônibus lotado, engarrafamentos. Até mesmo a rua de sua casa, ainda não asfaltada, obriga Inez e os vizinhos a levar um segundo par de sapatos na bolsa em dias de chuva.
“A gente coloca um para andar até o ponto de ônibus, depois troca e guarda num saquinho”, conta ela.
Muito diferente dessa realidade é o que garante a Constituição brasileira. O País foi o primeiro da América Latina a incluir em suas leis dizeres sobre o ”direito à cidade” dentro do chamado Estatuto da Cidade, cunhado em 1998: “garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações”.
Dada a definição oficial do termo ”cidade sustentável”, não é preciso ir muito além do óbvio para constatar que as cidades brasileiras estão longe de serem sustentáveis. Paulistanos perdem, em média, 2 horas e 43 minutos por dia no trânsito, de acordo com uma pesquisa divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo. Segundo relatório da ONU (Organização das Nações Unidas), a proporção de pessoas que vivem em favelas no Brasil em relação a toda a população urbana do País era de 28‰, em 2007 – enquanto a do México era 14,4‰.
Alguns dados levantados pela ONU, no entanto, revelam que o Brasil e a América Latina em geral têm apresentado melhora em muitos aspectos relacionados a cidades, como a redução de favelas, da pobreza e a revitalização de centros urbanos.
Embora os prognósticos da ONU sejam positivos, a desarmonia entre os objetivos constitucionais e os processos reais que acontecem nas cidades faz levantar a questão: no cenário sombrio que acabamos de descrever, é viável que uma metrópole seja sustentável também em relação ao mundo? Mesmo que, obviamente, não haja uma resposta final positiva ou negativa, o consenso é que a situação atual não pode perdurar.
Desigualdade: a mãe de todos os problemas

A primeira condição fundamental para o estabelecimento de uma cidade sustentável é a democratização dos acessos a serviços e equipamentos públicos. Isso significa, em outros termos, a redução drástica de todas as formas de desigualdades – social, política, econômica e espacial –, quesito em que a América Latina ocupa o nada invejável primeiro lugar. A diferença é brutal: o país latino-americano que apresenta menor índice de desigualdade (Chile) ainda o tem em maior expressividade do que qualquer país europeu.
Nesse cenário, para que infraestrutura, segurança, Saúde, Educação e outros serviços públicos sejam acessíveis em toda a metrópole, a manutenção da cidade se torna cada vez mais cara. Como os recursos financeiros são limitados, chegará o momento em que a pressão política e econômica ditará para onde eles devem ser direcionados. Assim, reforçam-se as desigualdades instauradas logo nos primórdios da formação urbana: como as classes média e alta têm maior poder de pressão, as áreas mais ricas recebem mais recursos em detrimento das mais pobres.
“Equalizar essa divisão é o ponto de partida para diminuir as desigualdades”, explica Magalhães.
No universo latino-americano, o Brasil não está entre os primeiros no ranking de miséria. A pobreza urbana afeta 29,9% da população, enquanto o México (39,4%) e a Colômbia (45,4%) estão entre os mais pobres. O Chile e a Argentina, no entanto, são considerados pela ONU países menos pobres que o Brasil. Ainda assim, mais importante que um número absoluto de pobreza é a forma como esta e a própria riqueza estão distribuídas no universo urbano.
“Os célebres engarrafamentos da cidade de São Paulo não prejudicam todos da mesma forma; assim como a violência do Rio de Janeiro gera um número muito maior de vítimas entre pessoas de baixa renda”, alerta Ribeiro.
O índice mais utilizado por organismos internacionais para medir o nível de desigualdade de um país ou cidade é o Gini. Este índice, batizado em homenagem ao estatístico italiano Conrado Gini (1884-1965) é um coeficiente que mede a distribuição da renda ou o consumo de uma família em uma razão de zero a 1, sendo zero a distribuição mais igualitária e 1 o máximo de desigualdade.
Segundo relatório da ONU, o Brasil está no grupo dos países com desigualdade de renda muito alta, com índice Gini entre 0,45 e 0,59. A título de comparação: em situação mais desigual que o Brasil e membros do grupo de países mais desiguais do mundo estão a Namíbia, a Zâmbia e a África do Sul.
Dentro do universo brasileiro, a cidade com maior taxa de desigualdade é Goiânia, com um Gini de 0,65 – seguida de perto por Fortaleza (0,61), Belo Horizonte (0,61) e Brasília (0,59). Essas cidades brasileiras são as mais desiguais da América Latina e, salvo cidades sul-africanas, também do mundo. Apesar de não serem as cidades com maior desigualdade de renda do Brasil, Rio (0,53) e São Paulo (0,5) estão acima de outras latino-americanas como Montevidéu (0,45) e Caracas (0,39).
Grande sim, gorda não
Os 2% que a população das cidades brasileiras cresce por ano não precisam, necessariamente, refletir em aumento proporcional do território urbano. Para Magalhães, Ribeiro e também para Cecília Martinez – diretora do UN-Habitat para a América Latina -, um dos maiores elementos propulsores dos problemas urbanos é o crescimento expansivo (ou horizontal) das cidades.
Muitas cidades europeias já apresentam taxas de crescimento negativas – como Praga, capital da República Tcheca, cuja população diminuiu 0,07‰ nos últimos cinco anos. No Brasil, contudo, a cidade cuja população menos cresceu, no mesmo período, foi o Rio de Janeiro, com uma taxa de 1,19‰. Se comparado a outros países da América Latina, entretanto, ainda estamos um pouco atrás. Enquanto em Querétaro, cidade mexicana cuja população mais cresceu entre 2005 e 2010, a taxa foi de apenas 2,5‰, Florianópolis, a equivalente brasileira, apresentou taxa de aproximadamente 4‰.
Quanto maiores as distâncias a serem percorridas dentro do perímetro urbano, também maior e mais complexa se torna a rede de transportes. É por isso que a urbanista Ermínia Maricato, professora da USP (Universidade de São Paulo), defende que a expansão horizontal das cidades é incentivada em grande parte pela valorização da indústria automobilística e das rodovias como principal forma de transporte intrametrópole.
“Os interesses em torno da indústria automobilística são muito fortes, e envolvem também o petróleo e sua distribuição”, opina Ermínia. A priorização do automóvel faz com que a cidade se expanda horizontalmente, minando as possibilidades de ter áreas não ocupadas, e contribui para a impermeabilização do solo, com os asfaltos.
Para a urbanista, a superestima do automóvel é uma das marcas do subdesenvolvimento, no qual também o transporte coletivo é precário. A ocupação perdulária do território urbano, face à ineficiência governamental em conter expansões inapropriadas, também é considerada a razão mais clara para a expansão horizontal.
“Sou contra áreas ocupadas com baixa densidade, seja de condomínios ricos ou de favelas”, defende a especialista.
(Por Isabela Fraga, Ciência Hoje / Diário do Grande ABC, 20/09/2010)

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